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Lobby faz parte da democracia e precisa ser regulado, diz especialista

16.04.2014 às 13:40

Os jornalistas do TRE-SC (Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina) entrevistaram nesta terça-feira o doutor Pier Luigi Petrillo sobre lobby e grupos de pressão. O italiano esteve no Brasil para participar do Seminário Internacional Constituição e Direitos Políticos, evento promovido pela Escola Judiciária do TRE-SC.

Petrillo é professor de Direito Público na Universidade Unitelam “La Sapienza” de Roma e de Teoria e Técnicas de Lobbyng. Ele também é especialista em Direito Parlamentar e PhD em Direito Comparado Público pela Universidade de Siena, Itália. Durante a entrevista que concedeu aos jornalistas do Tribunal Eleitoral ele defendeu a regulamentação do lobby e afirmou que em modelos democráticos a influência de grupos de pressão é natural e sadia.

TRE-SC: No Brasil estamos acostumados a associar a palavra lobby a escândalos políticos envolvendo a corrupção de agentes públicos. De acordo com sua palestra, a atividade não está associada à ilegalidade. Como podemos explicar isso aos brasileiros?

Píer Luigi Petrillo: Realmente. Nos países latino-americanos, e também na Europa, há uma percepção coletiva extremamente negativa sobre os grupos de pressão. Para modificar essa pensamento precisamos primeiro entender o que é o lobby legal.

Geralmente o lobby pode ser definido como um grupo de pessoas unidas por um interesse comum que procuram influenciar o decisor público com o objetivo de tirar uma vantagem ou evitar uma desvantagem.

Os elementos que qualificam o lobby são essencialmente três: [1] o lobby é um grupo portador de um interesse; [2] ele deseja influenciar um ou mais decisores públicos; [3] e tem a finalidade de levar vantagem ou evitar desvantagem.

Portanto, o interesse do lobby não necessariamente representa o interesse particular, podendo ser o interesse coletivo de algumas pessoas ou mesmo os interesses públicos. Por exemplo, os próprios estados podem possuir escritórios próximos aos locais de decisão (no caso do Brasil, o Distrito Federal) com o objetivo de influenciar o governo federal sempre que oportuno. Esse é um lobby estatal.

TRE-SC: O senhor falou em vantagem e desvantagem de um modo geral, isso significa dizer que um grupo de pressão nem sempre visa a ganhos econômicos?

PLP: Exatamente. No imaginário social, o lobby é feito apenas por grandes grupos farmacêuticos ou empresas de tabaco com o objetivo de ganhar mais dinheiro. Isso não é verdade. Um lobby pode almejar uma vantagem que não envolva um aspecto econômico. De fato, setenta por cento dos grupos de lobby que operam no mundo não buscam uma vantagem econômica. Exemplo clássico disso são as grandes associações ambientalistas ou associações internacionais que procuram influenciar o governo.

TRE-SC: Do ponto de vista teórico, qual seria a abordagem mais atual sobre o tema?

PLP: Existem duas abordagens que podem ser feitas sobre o lobby: uma é baseada na visão jacobina e outra na visão “anglo-saxônica”. No entendimento jacobino, a lei deve representar o interesse geral, e esse interesse preexiste ao momento de decisão. O que quero dizer é que neste modelo prevalece a ideia de que o legislador tem maior capacidade para decidir do que os cidadãos. O decisor é visto como uma pessoa de profundo conhecimento e sua posição está acima dos demais. Portanto, na visão jacobina não havia espaço para os grupos de pressão porque não existia legitimidade para tal, sendo que o interesse geral não era fruto de um confronto com os cidadãos.

Contemporaneamente, o modelo jacobino foi deixado de lado e trocado pelo modelo anglo-saxônico, cuja base está no fato de que o interesse geral não pode preexistir antes da decisão. No modelo atual, o legislador é visto como um cidadão, estando no mesmo nível que ele em capacidade de decisão. Nesse contexto, os grupos de pressão são aceitos e o interesse geral é fruto do confronto entre os interesses particulares.

TRE-SC: Atualmente o lobby é aceito nas democracias, como então utilizar essa atividade de uma maneira benéfica a todos?

PLP: Em um sistema democrático o lobby é natural. É normal que em uma democracia existam interesses de uma e de outra parte. Cabe ao regulador o papel de garantir a participação de todos os grupos de pressão, não apenas de alguns. Por outro lado, é preciso assegurar a transparência desse processo de influência para que todos saibam o que está em jogo.

TRE-SC: Na pergunta anterior o senhor tocou na função do Estado como regulador das atividades de lobby. Que tipos de regras poderiam ser implantadas?

PLP: Para responder a essa pergunta precisamos recorrer a um estudo do direito comparado entre países. Em um paralelo, podemos verificar quais normas foram criados até hoje para tentar balizar as ações de influência. De maneira geral, os modelos reguladores se dividem em três.

O primeiro modelo é chamado de “regulamentação e transparência”, no qual as normas impõe aos lobistas que se inscrevam em um registro público, e obrigam o decisor público a declarar todos os interesses existentes em jogo. É como se o lugar da decisão tivesse paredes de vidro e todos pudessem observar, mas apenas o decisor tem acesso ao local de decisão.

No segundo modelo, chamado de participação, existem normas de inscrição e registro para os lobistas e o decisor é obrigado a declarar seus interesses. Nesse sistema, os grupos de pressão têm direito de participar do processo decisório. Agora, além de ser uma sala de vidro, os grupos de pressão também sentam à mesa com o decisor.

Já no último modelo identificado não existem normas que de maneira clara e específica disciplinem a atividade. De maneira geral, as regras estão espalhadas pela legislação e precisam ser condensadas. Nesse modelo também foram criadas normas que obrigam a transparência da decisão.

TRE-SC: Mesmo com toda essa regulamentação, o lobby ainda poderia gerar algum tipo de problema?

PLP: A influência de grupos de pressão não precisa ser proibida. Ele precisa ser regulamentada. Essa seria a forma de acabar com o problema. Veja, o lobby é como um rio que está enchendo. Se o rio for bem controlado e bem utilizado, ele pode gerar energia. Se ele não for bem contingenciado, irá encher e inundará a cidade.

Por Rafael Spricigo
Assessoria de Imprensa do TRE-SC