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O processo eleitoral no Direito Brasileiro

Por: Aroldo Mota

1 Visão do direito nos vários sistemas jurídicos

A humanidade tem desenvolvido sua convivência social no surgimento de várias teorias jurídicas, consonantes com pensamentos filosóficos e harmonizadas com escolas econômicas, no objetivo final de concretizar felicidade entre as pessoas.

À medida em que o grupo social vai se formando para alcançar hegemonia política, em paz ou em guerra, surge um sistema jurídico compatibilizado com os costumes, tradições ou normas esparsas que já dirigiam, precariamente, os conflitos e paixões no dia-a-dia.

Em verdade, poder-se-ia afirmar, com alguma audácia, que os sistemas jurídicos nas várias regiões do planeta Terra se interpenetram, quase sempre, baseando-se nos costumes locais, na obediência aos tocados pelo privilégio natural e, hoje, influenciados pela comunicação que transformou o mundo "numa grande aldeia", no dizer de MCLUHAN.

Contudo, há diferenças nos sistemas que devem ser sublinhadas, ressaltadas e até louvadas, pois são responsáveis pela inteireza da comunidade na sua diária convivência, às vezes difícil e tenuemente unida em momentos atribulados por que passa.

Um fato é irrefutável: o costume local do homem antes da estratificação da sociedade tem sido a base de todos os sistemas. Nem os invasores têm conseguido modificar inteiramente o modo de vida na solução dos problemas enfrentados pelos povos subjugados. O Império Otomano, que dominou boa parte do Oriente durante muito tempo, respeitou as normas dos invadidos, até como forma de melhor dominá-los politicamente. O Império Inglês, indubitavelmente, o mais impiedoso dominador dos últimos séculos, tentou impingir seus estatutos aos povos dominados, encontrando sempre feroz resistência. Os Estados Unidos; que lideram o mundo desde o final da Primeira Grande Guerra do século que atravessamos, jamais levaram aos dominados seus instrumentos legais, preferindo que as corporações multinacionais se adaptassem às legislações locais. O Império Soviético é o último e lastimável exemplo de tentativa de dominação com lei nos países vencidos, principalmente nos bálticos e no leste europeu. Em menos de setenta anos de implantação do sistema jurídico na Rússia, vimos em uma semana sua perspectiva de dominação ruir impiedosamente.

Analisemos, todavia, os seguintes sistemas jurídicos com suas estruturas, fontes e histórias: o Inglês, o Soviético e o romano-germânico.

2 Sistema jurídico Inglês

A rigor, o Direito Inglês vige com muita autenticidade na Inglaterra e no País de Gales. Assim mesmo, além de influenciar os demais países da comunidade britânica e os Estados Unidos, serve de paradigma para muitos outros.

Por ser um direito costumeiro, encontra raízes na própria história da Inglaterra com suas divisões: 1) o período anglo-saxônico; 2) a formação da common law (1066-1485); 3) a rivalidade com a equity (1485-1832); 4) o período moderno.

Os normandos conquistaram a Inglaterra em 1066, servindo de marco para sua história jurídica e política. Antes, imperou o período anglo-saxônico, sendo o país dominado por tribos saxônicas e dinamarquesas.

Neste período, a Inglaterra se converte ao cristianismo por volta de 596, sendo o Direito imperante pouco conhecido. Em verdade, a Europa continental passou a exercer um papel dominante na esparsa legislação inglesa, mormente escrita em língua anglo-saxônica, ao contrário da Europa, que usava o latim na redação de suas leis. Ainda vivia o país como um aglomerado tribal.

A formação da common law é resultado da conquista normanda do país pelo rei Guilherme, o Conquistador, que manteve quase íntegro o Direito anglo-saxônico e, sustentam alguns juristas ingleses, em vigor , ainda hoje, em muitos de seus aspectos. Com a conquista normanda, a Inglaterra saiu da fase tribal e ingressou no feudalismo.

Guilherme implantou um feudalismo próprio para não se chocar com os costumes anglo-saxônico e não permitiu a formação do baronato, firmando-se com o estatuto Quia emptores, de 1290, o qual previa a organização da terra, desenvolvendo-se a comune ley, na língua normanda, ou a common law, na língua inglesa, mais tarde.

A common law é o Direito comum da Inglaterra no comportamento da assembléia dos homens livres, nos condados do país, aplicando decisões com base no costume local, sem qualquer remissão a outro direito, e transpondo para a legislação escrita, quando existente, esses costumes respeitados, muitos deles até nossos dias. Os Tribunais Reais de Justiça respeitam o Direito costumeiro e decidem, fundamentalmente, em respeito a ele.

Logo, com o desenvolvimento da Inglaterra, a common law viu-se diante de duas conseqüências: a) a falta de flexibilidade na sua aplicação em determinadas questões; b) o cansaço dos homens encarregados de com ela lidar. Os que perdiam suas demandas nos Tribunais Reais, a partir do século XIV, sentiam a necessidade de recorrer, na inconformação natural pela falta de criatividade na interpretação dos costumes, e, obviamente, voltavam-se para a figura intocável do rei, como esperança para seus pleitos. E o rei, na Idade Média, era absoluto, principalmente na Inglaterra.

0 rei, com o apoio do seu conselho, decidia com eqüidade, alcançando, no século XVI. com o absolutismo dos Tudors, o ponto culminante dessa fase rica do Direito Inglês, principalmente, ameaçando a liberdade individual com a Star Chamber, em matéria criminal, embora tenha o instrumento sido necessário para aplacar os ânimos, depois da Guerra Civil.

Na decisão, o rei era precedido pelo chanceler, organizador dos recursos. Surgiram, por volta de 1616, divergências entre o chanceler do rei e os Tribunais da common law, em face de: a) falta de uma boa organização do chanceler no encaminhamento dos processos ao rei; b) morosidade no andamento dos recursos; c) corrupção; d) invasão do chanceler nas atribuições dos Tribunais Reais.

Os juristas voltaram-se para o Parlamento e, juntos, forçaram o soberano a esvaziar o prestígio do chanceler, mantendo o estado original de convivência 'entre os Tribunais Reais de Westminster e o Tribunal da Chancelaria, sob o controle último da Câmara dos Lordes.

Ainda hoje o Direito Inglês mantém uma convivência dualista entre a common law e a equity .

Com o triunfo definitivo das idéias liberais e democráticas na Inglaterra, e sob a influência teórica de Jeremy BENTHAM, o país iniciou a modernização de seu Direito, no século XIX. Os Judicature Acts encerram a diferença formal entre os Tribunais Reais e o Tribunal da Chancelaria. As regras da common law e da equity passaram a ser aplicadas em qualquer dos tribunais. O aspecto tradicional, costumeiro, não perdeu sua eficácia, porém o direito substantivo libertou o Direito Inglês de soluções velhas.

Sob alguma pressão do pensamento socialista, o Direito Inglês, em algumas ocasiões, substitui a jurisprudência e a elaboração costumeira por legislação escrita identificada com as mudanças ocorridas na sociedade contemporânea, como para atender ao surgimento da informática e ao comércio internacional, altamente sofisticado.

A estrutura do Direito Inglês repousa nos processualistas e nos práticos. O maior jurista da Inglaterra é o Juiz, que é um leigo -não vem das universidades. A lógica desempenha um papel preponderante na aplicação do Direito Inglês. O júri inglês é muito acossado pelos juristas modernos, exatamente porque suas decisões têm um conteúdo emocional muito grande, e os jurados são pessoas do povo, e não se pode deixar de lado que as pessoas desejam um justo resultado dos seus pleitos judiciais.

O processo inglês, embora receba a presença de profissionais formados nas universidades, ainda aceita o júri em quase todos os casos que são submetidos ao Judiciário, composto por jurados recrutados no seio do povo, sem formação jurídica. A audiência pública com a presença do Juiz, mas perante o júri, com a ouvida de testemunhas de partes, exibição de prova, em um processo predominantemente oral, é o ponto culminante da demanda judicial no Direito Inglês.

Ainda hoje, os tribunais inferiores, 0 contencioso administrativo e árbitros privados, solucionam a grande maioria dos litígios no Direito Inglês, com base no Direito costumeiro e na aplicação da eqüidade.

As formas do Direito Inglês são três, pela ordem de importância: a) a jurisprudência; b) o costume; c) a lei.

O Direito Inglês, formado historicamente pelas decisões dos Tribunais Reais, na aplicação da common law, e pelo Tribunal da Chancelaria, na aplicação da equity, é um Direito jurisprudencial. A jurisprudência, com seus precedentes é a fonte primeira do Direito Inglês. Há, na Inglaterra, a regra do precedente que se fundamenta na aplicação do Direito nos casos judiciais, de conformidade com o já decidido pelos tribunais, com base na common law. Isto foi muito rígido até o surgimento dos Judicature Acts, porém continua como força excepcional até hoje.

A jurisprudência obedece a uma certa hierarquia como fonte no Direito Inglês, assim: a) as decisões tomadas pela Câmara dos Lordes são precedentes obrigatórios para os Tribunais; b) as decisões adotadas pelo Court of Appel obrigam como precedentes para as jurisdições inferiores; c) as decisões adotadas pelo High Court of Justice obrigam também as jurisdições inferiores.

O costume que vem do período anglo-saxônico serviu para formar a common law, formador da jurisprudência, espelhado sobre a razão. O costume foi a origem do Direito Inglês. Atualmente, a jurisprudência tomou o lugar do costume, todavia, rotinas do período anglo-saxônico ainda exercem papel no desempenho do Direito Inglês.

Em um país que não possui constituição escrita, limitando-se as regras fundamentais em um conjunto de leis e decisões, garantindo as liberdades essenciais e limitando o arbítrio das autoridades, a lei tem um papel secundário na formação do Direito.

A lei, na Inglaterra, procura acomodar situações novas, surgidas principalmente depois da Segunda Guerra Mundial, e se destina, mais das vezes, a disciplinar o crescimento urbano, a manutenção da previdência social, o sistema de educação e de saúde.

Persistem discussões no Direito Inglês quanto ao crescimento da legislação escrita, principalmente quando está no poder o Partido Trabalhista, de inspiração socializante.

3 O sistema jurídico Soviético

Salvo prova em contrário, o Direito Soviético, que surgiu no início do século, com muita força e características transformadoras, resistiu pouco tempo. Já assistimos ao seu desmoramento como sistema impositivo, muito embora tenha deixado alguns institutos e comportamentos que devem ser assimilados pelo Direito como um todo, dentro daquela assertiva de que o mundo, pela comunicação, marcha, inexoravelmente, para se constituir, de fato e de direito, numa "grande aldeia".

O século IX marca o início da história russa com a invasão de tribos vindas da Escandinávia, sob a liderança política de Riourik. Esse período vai de 862 até 1236. Em 989, a Rússia se converteu ao cristianismo, surgindo a lei escrita, com base nos costumes, exercendo a Igreja um papel relevante no princípio do Direito Russo ou Russkaia Pravda.

Os costumes indígenas e o Direito Bizantino trazido pelo cristianismo foram, neste período inicial, o Direito Russo.

Em 1236, surge na Rússia o domínio Mongol, expirando-se em 1480, com o reinado de Ivan III, depois de uma guerra que durou cem anos.

Foi nesta época que Moscou passou a ser a capital do país, substituindo Kiev, isolando-se do mundo ocidental. No lado jurídico, o período Mongol foi uma negação, limitando-se ao rompimento do sistema católico chefiado por Roma e estagnando o que encontrara, do período anterior, com relação ao Direito.

Do fim do período Mongol até a ascensão ao trono de Pedro, o Grande, em 1689, o Direito toma um novo impulso, libertando-se do poder temporal. Os costumes deixaram de predominar absolutamente nas decisões da justiça, da polícia e da própria administração. Surgiu até uma compilação de leis denominada Livros de Justiça.

O outro período vai de Pedro, o Grande, em 1689, até a revolução bolchevista de 1917. A Rússia volta suas vistas para o ocidente. Juridicamente, o povo fica submetido ainda aos costumes. Pedro I adotou um código de modelo sueco e Catarina II outro, de inspiração no Direito natural.

Depois de alguma influência do Direito Francês no reinado de Alexandre I, o Direito Russo, sob o reinado de Nicolau I consolidou-se numa coletânea chamada Svod Zadonov, em 1832, constando de quinze volumes e 42.000 artigos, chegando a 100.000 em outras edições, predominantemente voltada ao Direito Público. Todavia, só no reinado de Alexandre II, em 1862, o Direito Russo tentava uma modernização, com a abolição da servidão, reforma da organização judiciária e um código penal. Nada de direito privado.

O marxismo-Leninismo, em 1917, pela revolução armada, transformou por completo o Direito Russo. Sabe-se que a doutrina comunista terminava por abolir o Estado e o Direito. Com a abolição da propriedade privada e venda de produtos, e com a coletivização da propriedade, surgiram novos institutos de direito. O marxismo tem a convicção de que o mal de tudo está no antagonismo das classes sociais, na desigualdade. Isto gerou uma visão nova do Direito. Na sociedade sem classes não há lugar para o Estado, nem para o Direito. O homem fica livre, volta à sua origem, será senhor de si, não venderá sua força de trabalho. Nessa sociedade não haverá dominador, nem dominado. Será o paraíso com Adão e Eva sem punições.

Mesmo defendendo o deperecimento do Direito, a revolução comunista na fase de implantação manteve o Estado e a Justiça com a Ditadura do Proletariado, leis e planificação econômica para o próprio desenvolvimento do Estado. Até fins de 1989, o Direito Russo, já como Direito Soviético, ocupava uma vasta faixa de território mundial, compreendendo a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, o leste europeu, a China, alguns países da África e Cuba, na América Central.

A estrutura do Direito Soviético repousa na planificação da economia como forma de libertar o homem. Na primeira hora, várias leis foram elaboradas como afirmação da Revolução, e dizia LENIN: "Pouco importa que muitas das disposições dos nossos decretos nunca sejam executadas. A sua finalidade é orientar as massas no sentido do progresso". TROTSKY acrescentava: "Nos primeiros tempos, os decretos tinham mais importância como artigos de Propaganda do que como textos administrativos".

Havia uma desconfiança generalizada dos advogados, juristas e juizes. Era necessário salvar o país do cerco a que estava submetido pelos países capitalistas, daí a hegemonia da economia. Quando da implantação da "nova política econômica", todavia, o Direito Soviético viu promulgado os códigos civil, penal, do processo geral, da família e agrário, além da criação da Prokuratura para superintender a administração e incumbida da iniciativa das acusações junto aos Tribunais.

Na verdade, antes da Revolução Bolchevista, o povo russo já tinha pelas leis uma reserva explicável, porque, vindas dos soberanos, sempre visavam persegui-lo. Com a Revolução, o povo manteve o mesmo temor e foi alcançando isto que os revolucionários se dedicaram muito à propaganda dos decretos, relegando até o cumprimento.

O Direito serve para organizar as forças da produção e modificar o comportamento das pessoas, na fase socialista, para quando chegar o comunismo propriamente dito. A educação no Direito soviético ocupa um espaço muito grande.

As fontes do Direito Soviético são: a) a lei; b) a jurisprudência; c) o costume; d) as regras socialistas; e) a doutrina. A lei representa a vontade suprema dos dirigentes do comunismo e visa à educação das pessoas para as transformações sociais e econômicas. A Revolução Bolchevista foi feita por imposição legal. A lei não é resultado de um consenso, antes objetiva impor a vontade dos eventuais governantes. O Juiz interpreta a lei na visão da revolução do marxismo-leninismo, sem descer a outras considerações, principalmente porque, na elaboração dos instrumentos legais, o legislador está imbuído dos conceitos comunistas.

Cedamos a palavra ao Professor Szabo in Revue de droit international et de droit comparé, p. 172. "No Direito Socialista a lei não tem por finalidade camuflar a vontade da classe dirigente. Resulta que a noção e a função da interpretação se encontram forçosamente limitadas, não permitindo a vontade do legislador, nem na altura da promulgação da lei nem mais tarde, que se transforme o conteúdo das normas jurídicas, sob pretexto de interpretação, ou que se introduza na lei, ao abrigo de uma pretendida correspondência com o seu espírito, um elemento que lhe seja estranho. Nos Direitos burgueses, o Juiz tornou-se o personagem principal do sistema jurídico. A evolução socialista evita comprometer-se neste caminho. Toda a interpretação corretiva é contrário aos princípios do marxismo-leninismo". Não há no Direito Soviético a hierarquia jurisprudencial do Direito Inglês, onde os Tribunais Superiores, por suas decisões, obrigam aos inferiores. O Judiciário na União Soviética não é um poder na extensão do termo, e encontramos no art. 112 da Constituição Russa o seguinte: "Os juizes são independentes e apenas submetidos à lei". Ora, a Lei soviética é a expressão lata do interesse do marxismo-leninismo, e na sua interpretação, como vimos, não pode o julgador fugir daqueles princípios norteadores do Direito Soviético. Ademais, os juizes soviéticos têm duas grandes características: a) são eleitos por determinado tempo; b) não são necessariamente juristas. Por serem leigos e eleitos, são, obviamente, quase sempre filiados ao Partido Comunista. A justiça é colegiada. O Juiz está sempre acompanhado por assessores populares quando das suas decisões. Todos do Partido Comunista. Os assessores populares também são eleitos e por prazo certo.

Assim, no Direito Soviético, a jurisprudência não tem função de criar regras jurídicas e sim de facilitar a interpretação das leis pelos seus aplicadores.

O costume como fonte primeira do Direito Russo sofreu, consideravelmente, quando o Direito transformou-se em soviético, pela vontade férrea dos dirigentes do comunismo na sua implantação. Com a lei, tentaram acabar com o costume. As vezes, há lei no Direito Soviético que menciona a eficácia do costume em determinada região. É a acomodação do poder.

O costume da origem evolui, no Direito Soviético, para regras socialistas de vida em comum, no preparo do homem para o comunismo propriamente dito. Com a extinção do Estado e do Direito, restará para o homem viver as regras de vida em comum em uma comunidade. O art. 69 da Constituição Russa ensina: "o cidadão da União Soviética deve observar as normas da Constituição e as leis soviéticas, reajustar as regras de vida da sociedade socialista e manter dignamente o elevado título de cidadão da União Soviética".

A doutrina é a que dita os livros de MARX, ENGLES e LENIN. Os professores se limitam a facilitar o conhecimento pelos alunos do marxismo os Juízes, a aplicar a doutrina marxista nas suas decisões. Há alguns institutos que pesquisam com relativa liberdade, como o Instituto do Estado e do Direito da Academia de Ciências da URSS, o Instituto de Pesquisa Científica de Legislação Soviética e o Instituto Especializado em Ciências Criminais junto à Prokuratura, mas seus pesquisadores não são professores, nem juízes. As pesquisas são autorizadas e os resultados submetidos ao Estado.

Atualmente, aguarda-se com certa ansiedade o resultado da Perestroika, nova política de interpretação do marxismo-leninismo, com suas repercussões no Direito, para que possa ser formada uma nova análise do Direito Soviético.

4 Sistema jurídico Romano-Germânico

Roma é a cidade-país base de todo o sistema, assim como laboratório de formas de governo: realeza, república, principado, dominato, e, ainda hoje, exerce considerável influência nos vários sistemas expostos e fundamentais do sistema romano-germânico, com modificações impostas pelo curso da história.

No Direito Romano, encontramos três vertentes: a) a do direito antigo da origem de Roma (Etruscos versus povos do Lácio) a 126 a.c.; b) a do direito clássico (de 126 a.c. até o término do reinado de Deocleciano); c) a do direito romano-helênico (de 305 d.c. à morte de Justiniano, com destaque para o período do reinado de Justiniano).

Em 476 d. C., os bárbaros do rei Odoacro liquidam o Império Romano do Ocidente. O Direito Romano desaparece e restam informações cientificas, glosadas, rasuradas até, e ficam alguns costumes do que restou nas pessoas vencidas, que passaram a conviver com os bárbaros germânicos e seu Direito.

Só no século XIII o Direito Romano passou a ser estudado nas Universidades da Europa continental, principalmente na Alemanha, Espanha, França e Portugal. Com o fim da Idade Média e o desprestígio do cristianismo, a sociedade do renascimento voltou-se para o Direito como forma de manter a ordem e a segurança para o desenvolvimento dos povos. Só o Direito seria capaz de manter a Europa no caminho do progresso, e foi o sistema romano, agora transformado em romano-germânico, o responsável pela unificação jurídica do Continente sem a universidade política. As universidades são o ancoradouro do novo sistema e, nos laboratórios, seus institutos foram adaptados à nova realidade, sem perder a autenticidade herdada de Roma, antes de Cristo.

A Universidade de Bolonha foi a primeira, na Europa, a restaurar o estudo do Direito Romano, e logo outras recolheram a idéia, dentro da perspectiva de que, politicamente, seria muito difícil modificar situações estabelecidas e diferenciadas dos vários países europeus. Não havia, ainda, um Direito nacional nos países envolvidos. Surgem, logo, várias teorias dentro do estudo do Direito Romano (glosadores, pós-glosadores, escola culta, escola holandesa); duas, porém, ocupam mais espaço. A Escola de Direito Natural - não despreza o Direito Romano, mas questiona seus institutos e procura formalizar a divisão do Direito em público e privado. O Direito Romano é eminentemente privado. O Direito Natural defende os direitos inerentes à pessoa e a aplicação do Direito Romano com vistas à razão, à justiça, aos sentimentos e necessidades da sociedade. Chega a fundir o Direito Romano (Direito privado) com o Direito Inglês (Direito público -direitos naturais do homem, garantindo as liberdades individuais). A outra Escola é a Histórica Alemã, do século XIX; a Natural era do século anterior e visava ao estudo do Direito pela história e não pela legislação. A Natural defendia a codificação nos países. O grande inspirador da Escola Histórica foi SAVIGNY.

A Alemanha adotou o Direito Romano como base de sua legislação até a promulgação do Código Civil, em 1900. Outros países europeus, africanos, orientais e americanos (latinos) passaram à codificação a partir do século XVIII. A estrutura do sistema romano-germânico encontra guarida nos seguintes pontos: a) codificação; b) divisão do direito público e privado; c) respeito pela diversificação das várias formas de governo na aplicação do sistema; d) unidade do sistema com relação aos institutos originários do Direito Romano, naturalmente aperfeiçoados.

As fontes do sistema são: a) a lei; b) o costume; c) a jurisprudência; d) a doutrina; e) os princípios gerais.

A lei no sistema é a principal fonte em consonância com a sua estrutura. Não a lei como vontade determinada dos governantes, mas como resultado do consenso ou da maioria nos Parlamentos.

Embora com extensa codificação predominante no sistema, o costume ainda tem seu papel na formação do Direito, como infraestrutura de seus institutos e produto de uma consciência popular.

Ao lado da lei e do costume, a jurisprudência, como resultado de decisões dos Juízes pertencentes a um Poder independente, também concorre para a formação do Direito. Os Juízes têm liberdade de interpretar a lei e, assim agindo, constróem jurisprudência, sem afetar a principal fonte do sistema. Hoje, a jurisprudência, mesmo num sistema romano-germânico altamente codificado, acentua sua presença, com os Tribunais constituindo comissões para uniformizar suas decisões.

Sendo a universidade européia responsável pelo surgimento do sistema, claro que a doutrina continua como fonte formadora do Direito, e só recentemente, com a democratização dos países envolvidos e a codificação, perdeu espaço para a lei.

Princípios gerais colaboram na formação do Direito por determinação legal ou por circunstancias morais e éticas que exigem uma decisão objetiva da autoridade judiciária.

5 O direito processual Brasileiro como ramo do sistema Romano-Germânico

O Direito Romano chegou a Portugal já encontrando um Direito Canônico aceito pelo povo. A partir do século XIII o Direito Romano cuidava das coisas terrenas, e o Direito canônico das coisas espirituais, ressaltando que, em caso de conflitos entre os dois, prevaleceria o último.

Com AFONSO III, o Direito Romano, definitivamente, ingressa na vida do homem português.

A legislação portuguesa continua contraditória entre o Direito Romano e canônico, quando, em 1446, surgem as Ordenações Afonsinas com o objetivo de sistematizá-la, ordená-la e, por que não, codificá-la. As Ordenações Afonsinas foram divididas em cinco livros, estes subdivididos em títulos e em parágrafos. Compreendiam as fontes do Direito Português: leis antigas, respostas às petições endereçadas à Corte, concórdias, concordatas, costumes, normas das sete partidas e disposições dos Direitos Romano e canônico.

Sendo as Ordenações Afonsinas muito volumosas e não conseguindo alcançar todo o território português, D. MANUEL encarregou o licenciado Lourenço da FONSECA de reduzi-las a um único livro, de fácil circulação em todo o reino.

Em 1569, Duarte Nunes do LEÃO compilou com o nome de Coleção de Leis Extravagantes as que surgiram após as Ordenações Manuelinas, isto é, a dinâmica da vida comum exigia novas leis que foram reunidas nessa coleção.

Em 1603, no reinado de FELIPE II, apareceram as Ordenações Filipinas, contendo as Ordenações Manuelinas, a Coleção de Duarte Nunes e as leis que surgiram depois.

Antes de concluir esta pequena colocação histórica do Direito Português, não esquecer as contribuições dos bárbaros visigodos, que dominaram a península ibérica por volta de 585 e, por seu rei ALARICO, compilaram a legislação no Breviarium, depois Código Visigótico. Com a independência do país, em 1139, surgiram os forais.

O Brasil, quando descoberto, recebeu as Ordenações como norma de conduta legal para os descobridores e descobertos. Durante muitos anos, a nossa legislação era a portuguesa. Com a independência, as coisas começaram a mudar, embora lentamente. No Império tivemos o Código de processo civil, o Código comercial, algumas outras disposições legais, até que, em 25 de novembro de 1850, surgiu o Regulamento 737, contendo normas de Direito Substantivo e Adjetivo, que nos acompanhou até a proclamação da República, em 1889, quando, pelo Decreto 763, de 19 de setembro de 1890, o Regulamento passou a ser aplicado, também, no cível, excetuando os processos especiais, que continuaram a ser redigidos pelas Ordenações portuguesas. A Constituição de 1891 deu algum disciplinamento ao Direito, porém o país continuou ligado juridicamente a Portugal.

Em 1916, com a promulgação do Código civil, o artigo 1.807 revogou tudo:

"Ficam revogadas as Ordenações, Alvarás, Leis, Decretos, Resoluções, Usos e Costumes concernentes às matérias do Direito Civil reguladas neste Código".

Enquanto colônia, o Brasil pertencia ao Reino Unido de Portugal e Algarves e se regulava pela legislação processual portuguesa com poucas modificações, já acima expressas.

Com a Independência, uma lei de 20 de outubro de 1923 ordenou que vigorava no país a legislação de Portugal, enquanto os códigos não fossem organizados.

A Constituição de 1891 criou uma federação com a dualidade de justiça- federal e estadual - e dualidade de processos, autorizando os Estados a organizarem seus códigos.

Veio a Constituição de 1934, que no art. 5° estabeleceu que a União tinha competência absoluta para legislar sobre Direito processual.

Em 1940, surgiu o primeiro Código de processo civil e, em 1974, o segundo e atual. Também em 1942 foi promulgado o Código de processo penal.

O processo civil brasileiro obedece a alguns princípios básicos na sua marcha: a) dispositivo; b) a parte impulsiona o processo; c) concentrado; d) oral; e) imediatidade; f) livre convencimento do Juiz; g) publicidade; h) rígido na aplicação das normas; i) respeito aos prazos.

Sua estrutura repousa na livre discussão, envolvendo basicamente três pessoas: o autor, o réu e o Juiz, que representa o Estado. Visa a solucionar os conflitos, às vezes examina pendências graciosas.

6 O processo eleitoral no direito brasileiro

A legislação sobre processo eleitoral no Brasil data de 19 de junho de 1822, Decisão n. 37, firmada por José Bonifácio de ANDRADA, consubstanciando instruções para a eleição da primeira Constituinte, e continha: forma indireta da eleição, em dois graus, domicílio eleitoral, inelegibilidade, idade mínima, naturalização. A Constituição de 25 de março de 1924 tinha um capítulo, o IV, dedicado a "Eleições". O Decreto de 26 de março de 1824 foi baixado para regular o processo eleitoral: eleições das Assembléias paroquiais, nomeações dos eleitores paroquiais; apuração, colégios eleitorais, eleição para o Senado, Câmara e Conselhos Provinciais, eleição indireta.

Ainda no Império, tivemos o Decreto n. 2.675, de 20 de outubro de 1875, de iniciativa do deputado João ALFREDO, depois Primeiro-Ministro, chamada "lei do terço", que objetivava garantir a representação da minoria nos Parlamentos; criava o título de eleitor; competência à Justiça Eleitoral para conhecer das questões relativas às qualificações de eleitores, validade ou nulidade da eleição.

A primeira Constituição da República, de 24 de fevereiro de 1891 , tratava de eleições e eleitores. Todavia, a Lei n. 1.269, de 15 de novembro de 1904, denominada "Lei Rosa e Silva" teve uma grande importância para o processo eleitoral. Ela tratava: dos eleitores, do alistamento, dos recursos eleitorais, de revisão do alistamento, do título eleitoral, das eleições, do processo eleitoral, da apuração, da elegibilidade, da inelegibilidade, da incompatibilidade, das nulidades, das vagas, das multas, das disposições penais e divisão dos distritos.

A revolução armada de 1930 surgiu pregando no campo eleitoral o slogan "Representação e Justiça", com a extinção da eleição "a bico de pena" que vigorava na primeira República. Fortemente influenciada nessa parte por Assis Brasil, autor de um livro clássico na matéria, intitulado A democracia representativa foi baixado o Decreto n. 21.076, de 24 de fevereiro de 1932, instituindo o primeiro Código eleitoral do País, com 144 artigos e cinco partes: 1 - Introdução; 2 - da Justiça Eleitoral; 3 - do Alistamento; 4 - das Eleições; 5 - Disposições Gerais. Veio a Constituição de 16 de julho de 1934 e definiu o perfil da Justiça Eleitoral no art. 82: "A Justiça Eleitoral terá por órgãos: o Tribunal Superior de Justiça Eleitoral, na Capital da República; um Tribunal Regional, na Capital de cada Estado, na do território do Acre e no Distrito Federal; e juízes singulares, nas sedes e com atribuições que a lei designar, além das juntas especiais admitidas no art. 83, parágrafo 3°". Tornava o alistamento obrigatório, permitia o voto feminino, impedia o voto do analfabeto e o voto passava a ser obrigatório.

Atualmente, temos, dentre outros, dois importantes instrumentos legais de natureza eleitoral: o Código eleitoral, de 15 de julho de 1965, com 385 artigos, divididos em: Introdução - Dos órgãos da Justiça Eleitoral - Do Tribunal Superior Eleitoral - Dos Tribunais Regionais - Dos juízes Eleitorais - Das Juntas Eleitorais - Do alistamento - Dos Delegados de Partido - Das eleições - Do voto secreto - Da cédula oficial - Da representação proporcional - Da votação - Da apuração - Dos diplomas - Das nulidades de votação - Das garantias eleitorais - Da propaganda partidária - Dos recursos - Disposições penais - Dos crimes eleitorais - Do processo das infrações; e a lei n. 5.682, de 21 de julho de 1971, denominada Lei Orgânica dos Partidos Políticos, com 130 artigos, divididos em: Das disposições preliminares -Da Fundação e do Registro de Partidos - Do Programa e do Estatuto dos Partidos - Dos Órgãos dos Partidos ( Das Disposições Gerais - Das Convenções e dos Diretórios dos Partidos) - Da Filiação Partidária - Da Disciplina Partidária ( Da Violação dos Deveres Partidários - Da Perda de Mandato por Infidelidade Partidária) - Das Finanças e da contabilidade dos Partidos - Do Fundo Partidário - Da fusão e da Incorporação dos Partidos - Da Extinção dos Partidos -das Disposições Gerais - Das Disposições Finais.

Defendemos uma legislação eleitoral estável. sem sofrer a malévola influência das paixões partidárias às vésperas das eleições, consubstanciada em um Código Geral, isto é, com matéria substantiva, adjetiva crimes, infrações e penas.

Um processo eleitoral que tenha os seguintes princípios: a) oralidade; b) dinâmico; c) impulsionado pela Justiça; d) concentrado; e) público; f) garantido pela aplicação plena do instituto de preclusão; g) atos praticados por leigos (sistema jurídico soviético); h) rito sumarissimo.

O processo eleitoral deve ter como fontes. a) a jurisprudência - as decisões da Justiça Eleitoral são muito relevantes na aplicação do direito. Os acórdãos e resoluções do Tribunal Superior Eleitoral são fundamentais ao bom resultado das pendências judiciais no âmbito do Direito Eleitoral. 0 sistema inglês pode, perfeitamente, nos fornecer subsídios a respeito; b) a Lei - não podemos fugir à grande fonte do sistema romano-germânico, A lei continua como resultado final de todas nossas aspirações no campo jurídico; c) os princípios gerais de direito - sendo o Direito Eleitoral um ramo novo da ciência jurídica, não pode prescindir dos princípios gerais do direito, mormente na fase de sua formação teórica; d) o costume - como fonte universal de todos os direitos, será também do processo eleitoral brasileiro.

Advogado.

Publicado na RESENHA ELEITORAL - Nova Série, v. 2, n. 1 (jan./jun. 1995).

 

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