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Estado de partidos: a solução para a crise de representação política no Brasil

Por: Daniel Schaeffer Sell / Ilenia Schaeffer Sell

1 Introdução

Como objeto principal deste estudo, a representação político-partidária será analisada a partir de sua construção histórica, de modo a determinar em qual contexto foi concebida e para que finalidade. Com a formação desse arcabouço, será avaliada a situação dos fundamentos desse instituto no Brasil, com suas mazelas e virtudes.

O objetivo principal, então, é dissecar a atuação dos partidos políticos, com vistas a verificar sua real contribuição para a representação política, permitindo questionar a sua forma de participação – como único mediador na formação da vontade estatal –, decorrência de previsão constitucional: o monopólio da representação política.

Algumas teses foram estudadas e citadas no texto, demonstrando as várias possibilidades que vêm sendo apresentadas para solucionar o problema da participação do povo na formação da vontade estatal. Por essa razão, no começo do estudo, verificou-se como hipótese primária a necessidade de oferecer alternativas ao monopólio da representação política. A conclusão atingida, entretanto, constante da parte final do trabalho, demonstra a necessidade de tão-somente aperfeiçoar-se o modelo existente, que, não obstante outras possibilidades, parece ser o melhor para o contexto político vivido pelo Brasil.

O método da pesquisa é o dedutivo. Tendo em vista a profundidade do tema, muitas questões não essenciais à consecução dos objetivos previstos – embora muito interessantes para estabelecer uma maior visão da problemática apresentada – foram relegadas a segundo plano, sendo somente citadas.

No primeiro capítulo do trabalho, será necessária uma avaliação do fenômeno em que se constituíram os partidos políticos, de modo a determinar qual a função para que foram criados e o motivo pelo qual tiveram tão rápido desenvolvimento.

Na seqüência, à análise da representação política impõe-se a necessidade de delimitação de seu contexto histórico, considerando as grandes revoluções democráticas e suas implicações na direção dos Estados em que ocorreram.

O terceiro capítulo faz uma análise do Estado de Partidos, a materialização da representação político-partidária, e uma evolução indireta do pensamento liberal, imediatamente anterior, a partir da falência do modelo de Estado Liberal.

Na conclusão, a avaliação dos institutos anteriormente discutidos forma a base para a afirmação da necessidade, não de novos formatos para a atuação política do povo no Estado, mas do aperfeiçoamento e confirmação do sistema existente.

2 Partidos políticos: um conceito

O fenômeno dos partidos políticos pode ser considerado recente. Para Duverger, os grupos aos quais se refere hoje a expressão partidos políticos datam de apenas um século e meio.1 Como se pode explicar, portanto, tão rápida evolução de um instrumento que acabou por se integrar à estrutura estatal de tal forma a ponto de hoje um Estado democrático somente ser dado como tal desde que permita a livre atuação de partidos?

Um conceito amplo de partidos pode remontar às civilizações antigas e a todas as subseqüentes formações sociais ou estatais. Contudo, por não ser escopo do presente trabalho realizar um estudo histórico aprofundado, analisar-se-ão tão-somente a significação estrita do vocábulo e suas implicações no ambiente político-democrático moderno.

Inicialmente, o vocábulo partido “tem sua origem no latim, do verbo partire, no sentido de dividir, de parte, de fração, de pedaço, no sentido de que um todo seria composto de partes” (MEZZAROBA, 2004, p. 91). Seu significado político, entretanto, não provém do latim.

O vocábulo utilizado anteriormente por sociólogos e cientistas políticos para se referirem aos agrupamentos que procuravam influenciar o governo do Estado era facção, que designava todos os grupos políticos existentes. Nesse período, o próprio fato de existirem facções, por força de definição, era visto como um prejuízo ao “bom” exercício do poder, já que elas se contrapunham ao governo.2

A partir do momento em que a palavra parte – depois de perder seu sentido original – adquiriu o significado de participação, partilha, associação, sua derivação partido começou a ser utilizada com a conotação política que temos hoje. E isso aconteceu somente em meados do século XVIII (SARTORI, 1982, p. 48). Uma das justificativas, portanto, à incipiência do estudo relacionado aos partidos políticos.

A primeira definição política consistente do termo partido pode ser encontrada em Edmund Burke: “o Partido é um grupo de homens unidos para a promoção, pelo seu esforço conjunto, do interesse nacional com base em algum princípio com o qual todos concordam” (BURKE. In: CHARLOT, 1982, p. 29). No mesmo sentido, para Kelsen,3 os partidos políticos surgiram da necessidade de os indivíduos se associarem com vistas a influenciar, com sua vontade política, a direção tomada pelo Estado.

É Duverger quem relaciona o desenvolvimento dos partidos à recente ampliação da democracia, com a extensão do sufrágio popular e das prerrogativas parlamentares.4 Segundo o autor, são três as origens dos partidos políticos: 1) a partir da constituição dos parlamentos, os parlamentares passaram a se reunir em grupos que representavam a mesma localidade geográfica ou, ainda, que comungavam de idéias ou interesses semelhantes; esses foram os partidos de origem parlamentar; 2) com a rápida extensão do sufrágio popular, surgiu a necessidade de cooptação dos novos eleitores que não tinham idéia alguma de que candidatos escolher; aliou-se a essa idéia o desenvolvimento do princípio de igualdade; o resultado foi visto quando o povo percebeu a falta de representatividade na direção do Estado e, por conseqüência, decidiu retirar o poder das mãos das elites; foram criados, então, comitês eleitorais para cada candidato, com o objetivo de orientar a população a respeito das propostas destes; assim surgiram os partidos de origem eleitoral; 3) alguns partidos foram concebidos a partir de instituições preexistentes, interessadas em atuar junto ao governo por seus próprios interesses; esses foram os partidos de origem externa.5

Esse foi o modelo clássico estabelecido para o estudo do surgimento de partidos. Todos são, como se pode constatar, decorrência da ampliação da participação de pessoas na direção do Estado, estendida a toda a população. Pode-se dizer que aí reside a natureza mais objetiva da experiência partidária. Não há como observar evolução democrática apartada da organização da sociedade em partidos que verdadeiramente possam influenciar as decisões do Estado. Do contrário, o governo não é legitimado pela vontade popular, mas pela de poucos que têm acesso ao “príncipe”, como Maquiavel demonstraria.

Charlot, contudo, considera ultrapassado o modelo acima apresentado, tendo em vista estudos que identificam, na maioria dos atuais partidos políticos de vários lugares do mundo, uma gênese diferente das encontradas nas fórmulas de Duverger (CHARLOT, 1982, p. 8).

Pelo modelo de Lapalombara, o partido político é, a um tempo, efeito e condição do impulso rumo à modernização. Seu estudo demonstra outro paradigma para a constituição dos partidos, observado em Estados em que a democratização e o desenvolvimento social são mais recentes, diferentemente dos exemplos encontrados em países com história democrática consolidada há mais tempo, como Estados Unidos, Inglaterra e França (LAPALOMBARA; WEINER. In: CHARLOT, 1982, p. 9).

A definição de Lapalombara apresenta o balizamento da definição de partido a partir de quatro postulações:

1. uma organização durável, ou seja, uma organização cuja esperança de vida política seja superior à de seus dirigentes no poder;

2. uma organização local bem estabelecida e aparentemente durável, mantendo relações regulares e variadas com o escalão nacional;

3. a vontade deliberada dos dirigentes nacionais e locais da organização de chegar ao poder e exercê-lo, sozinhos ou com outros, e não simplesmente influenciar o poder;

4. a preocupação, enfim, de procurar suporte popular através das eleições ou de qualquer outra maneira (LAPALOMBARA; WEINER. In: CHARLOT, 1982, p. 19.)

Como se pode observar, portanto, a definição do termo partido político gradativamente deixa de considerar o resultado da luta entre classes sociais ou entre interesses de coletividades – observada na época das facções – e passa a comportar a idéia de um grupo com vontade deliberada de exercer o poder estatal perante a sociedade que o constituiu.

Para Sartori (1982, p. 46), em seu processo de racionalização, três fundamentos são considerados para a existência efetiva de um partido: “1. os partidos não são facções; 2. um partido é parte-de-um-todo; 3. os partidos são canais de expressão”. O autor, explicando o terceiro item, esclarece: “isto é, pertencem, em primeiro lugar e principalmente aos meios de representação: são um instrumento, ou uma agência, de representação do povo, expressando suas reivindicações”. Isso não quer dizer que os partidos somente expressem as reivindicações do povo, visto que isso poderia ser realizado por outros instrumentos existentes. O próprio autor conclui: “os partidos não expressam apenas, eles também canalizam” (p. 48-50).

Mezzaroba (2004, p. 90), por fim, sistematiza esses pensamentos e, ao explicar a expressão partidos políticos no ambiente contemporâneo em que é utilizada, demonstra que comporta o conceito de “instrumentos mediadores entre a sociedade e o Estado, com a função de aglutinar vontades individuais e harmonizá-las em vontades coletivas”. Diante dessa conceituação, observa-se que os partidos passaram a ser a própria essência da democracia, não havendo mais como excluí-los da formação do Estado que se tenha por democrático.

A partir desse conceito, passa-se ao estudo dos partidos políticos como efetivos objetos de conhecimento.

A desmarginalização e recente ascensão dos partidos políticos ao status de instrumentos democráticos teve como conseqüência a sua constitucionalização e, concomitantemente, a necessidade de estudos que pudessem inseri-los nos novos ordenamentos que se estabeleceram. Mezzaroba privilegia, entre as várias abordagens desse fenômeno, o estudo de três principais: a funcional,6 a estrutural7 e a orgânica, dentre as quais nos deteremos somente na última.

Para a abordagem orgânica, o partido é um organizador e aglutinador de forças, que tem por finalidade atingir objetivos de ordem ideológica, ou seja, “o partido se apresenta como canalizador de aspirações, de necessidades e de esperanças de universalização da vida de todos os homens, e não apenas de seus adeptos ou de um pequeno segmento social” (MEZZAROBA, 2004, p. 119). Destaca-se nessa corrente o pensamento de Gramsci, pelo qual o partido passa a ser o moderno Príncipe, que representa a inteligência e a vontade coletiva. Assim, “mais que mera instância de representação política, ao partido cumpriria a missão de possibilitar o desenvolvimento da consciência política dos seus integrantes e, a partir deles, da Sociedade como um todo” (MEZZAROBA, 2004, p. 123).

3 A representação política

O termo representação possui vários significados possíveis, decorrentes da origem etimológica da palavra. Segundo Mezzaroba (2004, p. 10), “representação tem como origem o substantivo latino repraesentare, cujo sentido seria o de tornar presente algo que, na verdade, encontra-se mediatizado, comportando também o sentido de reprodução de um objeto dado”.

A representação em sua face política não pode ser entendida como aquela encontrada no Direito Privado,8 visto que não tem as mesmas vertentes e é diretamente relacionada ao exercício do poder público.

Conforme demonstram os historiadores, a representação política aparece somente depois das revoluções havidas em sistemas que não contemplavam alguma forma de participação política, ou seja, onde o poder se encontrava nas mãos de um ou de poucos e a maioria do povo não tinha direito à participação nas decisões de governo. Assim, somente quando o povo (ou instâncias deste) se insurgiu para se fazer ouvir por seus governantes e, por conseguinte, quando o poder se deslocou das mãos de um ou de poucos para a nação,9 a representação aparece como instrumento político das massas.

Na formação do parlamento inglês, as primeiras reuniões, compostas por lordes, cavalheiros e burgueses, tinham como objetivo discutir assuntos somente por convocação do rei. Com a crescente instabilidade encontrada pela monarquia absolutista, esses “parlamentares” passaram a ser vistos, mesmo que ainda no regime absolutista, como representantes de suas comunidades e, por conseqüência, do povo, investidos da responsabilidade de resguardar os interesses daqueles que os comissionaram (MEZZAROBA, 2004, p. 16-19).

Conseqüência desse período no recém-constituído Estado Liberal – originado na luta contra as monarquias absolutistas –, a formação estatal acabou por dar corpo ao instituto da representação e torná-lo uma das principais características da democracia, com a marca do fim dos regimes absolutistas e da chegada dos governos das massas. Nesse modelo, os representantes são aqueles eleitos para atuar junto ao governo em nome dos interesses de seus representados, em quem reside todo o poder.10

Com a crescente luta por liberdade e igualdade, o Estado Liberal apresentou linhas mais bem definidas e, com a Declaração dos Direitos do Homem, na França de 1789, essa evolução do pensamento restou brilhantemente demonstrada. Fruto desse contexto filosófico e político, Sieyès desenvolve uma doutrina baseada fundamentalmente no conceito de nação, que acabou por tornar-se um dos principais impulsos para a Revolução Francesa. Para Sieyès (apud MEZZAROBA, 2004, p. 38-39), tendo-se por parâmetro a igualdade entre os indivíduos, o poder constituinte somente pode ser eficaz se determinado pelo princípio da representação.

Faz-se importante observar, contudo, que a Constituição Francesa de 1791 declara que os parlamentares eleitos já não são considerados representantes de seus representados em particular – como se observou no desenvolvimento inicial do parlamento inglês –, mas de toda a nação (MEZZAROBA, 2004, p. 43). A atuação do representante, portanto, é condicionada não mais aos interesses de uma coletividade, mas ao seu próprio plano de políticas públicas para a direção da vontade estatal, apresentado para a nação durante a campanha eleitoral. Teoricamente, são eleitos aqueles que apresentam planos que atendam à maior parcela da nação.

A democracia como governo do povo, então, somente poderia se realizar por meio de representantes que atuassem segundo o mandato determinado pelo próprio povo. Surge, assim, o termo democracia representativa que, segundo Kelsen (1992, p. 283), é aquela em que “a função legislativa é exercida por um parlamento eleito pelo povo, e as funções administrativa e judiciária, por funcionários igualmente escolhidos por um eleitorado”.

Pode-se inferir que a representação política não se confunde com o conceito de democracia,11 mas é, para a realização efetiva dessa, instrumento essencial, visto que a nação é agora a titular da soberania e, pela impossibilidade material de exercê-la de forma direta, transfere-a para seus representantes. Assim, toda a teoria da democracia tem no instituto da representação política um de seus principais fundamentos.

Importante lembrar que a representação política sempre vai se dar entre eleitos e eleitores, haja vista não se poder falar em representação sem uma eleição que permita ao detentor do poder – o povo – a escolha daqueles que melhor demonstrem representá-lo.

O sistema representativo, para Baracho (1983, p. 111), está diretamente relacionado à “dinâmica do processo político eleitoral, que por sua vez constitui a base do equilíbrio social e a estabilidade política”. O autor define a figura jurídica da representação a partir da “relação representativa” que dela decorre, considerando quatro quesitos:

a) os eleitos não representam seus eleitores, mas uma entidade abstrata, a Nação ou a coletividade popular inteira;

b) não existe qualquer relação jurídica entre “representantes” e “representados”;

c) não existe a possibilidade, na maioria dos Estados, de os eleitores revogarem o mandato concedido aos eleitos;

d) a relação é exclusivamente bilateral, entre representante e representado, não trilateral, com a representação da vontade [BARACHO, 1983, p. 107.]

Observa-se, dessa forma, a clara necessidade de haver, em um sistema que consagre a representação política, legitimidade dos representantes eleitos, a qual não será encontrada no sistema jurídico propriamente dito, mas subjacente ou superior a ele. Isso porque somente a representação legítima como fonte do poder de autoridade gera a obediência legítima, essencial para a manutenção do equilíbrio político-social (BARACHO, 1983, p. 111).

À ligação entre o representante e o representado, que diz respeito ao conteúdo próprio da relação de representação política, é dado comumente o nome de mandato. Ainda segundo Baracho (1983, p.110), “a instrumentalização do processo político ocorre através de mecanismos jurídicos, entre os quais destaca-se o ‘mandato representativo’”. Historicamente, entretanto, o mandato representativo não foi o primeiro formato que se apresentou como solução para o problema da representação.

Anteriormente às grandes revoluções, pode-se observar a instauração de procedimentos que acabaram por instituir o mandato imperativo como regra da representação das comunidades que se queriam fazer ouvir diante dos seus senhores nos feudos. Como demonstra Mezzaroba (2004, p. 71-74), o mandato político nessa época estava intimamente ligado à noção de mandato oriunda do Direito Privado, em que o representante estava adstrito a atuar nos limites das instruções da comunidade que o elegia, sob pena de ter seu mandato imediatamente revogado.

A noção de soberania popular, como se observa desse formato, aproximava-se da teoria de Rousseau, em que cada indivíduo detém uma parcela da soberania. Dessa forma, o representante atuava em nome do representado, respondendo no limite da parcela da soberania que cada grupo possuía.

Esse modelo, contudo, acabava sempre por privilegiar políticas locais em detrimento da vontade de toda a nação, transformando o embate político entre os representantes em conflitos entre regiões. No momento histórico seguinte, o mandato imperativo foi sendo gradativamente substituído pelo mandato representativo, onde o representante deixa de estar vinculado à vontade dos representados que o escolheram e passa a responder pela vontade de toda a nação, considerados os interesses gerais. O representante eleito, conseqüentemente, é responsável, não mais pela intermediação em favor de uma política local, mas, como já visto, pela preservação ou perseguição do bem-estar social; é eleito por ter maior capacidade de ponderar e decidir sobre qual a melhor política para a melhoria de condições de todo o povo.

A soberania, nesse caso, é deslocada para o órgão representativo (MEZZAROBA, 2004, p. 75), que passa a ser o detentor imediato do poder – proibido o mandato imperativo e, por resultado, proibida a revogação dos mandatos. O detentor mediato da soberania – o povo – atuaria de forma efetiva durante os processos de escolha de seus representantes, encerrando-se a sua função quando vencidas as eleições.

Apesar da clara evolução do pensamento sócio-político, que permitiu a construção do modelo de Estado Liberal e da representação política apoiada em indivíduos – porque vinculado a uma idéia mais ampla de poder –, o mandato representativo tem sofrido graves críticas dos autores modernos. Especialmente porque, por meio dele, se perde a capacidade de controlar as decisões que dizem respeito à soberania, visto que tomadas independentemente pelos representantes que, muitas vezes – se não todas –, podem tomá-las com vistas a favorecer interesses próprios ou de terceiros, em detrimento dos reais interesses sociais. O caráter oligárquico que têm assumido suas decisões acaba por aumentar ainda mais a insatisfação dos representados com o exercício das funções pelos representantes.

Isso fez com que o sistema de representação do Estado Liberal entrasse em falência e, por força da correnteza, os institutos que o formam também fossem condenados ao sofrimento. Quanto mais se espera que homens resolvam a situação, mais as esperanças se esgotam, e mais o povo desacredita seus representantes legalmente eleitos. Usando o termo “legalmente”, tem-se a real idéia do acontecido, visto que os sistemas eleitorais, por vezes, permitem que muitas mazelas direcionem o processo eleitoral, tornando a eleição uma solução legal, mas ilegítima. Para Krystian Complak (2006, p. 51), na visão dos autores que comentam a democracia representativa na América Latina, “a razão principal deste distanciamento entre cidadania e deputados está na intermediação dos partidos políticos”. Os partidos, assim, seriam o elo defeituoso do sistema de representação, desestruturando, dessa forma, o conjunto de medidas democráticas estabelecidas constitucionalmente.

Por essa razão, em grande parte, os partidos têm sido considerados os mal-amados da democracia (SEILER, 2000, p. 5). As críticas ao modelo de democracia intermediado por eles têm levado vários autores a questionar a real necessidade da participação dos partidos nas democracias contemporâneas. Não parece, contudo, que a raiz desse sentimento de aversão seja de responsabilidade deles. A crise é, certa e limpidamente, neles observada, mas não por eles criada.

A situação crítica – no mundo e no Brasil – diz respeito não somente aos partidos, mas à representação política, dada a instabilidade das instituições que determinam nosso contexto político. Alguns índices, como o crescente absenteísmo eleitoral e a drástica redução da filiação partidária em vários países do mundo (ARAÚJO, acessado em 30.11.2006, item 3), demonstram claramente essa teoria. O descrédito é relacionado mais proximamente à forma e ao modelo de representação do que propriamente aos instrumentos que a realizam.

Para Comparato (In: ROCHA, 1996, p. 63-65), um dos principais vícios do sistema eleitoral brasileiro não resulta da existência de partidos como intermediários, mas do “personalismo dos candidatos a postos parlamentares”, que é decorrência direta da cultura nacional, formada por institutos antigos e retrógrados que desvirtuam por completo a realização da representação política pelos partidos. Os resultados monstram-se catastróficos: “por ocasião das eleições, [os Partidos] lançam-se todos à caça dos ‘puxadores de votos’, de modo a atingir um elevado quociente partidário. […] os ídolos populares, uma vez eleitos, consideram-se desvinculados do partido que os procurou tão-só para o desempenho eleitoral”. A fidelidade aos princípios partidários, portanto, nunca é atingida, visto que o ritual eleitoral desempenhado pelo eleitorado considera somente a personalidade que parece melhor representá-lo, não o partido a que ela é vinculada. As distorções geradas por essa escolha são percebidas já no curto prazo, com o enfraquecimento dos partidos e o fortalecimento de um novo tipo de “coronelismo”, próprio dos bancos parlamentares.

Pode-se extrair desse pensamento de Comparato que o sistema que deveria ser apoiado nos partidos, e não o é efetivamente, perde seus fundamentos e permite a manipulação dos resultados por forças que somente buscam perpetuar sua influência no poder. A soberania deixa, novamente, as mãos da nação e se desloca para a de poucos, como na demagogia aristotélica.

Apesar da impressão causada pela Constituição Federal de 1988 em alguns de seus artigos – como o inc. V do § 3º do art. 14, que prevê a filiação partidária como condição de elegibilidade –, a democracia encontrada no Brasil está longe do modelo a que se propõe: um Estado de Partidos. Facilmente se observa a crise partidária havida no meio político, mas pouco se tem visto de busca por mudanças, já que, para a alteração do status quo, muitas oligarquias encontradas em nosso cenário político seriam arrancadas do poder.

A democracia partidária, ou o Estado de Partidos – nas palavras de Kelsen12 –, seria composta por um sistema em que o partido detém o mandato político e os representantes eleitos ocupam uma função partidária comissionada. Somente dessa forma o partido político poderia completar integralmente a finalidade para a qual é constituído na sociedade atual: ser responsável por aglutinar as vontades individuais, fixando as metas e diretrizes para a realização da vontade estatal, por meio dos representantes eleitos.

4 O Estado de Partidos

Para Baracho (1983, p. 111), os partidos políticos são o principal meio instrumental para que a sociedade possa atuar como povo. Por intermédio dos partidos, segundo essa afirmação, realiza-se o objetivo maior do regime democrático, o que demanda construir, em torno deles, todo o sistema político, de modo a permitir sua correta utilização pela sociedade.

Ainda que os partidos sejam canalizadores de opinião, deve-se considerar que sua composição interna corresponde a apenas parte de uma sociedade. Sua função, contudo, excede a mera representação de seus membros. Seu papel no jogo político passa a ser mais amplo, de modo que é ele o responsável por traduzir e converter “as reivindicações setoriais em projetos políticos globais”. E Seiler (2000, p. 36, grifou-se) conclui: “a democracia é o regime exclusivo dos partidos”.

De acordo com Sartori (apud SANTANO, 2006, p. 27):

Os partidos políticos têm-se, em realidade, transformado num elemento de tal modo essencial ao processo político que em muitos casos poderíamos com legitimidade chamar a democracia não simplesmente de um sistema de partido, mas uma “partidocracia” (partidocrazia), significando isso que a sede do poder é realmente deslocada do governo e do parlamento para os diretórios partidários. Isso não é tudo. O estudo da fenomenologia dos partidos é também sintomático de um ponto de vista. Isso porque, se o modo de vida democrático se origina da criação voluntária de pequenas e livres comunidades “inter pares”, os partidos também são formados como associações voluntárias e constituem, de fato, a sua expressão política num sistema democrático de organismo político que mais de perto se assemelha, ou devia assemelhar-se, ao protótipo de toda a forma democrática autêntica.

Essa função de intermediários entre a sociedade e o governo foi concebida somente após a evidente crise observada no sistema de representação do Estado Liberal. Não são mais os representantes os responsáveis pela intermediação, mas os partidos. Por isso se pode apontar esse modelo como um aperfeiçoamento do sistema de representação política (MEZZAROBA, 2004, p. 84). Sua constante atuação e a necessidade de se garantirem meios de controle mais próximos e acessíveis à sociedade exigiram a construção do Estado de Partidos.

Para Kelsen (acessado em 30.11.2006, p. 1), um de seus criadores e defensores, a democracia requer, necessária e inevitavelmente, um Estado de Partidos. O autor afirma que toda atitude avessa à sua implantação é, no fundo, contrária à democracia. Assim sendo, não se pode falar em democracia sem que haja a constitucionalização dos partidos, ou seja, seu reconhecimento formal no sistema jurídico posto, especificamente no plano constitucional. Qualquer esforço no sentido contrário seria uma tentativa de prejudicar a própria democracia.

A finalidade dos partidos políticos, pelo modelo do Estado de Partidos, é ainda de, além de funcionarem como instrumentos mediadores entre a Sociedade e o Estado, serem o elemento de ligação entre a sociedade e seus representantes eleitos. As vontades individuais são inicialmente aglutinadas nas estruturas internas dos partidos para serem canalizadas e harmonizadas em seu interior e, somente então, transformadas em metas programáticas que serão levadas ao debate político pelos representantes eleitos (MEZZAROBA, 2004, p. 155).

Observa-se, assim, que a formação da vontade popular ocorre no seio dos partidos políticos; não mais no parlamento ou em outros grupos políticos ou de pressão. Segundo Mezaroba (2004, p. 85), nesse modelo, os partidos são o único instrumento que permite “canalizar a vontade de cada um dos representados, buscando expressá-la de forma unificada e organizada”. A identificação dos representados com seu representante deixa a esfera da personalidade individual e única – observada nos sistemas de representação liberal, em que os eleitos não têm vínculo algum de responsabilidade com os eleitores – e passa a se constituir numa relação com os princípios e programa partidários. O mandato dos eleitos, portanto, passa a ser exercido por novos mediadores entre sociedade e Estado, os partidos políticos, motivo pelo qual recebe a denominação mandato partidário.

Radbruch vai além e conclui da seguinte forma, nas palavras de Mezzaroba (2004, p. 173):

a) a organização dos indivíduos em torno de Partidos Políticos é imprescindível para a formação da vontade coletiva; […] c) no Estado de Partidos, os eleitores devem selecionar não os candidatos individualmente considerados, mas, fundamentalmente, o programa de um dos Partidos que lhes são apresentados no processo eleitoral; d) o representante (Deputado) só representará efetivamente a totalidade do Povo se vier a atuar de acordo com os princípios estabelecidos por seu Partido, pois, de acordo com a lógica do Estado de partidos, a formação da vontade estatal somente poderá ser construída com a participação proporcional de todos os Partidos Políticos; e e) o representante deve ser eleito não pelos seus méritos ou deméritos pessoais, mas por ser membro de um Partido. Assim, as ações e convicções políticas do representante (Deputado) deve dar lugar às deliberações estabelecidas democraticamente pelo Partido, sob pena de o representante sofrer as sanções partidárias; em seu caso extremo, com a perda do mandato.

Os representantes passam a ser meros executores das metas programáticas estabelecidas nas reuniões partidárias, e não mais atores do processo político, diminuindo a possibilidade de atuarem segundo interesses pessoais ou de terceiros.

Leibholz (apud MEZZAROBA, 2004, p. 176-177) foi quem estabeleceu o modelo mais completo de Estado de Partidos, considerando a discussão em torno do debate constitucional na Alemanha sobre a função que os partidos políticos deveriam desempenhar em uma democracia. Segundo o seu modelo, dois são os requisitos necessários à implementação do Estado de Partidos: sua constitucionalização anterior e o reconhecimento jurídico-constitucional positivado da relevância fundamental deles para o sistema político democrático. Para o autor, essa seria a formalização de um processo já consolidado nas democracias atuais, mas que, somente desse modo, possibilitaria o desenvolvimento do modelo de Estado de Partidos (ou Democracia de Partidos) no ordenamento posto, tornando-se parte integrante da estrutura constitucional.

No Estado de Partidos, “a vontade dos indivíduos seria previamente determinada e harmonizada na estrutura interna dos partidos. As organizações partidárias seriam transformadas, assim, em catalisadoras das políticas públicas” (MEZZAROBA, 2004, p. 157). Portanto, a realização da vontade estatal seria determinada diretamente pelas vontades que compõem as bases partidárias. Somente assim se pode aproximar as decisões de governo à soberania do povo, atingindo o modelo mais próximo ao ideal apresentado pela democracia direta.

Com a vontade política sendo gestada no interior das organizações partidárias, o mandato desloca-se do eleito para o partido político a que é filiado, deixando de ser representativo (representante de todo o povo) e passando a ser partidário (representante das vontades partidárias). Não deve, todavia, ser confundido com o mandato imperativo, vinculado a um setor da sociedade. O mandato é do partido – considerado na função de buscar aplicar a sua vontade às políticas públicas –, que comissiona o representante para atuar dentro do escopo das diretrizes partidárias estabelecidas nos estatutos, metas e assembléias dos membros do partido, e que é titular do direito de revogar o mandato comissionado, na medida em que o representante desrespeite suas instruções (MEZZAROBA, 2004, p. 180).

O instituto da fidelidade partidária, portanto, passa a ter caráter fundamental para a realização do Estado de Partidos, visto que o papel do representante deixa o de centro das decisões políticas e passa a elo da organização da vontade estatal. Suas decisões são determinadas pelo embate político das vontades intrapartidárias. A vontade estatal, por fim, será o resultado de todas as vontades partidárias contrapostas no parlamento.

Decorrência da fidelidade, a democracia intrapartidária é condição para a realização da democracia no Estado de Partidos, visto que o debate que ocorre no seio do partido é o responsável por determinar qual a vontade do povo para as políticas públicas. Assim, deve haver mecanismos para que todas as correntes que formam os partidos possam ser ouvidas, respeitando a verticalidade ascendente da formação da vontade partidária – e nunca o seu inverso –, tais como:

[…] participação dos membros de forma direta ou por seus representantes nas convenções e nos órgãos da organização; garantia do voto aos militantes em qualquer decisão e em qualquer nível do Partido; garantia de alternações periódicas dos cargos de direção do Partido; direito da revogabilidade dos cargos; garantia de que os órgãos sempre decidam de forma colegiada; prevalência do princípio majoritário nas votações em todos os órgãos do Partido; liberdade de expressão no interior da organização; direito de abandonar o Partido a qualquer momento; direito da ampla defesa em caso de eventual aplicação de sanções internas; direito de informação sobre qualquer assunto de interesse de organização; liberdade para que o filiado possa debater suas idéias; o direito de formar correntes de opinião; transparência nas finanças e na contabilidade da organização; inclusão de uma “cláusula de consciência” para os representantes para efeitos do mandato partidário [MEZZAROBA, 2004, p. 182-183].

Observa-se, assim, que as decisões que afetam a vida dos cidadãos são tomadas por eles mesmos – harmonizadas dentro do partido e canalizadas para o debate da vontade estatal -– e não mais pela vontade única do representante, como acontece no modelo de democracia representativa do Estado Liberal. Como conseqüência lógica, o representante será eleito não por sua personalidade ou histórico político, mas por pertencer a determinado partido – mesmo que essa possibilidade ainda seja presente.

Por fim, não se pode deixar de comentar a necessidade de que o sistema partidário, nesse modelo, seja de mais de um partido, de modo que cada parcela da sociedade esteja representada em alguma organização partidária, fortalecendo o conteúdo democrático do embate político entre as diversas “partes”. Nesse sentido, para Kelsen, todas as concepções políticas precisam estar representadas no parlamento (apud MEZZAROBA, 2004, p. 171). Portanto, caso algum partido reclame para si o posto de portador único da vontade popular, estará ele atacando diretamente o seio da democracia, que somente pode se realizar a partir do embate político entre os partidos, de modo que a vontade coletiva tenha neles os parâmetros determinantes das políticas do Estado (KELSEN, acessado em 30.11.2006, p. 2).

5 Considerações finais

Conforme cita Maciel, Maurice Duverger comentou o problema brasileiro na mesma direção, mas em sentido oposto ao das críticas aos partidos: “o Brasil só será uma grande potência no dia em que for uma grande democracia. E só será uma grande democracia no dia em que tiver partidos e um sistema partidário forte e estruturado” (MACIEL. In: ROCHA, 1996. p. 85-89). Nota-se nessa afirmação uma grave preocupação com o fortalecimento dos partidos, para que a Nação possa novamente voltar a ser a real detentora da soberania. Isso demonstra que o problema do modelo utilizado pelo sistema brasileiro é não se apoiar nos pontos corretos, o que resulta em – como uma coluna vertebral deslocada que fragiliza todo o corpo – dores em órgãos que compõem esse mesmo sistema. Esses órgãos necessitam de tratamento adequado e revigoração, não amputação.

No caso brasileiro, particularmente, projetos de emenda constitucional e estudos relacionados à quebra do monopólio dos partidos sobre a representação política sugerem novas formas de se alcançar o ideal de representação para obtenção efetiva dos interesses sociais.13 Outras soluções, como tornar o comparecimento às urnas facultativo, aparecem defendidas por muitos cientistas políticos e juristas. Ainda como saída para o cenário brasileiro, pode-se citar a possibilidade de implementação do parlamentarismo ou, de maneira mais amena, a composição de um sistema de votação distrital, com a utilização de listas fechadas pelos partidos, com vistas a diminuir o abismo existente entre eleitos e eleitores. Merece ser citada, também, a proposta de reforma política da OAB, que busca a efetivação de instrumentos de democracia direta por meio da regulamentação do art. 14 da Constituição Federal, em matéria de plebiscito, referendo e iniciativa popular. Objetiva, com isso, aumentar a participação popular no trato da vontade do Estado, estreitando e guiando a atuação dos representantes junto aos círculos do poder.14

A luz apresentada para a situação brasileira proposta pelo presente trabalho, contudo, toma como base, para além da utilização de questões pontuais dentro do sistema que vigora, uma via já discutida por diversos autores, que aponta para a mudança de toda a cultura político-partidária: a realização efetiva da democracia partidária ou do Estado de Partidos.

Somente com a existência dos partidos como verdadeiros intermediários – com o mandato a eles vinculado, conforme vem sendo atualmente entendido, e não aos representantes –, o povo se aproximaria novamente da formação da vontade do Estado, visto que a realização do bem comum não dependeria mais da atuação de um representante desvinculado politicamente, mas de um partido com estatutos e programas bem delineados, aos quais o eleito seria obrigado a obedecer, sob pena de ter seu mandato revogado.

O sistema representativo de partidos necessita, como se pôde observar, de diversos mecanismos de controle desses partidos, para que não haja deturpação do sistema: estruturação interna democrática, bases que escolham seus dirigentes, financiamentos públicos e transparentes, entre outros. Ainda, regras como a fidelidade partidária teriam que ser contempladas no ordenamento, de modo que o partido seja o efetivo detentor do mandato.

A proposta é, portanto, baseada numa mudança de cultura política, com a adoção de um novo modelo em que os partidos sejam os realizadores da representação política, e não os legitimadores de um processo espúrio de influência no poder, constantemente fomentado e ocultado por aqueles que hoje a detém.

6 Referências bibliográficas

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COMPARATO, Fábio Konder. A necessária reformulação do sistema eleitoral brasileiro. In: ROCHA, Cármen Lúcia Antunes; VELLOSO, Carlos Mário da Silva (Coord.). Direito Eleitoral. Belo Horizonte: Del Rey, 1996.

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MACIEL, Marco Antônio de Oliveira. Reforma político-partidária: o essencial e o acessório. In: ROCHA, Cármen Lúcia Antunes; VELLOSO, Carlos Mário da Silva (Coord.). Direito Eleitoral. Belo Horizonte: Del Rey, 1996.

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SEILER, Daniel-Louis. Os partidos políticos. Brasília: Universidade de Brasília, 2000.

Notas

1 “Em 1850, nenhum país do mundo (a não ser os Estados Unidos) conhecia partidos políticos no sentido atual do termo: encontravam-se tendências de opiniões, clubes populares, associações de pensamento, grupos parlamentares, mas nenhum partido propriamente dito. Em 1950, estes funcionavam na maior parte das nações civilizadas; os outros se esforçavam por imitá-las” (DUVERGER, 1987, p. 19).

2 Eram as responsáveis por “perturbar” os detentores do poder (MEZZAROBA, 2004, p. 93-99).

3 “Em uma democracia parlamentar, o partido político é um veículo essencial para a formação da vontade pública” (KELSEN, 1992, p. 287-288).

4 “Quanto mais as assembléias políticas vêem desenvolver-se suas funções e sua independência, tanto mais os seus membros se ressentem da necessidade de se agruparem por afinidades a fim de agirem de comum acordo; quanto mais o direito de voto se estende e se multiplica, tanto mais se torna necessário enquadrar os eleitores por comitês capazes de tornar conhecidos os candidatos e de canalizar os sufrágios em sua direção.” (DUVERGER, 1987, p. 20.)

5 Vários partidos socialistas foram criados diretamente pelos sindicatos, como o Partido Trabalhista britânico, criado em 1899 a partir de uma decisão do Congresso Trade-Unions; a maçonaria, em 1841, fundou uma associação política na Bélgica, denominada L’Alliance; da mesma forma, a influência das Igrejas possibilitou a criação pelos calvinistas, nos Países Baixos, do Partido “anti-revolucionário”, para formar oposição ao Partido conservador católico; e, assim, muitos outros exemplos podem ser citados (DUVERGER, 1987, p. 26-33).

6 A abordagem funcional busca encontrar a finalidade para a qual existe o partido e, com fundamento nas atividades partidárias e em suas conseqüências objetivas, conclui que é um mero descongestionante da vida social e política, legitimador de todo o sistema político vigente (MEZZAROBA, 2004, p. 107-110).

7 A abordagem estrutural, que tem como principal característica o tratamento descritivo dos partidos, acaba por identificá-lo como uma organização que, após cooptar diversos adeptos, passa a manipular suas vontades a partir das vontades dos chefes partidários, tornando-se uma espécie de oligarquia. Não se preocupa, entretanto, em analisar o fenômeno partidário a partir de seu contexto político e social, não atingindo uma definição de partido, mas preocupando-se tão somente com a análise da estrutura observada naqueles que existem (MEZZAROBA, 2004, p. 111-115).

8 No Direito Romano, durante muito tempo, não foi admitida a “representação jurídica per extranem personam, isto é, por mandatários ou gestores de negócios que não estivessem debaixo do poder do representado”. Exceção eram as pessoas submetidas ao paterfamilias (meninos, escravos, mulheres, etc). Com o aumento de complexidade das relações comerciais e políticas em territórios de dimensões também aumentadas, viu-se a necessidade de permitir que um ato jurídico pudesse ser praticado por outros que não o titular do direito, de modo que a representação no Direito Privado tornou-se instrumento comumente utilizado em todas as nações (BARACHO. Revista de Informação Legislativa, 1983, p. 104).

9 Segundo Mezzaroba: “A Nação seria um elemento que precede qualquer rei ou Legislativo, ato normativo ou político; ela se compõe de indivíduos livres e diferentes, que se unem para realizar suas necessidades humanas e pela vontade individual de viver em conjunto. Assim, à medida que os indivíduos se unem por sua própria vontade, passam a constituir um poder maior, denominado de Soberania Nacional. A Nação, portanto, seria soberana, una e indivisível. O exercício da Soberania Nacional se daria através de uma Constituição que estabelecesse a organização e a estrutura do Estado, o qual passaria a garantir a liberdade e a igualdade dos cidadãos. Por sua vez, o Poder Constituinte, para ser eficaz, deveria estar assentado sobre o princípio da representação” (MEZZAROBA, 2004, p. 38).

10 Conforme Mezzaroba (2004, p. 36), discorrendo sobre a experiência americana, com uma citação de Madison em O Federalista: “Madison, por exemplo, conceitua a República como um governo que deriva todos os seus poderes, direta e indiretamente, da grande massa do povo”.

11 Em outras palavras, não se pode dizer que a existência da representação política baste para um Estado ser considerado democrático.

12 De acordo com Mezzaroba, foi Kelsen quem apresentou o modelo com o nome de Estado de Partidos (MEZZAROBA, 2004, p. 78).

13 Um estudo interessante foi feito sobre a possibilidade de utilização de lista cívica (modelo italiano) ou candidatura avulsa (modelo alemão) pela consultoria do Senado Federal brasileiro (ARAÚJO, acessado em 30.11.2006). Há também um proposta de emenda constitucional de autoria do Deputado Ronaldo Dimas que retira do texto constitucional a exigência de filiação partidária como condição de elegibilidade (inc. V do § 3º do art. 14).

14 PL 4.718/2004 apensado ao PL 6.928/2002 em tramitação na Câmara dos Deputados.

Os autores são servidores do Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina.

* O trabalho foi apresentado para cumprir requisito de conclusão da Especialização em Direito Eleitoral da Escola Judiciária Eleitoral de Santa Catarina e Universidade do Vale do Itajaí.

Publicado na RESENHA ELEITORAL, vol. 15, 2007.

 

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