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Íntegra

Do terceiro não-candidato e da aplicação das sanções pela captação ilícita de sufrágio

Por: Rodrigo López Zilio

1 Introdução

A edição da Lei n. 9.840/1999 - que, entre outras modificações, acrescentou o artigo 41-A na Lei n. 9.504/19971 -, sem dúvida, foi a mais importante alteração sofrida no corpo da Lei das Eleições (Lei n. 9.504/1997), tendo recepção diferenciada nos mais variados matizes da sociedade brasileira, sendo objeto de elogios infindáveis e críticas desmedidas. Contudo, a partir da Lei n. 9.840/1999, resta sedimentado o entendimento de que, para um mesmo fato, haverá, em regra, a incidência de diplomas repressivos diversos, tanto na seara penal como na extrapenal.

A certeza quanto a essa dicotomia, porém, não afasta a necessidade de definir os exatos contornos da captação ilícita de sufrágio na seara extrapenal. O presente trabalho, sem a pretensão de esgotar a matéria e apenas com a intenção de estimular o debate e em sede de primeiras observações, tem por desiderato buscar resposta para algumas questões básicas, que consiste na necessidade, ou não, da participação (em sentido lato) do candidato para a configuração da captação ilícita de sufrágio, e a possibilidade de terceiro não-candidato ser punido nas sanções do art. 41-A da Lei n. 9.507/1997.

2 Elementos caracterizadores da captação ilícita de sufrágio

Exige o art. 41-A da Lei n. 9.504/1997, para a configuração da captação ilícita de sufrágio, a prática de uma conduta (doar, oferecer, prometer, entregar) que tenha um objeto certo (bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública), seja dirigida a um eleitor determinado e tenha finalidade eleitoral2 (com o fim de obter voto).

Em síntese, para a procedência do pedido é necessária a prova da autoria, participação (direta ou indireta) ou anuência do candidato, com a entrega da vantagem especificada na norma a algum(ns) eleitor(es) determinado(s), além da prova do elemento subjetivo (fim de obter o voto). Fundamental, pois, que o eleitor, a quem a captação ilícita foi dirigida, seja determinado ou determinável, à semelhança do exigido para a configuração do crime do art. 2993 do Código Eleitoral. Distingue-se, no ponto, com tal exigência, a figura prevista no art. 41-A da Lei n. 9.504/1997 do abuso do poder político ou do abuso do poder econômico (art. 22 da Lei Complementar n. 64/1990).

3 O legitimado passivo

Analisando o texto do art. 41-A, verifica-se que, em princípio, a norma se dirige, apenas, ao candidato:

Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar ao eleitor [...].

A questão, contudo, não pode receber uma interpretação meramente literal do dispositivo em referência, merecendo novas reflexões.

3.1 A interpretação doutrinária e jurisprudencial

O entendimento da doutrina eleitoral é pela punição apenas do candidato (rectius, pré-candidato, já que o termo inicial de incidência da norma preconizada é o pedido do registro de candidato).4

Neste diapasão é o ensinamento de Adriano Soares da Costa (2002, p. 483/484):

Quem pode cometer o ato ilícito é o candidato, e apenas ele. Se alguém, em nome dele, promete, doa, oferece ou entrega ao eleitor algum bem ou vantagem pessoal, com a finalidade de obter-lhe o voto, comete abuso de poder econômico ou corrupção, mas não a captação de sufrágio. O candidato é que tem de ser flagrado praticando o ato ilícito, hipotisado naquele texto legal. Não poderá ser ele acusado de captação de sufrágio se outrem, ainda que em seu nome ou em seu favor, estiver aliciando a vontade do eleitor. Para que a norma viesse de ter esse alcance, haveria de estar prescrevendo que o candidato ou alguém por ele captasse ilicitamente o sufrágio. Dado que não é possível emprestar interpretação elástica às normas que prescrevem sanções, apenas o candidato poderá realizar a conduta descrita no suporte fáctico da norma. A redação do texto legal, como se vê, limitou o campo material de sua incidência, condicionando apenas ao candidato a realização da conduta descrita como antijurídica.

Joel José Cândido (2002, p. 452) tece as seguintes considerações:

[...] sob a ótica dos destinatários da norma, o projeto oriundo da chamada "iniciativa popular" reduziu o alcance do combate ao ilícito, com grave prejuízo à ordem jurídica, posto que só puniu o corruptor. A lei então vigente punia o comprador e o vendedor de voto, ambos igualmente culpados e merecedores de sanção.

O colendo Tribunal Superior Eleitoral5, ao enfrentar a matéria, tem decidido, do mesmo modo, que a sanção do art. 41-A é aplicável apenas ao candidato e que se deve provar a prática da autoria, a participação - direta ou indireta - do candidato ou sua anuência ao ato ilícito. Ou seja, admite o TSE a conduta principal do candidato, a participação do candidato na conduta de outrem ou até mesmo, a mera anuência do candidato a conduta de terceiro. Contudo, a par de admitir a conduta principal ou participação do terceiro não-candidato, não admite sua punição pelo ilícito praticado.

4 O terceiro não-candidato e a possibilidade de punição pela captação ilícita de sufrágio

A não-punição ao eleitor encontra fundamento no perdão judicial, conforme extrai-se da obra de Joel Cândido (2002, p. 452), que, com precisão, alerta:

A justificativa do "perdão judicial" para não punir o eleitor, constante do projeto, e que viria a estimular o testemunho contra o infrator, é pueril e inócua. Pueril porque quem exerceu a magistratura, o Ministério Público ou a advocacia, lidando com a prova, sabe que isso não funciona. São raros os casos de ingratidão política contra os benemerentes. E é inócua porque, mesmo fora do alcance, da pena de multa extrapenal, o eleitor corrompido não estaria estimulado a depor contra o candidato corruptor porque ele mesmo não estaria a salvo do processo criminal.

Aproveitando a irresignação do ilustre eleitoralista com a omissão do texto legal, cabe tecer algumas considerações acerca da possibilidade, ou não, da punição de terceiros nas sanções do art. 41-A da Lei n. 9.504/1997, apesar de a norma mencionada fazer referência apenas ao candidato como sujeito ativo da conduta vedada.

Como visto, a maioria da doutrina não faz menção específica a essa possibilidade. Ao revés, todos os doutrinadores - sob o pretexto da impossibilidade de interpretação extensiva às normas que prevêem sanções - entendem passível de sanção pela violação ao art. 41-A tão-somente o candidato. Sem pretender polemizar em tema tão relevante ao Direito Eleitoral, é possível fazer algumas constatações de ordem doutrinária e legal. A mera omissão quanto à possibilidade de terceiro ser punido nas sanções do art. 41-A teria força para, de modo definitivo, afastar essa hipótese no caso concreto?

Todos têm consciência das imperfeições e dificuldades do legislador em relação à tecnicidade dos diplomas legislativos, principalmente quando submetidos a uma interpretação sistemática. São diversas as leis que, analisadas dentro do contexto legal em que são insertas, sofrem consideráveis e irreversíveis prejuízos interpretativos e de aplicabilidade. Tendo essa realidade ao menos como plausível, cabe analisar trecho de julgado do egrégio Tribunal Superior Eleitoral:

[...] caracteriza-se a captação de sufrágio quando o candidato pratica, participa ou anui explicitamente às condutas vedadas, e não apenas, como querem fazer crer os embargantes, quando a prática abusiva for realizada diretamente pelo candidato. Do contrário tornar-se-ia inócua a aplicação da sanção prevista no art. 41-A da Lei n. 9.504/1997, introduzido pela Lei n. 9.840/1999, frustrando a expectativa daqueles que, em nome da sociedade, propuseram a sua criação [TSE. EDclREsp n. 19.566, de 6.6.2002, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo - grifo nosso].

Ora, ao se admitir - além da participação direta - a forma indireta de participação do candidato na conduta reprovável, estar-se-á admitindo, de modo implícito, que a conduta principal foi praticada por outrem. E, em sendo punível a participação indireta do candidato, é de ser admitida, também como punível, a conduta do agente principal que não é candidato. Implausível, raciocínio diverso. No julgado mencionado, foi punido o candidato que somente anuiu explicitamente à conduta vedada de terceiro. No entanto, para que o candidato seja punido - e no caso concreto o foi -, é necessário, como um antecedente lógico, que o praticante da conduta principal, à qual o candidato aderiu, também receba as sanções do mesmo artigo de lei. Somente essa interpretação pode manter uma coerência lógica sobre o tema, de modo a não subverter o sistema jurídico. Não se trata, aqui, de dar uma interpretação extensiva a normas proibitivas ou sancionatárias; trata-se, apenas, de - por uma interpretação sistemática - restabelecer critérios de logicidade e de preservar conceitos básicos e norteadores do direito de punir do Estado na seara extrapenal.

Com efeito, no mínimo, razoável o entendimento de que terceiro, não-candidato, pode ser punido pelas sanções do art. 41-A, quando caracterizada a conduta (co-autoria), participação ou anuência do candidato.

4.1 Da probidade e moralidade administrativa e seus efeitos na interpretação das normas eleitorais

A edição da Emenda Constitucional de Revisão n. 4/1994 inseriu novos elementos no § 9º do art. 14 da Constituição Federal, ao prever, em seu artigo 1º, in verbis:

São acrescentadas ao 9º do art. 14 da Constituição Federal as expressões: "a probidade administrativa, a moralidade para o exercício do mandato, considerada a vida pregressa do candidato", e, após a expressão "a fim de proteger", passando o dispositivo a vigorar com a seguinte redação [...].

Assim, por força de manifestação do poder constituinte derivado, acolheu-se, de modo explícito, em matéria eleitoral, a probidade administrativa e a moralidade para o exercício do mandato.

Esse desiderato do legislador constituinte derivado não restou, de modo algum, afetado ou relativizado pelo teor da Súmula n. 136 do TSE, a qual visa, apenas, afastar a possibilidade de fundamentar a causa de pedir da impugnação de registro de candidato em alegações sobre a vida pregressa do candidato ou (ausência de) moralidade para o exercício do mandato.

José Afonso da Silva (1998, p. 227, 51, 81 e 219/220) aponta que a norma insculpida no § 9º do art. 14 da Constituição Federal é norma de eficácia limitada, i. e, necessita de complementação infraconstitucional. Contudo, alerta o consagrado constitucionalista que:

[...] não há norma constitucional alguma destituída de eficácia. Todas elas irradiam efeitos jurídicos, importando sempre uma inovação da ordem jurídica preexistente à entrada em vigor da constituição a que aderem e a nova ordenação instaurada.

Assim, não há como afastar o conteúdo da Emenda Constitucional de Revisão como critério interpretativo quando em jogo uma lide eleitoral, porquanto de rigor o reconhecimento do princípio da máxima efetividade ou eficiência da norma constitucional, que prevê que deve ser atribuído a uma norma constitucional o sentido que maior eficácia lhe conceda. Ademais, pelo princípio da supremacia da Constituição, deve-se proceder à interpretação do ordenamento jurídico a partir da Carta Política, sendo, portanto, inequívoco que a legislação infraconstitucional deve guardar harmonia com o vértice do ordenamento jurídico. Nesse sentido, ainda, importante não olvidar o princípio constitucional da igualdade (art. 5º, caput), que, respeitadas as particularidades dos microsistemas em questão, importa reconhecer tratamento igualitário do candidato em relação ao terceiro não-candidato, desde que em face de uma mesma conduta (ilícita).

4.2 Das normas sancionatárias e proibitivas

Patente que a previsão normativa insculpida no art. 41-A da Lei n. 9.504/1997 traz hipótese de norma proibitiva e sancionatária. É proibitiva, porque descreve uma conduta ilícita prescrevendo uma vedação ao agir ("É vedado..."). É sancionatária porque prevê uma sanção específica (cassação do registro, cassação do diploma e multa) para o caso de incidência da norma.

Característica elementar das normas é o seu caráter indeterminado, dirigindo-se a todos, indistintamente. Impende, ainda, salientar que, pela ótica da juridicidade, os fatos - sejam lícitos ou ilícitos - constituem-se em suporte fático das normas jurídicas, extraindo-se, então, suas conseqüências no mundo jurídico.

O autor do ato ilícito, i. e, contrário ao direito, por corolário, deve suportar as conseqüências da sua conduta. Na lição de Émerson Garcia (2002, p. 333):

Identificado o bem jurídico tutelado e positivada a norma proibitiva que visa a preservá-lo, é imprescindível que seja estabelecida a reprimenda em que incidirá o infrator. A sanção deve guardar relação com o ilícito praticado, variando qualitativa e quantitativamente conforme a lesividade da conduta. [...] A razão de ser da sanção não reside no prejuízo a ser causado ao infrator, e sim na necessidade de dissipação da intranqüilidade gerada, com a conseqüente restauração da soberania do direito, principal alicerce da segurança que deve reinar nas relações sociais [grifo nosso].

Não se pode olvidar, no entanto, a existência de certos ilícitos que exigem uma categoria de "sujeito passivo qualificado", notadamente em se tratando de Direito Penal (v. g., art. 123 do Código Penal), que, nas palavras de Fábio Medina Osório (2000, p. 312), ostenta a qualificação de "capacidade infratora". Nesse diapasão, contudo, deve-se relembrar que o fato é objetivamente ilícito, ou seja, não existe subjetividade diversa para o "sujeito passivo qualificado" (candidato) ou o terceiro (não-candidato). Sendo o ato objetivamente ilícito - e dirigindo-se a norma proibitiva a todos - tem-se por conseqüência que a conduta violadora pode ser efetuada tanto por sujeitos determinados expressamente pela norma, como por terceiros não-qualificados.

4.3 Do conceito (unitário) de ilicitude

Marcos Bernardes de Mello (1993, p. 92 e 181) leciona:

O cerne da ilicitude consiste, precisamente, em ser o fato - evento ou conduta - contrário ao direito, no sentido de que nega os valores e os fins da ordem jurídica, violando as suas normas e princípios. [...] A contrariedade ao direito é condição objetiva que se configura por ter sido violada a ordem jurídica [grifos originais].

Segue a lição do consagrado doutrinador:

No caso da ilicitude, como gênero, o elemento cerne do suporte fáctico consiste na contrariedade ao direito; vale dizer: a ilicitude tem como pressuposto essencial o ser contrária ao direito. Assim, todo fato, seja evento ou conduta, que implique violação da ordem jurídica, negando os fins do direito, é ilícito. [...].

A conclusão, lógica e indiscutível, é esclarecedora:

Para configurar a contrariedade ao direito caracterizadora da ilicitude não importa a ramo da Ciência Jurídica pertença a norma violada; não há diferença ontológica entre ilícito civil, penal, administrativo ou de qualquer outra espécie. Todos têm o mesmo cerne. Por isso a distinção entre eles é puramente metodológica e se estabelece em razão da espécie de norma que incide sobre o suporte fáctico concreto [grifos originais].

Fábio Medina Osório (2000, p. 270 e 102), no mesmo sentido, vaticina:

Pelo princípio da unidade do ordenamento jurídico, sabe-se que um comportamento não pode, a um só tempo, ser proibido e permitido pelo direito. Seria uma intolerável contradição geradora de grave insegurança jurídica. [...] O certo é que vigora, fortemente, a idéia de que o Estado possui um único e unitário poder punitivo, que estaria submerso em normas de direito público.

Na mesma senda, Alberto Silva Franco (2001, p. 360):

Enquanto tipicidade e culpabilidade são categorias próprias da teoria do crime, a ilicitude, como "contradição com o Direito", constitui um conceito à parte, válido em relação à ordem jurídica em seu sentido global, possuindo, por tal motivo, um inequívoco caráter unitário. Não há cogitar, assim, de uma ilicitude especificamente penal, civil, administrativa, etc. [grifo nosso].

A jurisprudência, do mesmo modo, reconhece o caráter unitário da ilicitude, conforme julgado do Superior Tribunal de Justiça.7

Admitindo-se como verdadeiras tais conclusões - e não há como inferir o contrário -, deve-se definir mais precisamente os exatos contornos da ilicitude e sua respectiva necessidade de punição.

Do mesmo modo, não se deve olvidar que o próprio TSE e a doutrina majoritária reconhecem que, a partir da edição da Lei n. 9.840/1999, para um mesmo fato - captação ilícita de sufrágio - haverá, em regra, a incidência de diplomas repressivos diversos. Nesse sentido, inclusive, extrai-se trecho de voto do Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira,

[...] o art. 41-A em muito se assemelha ao prescrito no art. 299, do Código Eleitoral [TSE. Agravo Interno de Medida Cautelar, n. 1000, j. 26.6.2001, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira; DJ de 17.12.2001. p. 9].

e do Ministro Fernando Neves:

[...] as alterações da Lei n. 9.504/1997, entre as quais consta a introdução do art. 41-A, vieram ao encontro da vontade da sociedade de ver rapidamente apurados e punidos os ilícitos eleitorais, razão pela qual a corrupção, que constitui crime previsto no art. 299 do CE, passou a ser também causa de perda do registro da candidatura ou do diploma [...] [TSE. Agravo Regimental de Medida Cautelar n. 970, j. 1º.3.2001, Rel. Min. Waldemar Zveiter; DJ de 27.4.2001. p. 236].

O entendimento do renomado Joel José Cândido (2002, p. 451), ao comentar o art. 41-A, é na mesma senda:

[...] este novo dispositivo não derrogou e tampouco revogou o art. 299 do Código Eleitoral [...] A responsabilidade do agente pela infração conhecida como "compra de votos" continua bilateral, acarretando ela tanto um processo criminal, como um processo extrapenal.

Adriano Soares da Costa (2002, p. 487) observa:

Ao art. 41-A, consoante se vê, vem sendo aplicada a mesma interpretação outorgada ao art. 299 do Código Eleitoral, que tipifica criminalmente a corrupção eleitoral.

O crime previsto no art. 299 do Código Eleitoral é, sem dúvida, o de maior incidência na casuística e, de igual modo, o de maior reprobabilidade na seara eleitoral. A repulsa ao delito em comento é de tal monta que, tendo em vista a freqüência de sua incidência, nos últimos tempos ganhou forma um movimento de comoção social. Desta feita, o estopim da crise ética da sociedade teve como conseqüência a criação do projeto de lei que originou a Lei n. 9.840/1999.

A partir do acréscimo do artigo 41-A ao corpo da Lei n. 9.504/1997, portanto, um mesmo e único fato jurídico pode ter reflexos em searas diversas. Aquele que captar ilicitamente sufrágio, hodiernamente, sofrerá, além das reprimendas penais cabíveis, as sanções previstas no art. 41-A, acrescentado pela Lei n. 9.840/1999.

Nesse sentido, cabe, ainda, trazer à baila que a similitude do art. 41-A da Lei n. 9.504/1997 com o art. 299 do Código Eleitoral tem recebido, também, guarida pela jurisprudência, a qual tem exigido, para a configuração da conduta extrapenal - tal qual a norma penal -, a necessidade de comprovação do dolo específico, o reconhecimento da consumação formal e o afastamento do pedido de voto genérico ou implícito para fins de condenação.

4.4 Do caráter fragmentário do Direito Penal

Francisco de Assis Toledo (1991, p.7, 13/14 e 165), em sua clássica obra Princípios Básicos de Direito Penal, afirma a existência de três notas caracterizadoras da missão e dos limites do Direito Penal:

a) o fundo ético do ordenamento penal;

b) o seu caráter limitado, ou fragmentário;

c) o estar dirigido para a proteção de algo.

Na lição de Toledo:

A tarefa imediata do direito penal é, portanto, de natureza eminentemente jurídica e, como tal, resume-se à proteção de bens jurídicos. Nisso, aliás, está empenhado todo o ordenamento jurídico. E aqui entremostra-se o caráter subsidiário do ordenamento penal: onde a proteção de outros ramos do direito possa estar ausente, falhar ou revelar-se insuficiente, se a lesão ou exposição a perigo do bem jurídico tutelado apresentar certa gravidade, até aí deve estender-se o manto da proteção penal, como ultima ratio regum. Não além disso. Fica, pois, esclarecido o caráter limitado do direito penal, sob duplo aspecto: primeiro, o da subsidiariedade de sua proteção a bens jurídicos; segundo, o dever estar condicionada sua intervenção à importância da gravidade da lesão, real ou potencial.

Prossegue o penalista:

[...] se, de um lado, nem todo fato ilícito reúne os elementos necessários para subsumir-se a um fato típico penal, de outro, o crime deve ser sempre um fato ilícito para todo o direito. Eis aí o caráter fragmentário do direito penal: dentre a multidão de fatos ilícitos possíveis, somente alguns - os mais graves - são selecionados para serem alcançados pelas malhas do ordenamento penal.

Em conclusão, arremata:

Note-se que a ilicitude penal não se restringe ao campo do direito penal: projeta-se para todo o direito. Por isso é que Welzel define a ilicitude como sendo 'a contradição da realização do tipo de uma norma proibitiva com o ordenamento jurídico como um todo'. Disso resulta que um fato ilícito penal não pode deixar de ser igualmente ilícito em outras áreas do direito, pois um ato lícito civil, administrativo etc., não pode ser ao mesmo tempo um ilícito penal [grifo nosso].

Tomadas tais premissas básicas - notadamente em face do fundo ético, do caráter limitado e fragmentário da Ciência Penal e do conceito unitário de ilicitude material -, não há como deixar de reconhecer que, quem transgride a norma jurídica penal prevista no art. 299 do Código Penal, por questão de coerência lógica e harmoniosa do sistema, malfere, do mesmo modo, a norma prevista no art. 41-A da Lei n. 9.504/1997.

E, considerando-se que "um fato ilícito penal não pode deixar de ser igualmente ilícito em outras áreas do Direito", o reconhecimento da punição, seja na qualidade de autor, co-autor ou partícipe, pelo crime de corrupção eleitoral - com pena de reclusão de até 4 (quatro) anos - tem por consectário lógico a necessidade de aplicação da sanção prevista no art. 41-A da Lei n. 9.504/1997.

Seria um contra-senso admitir-se que, somente por não ostentar a condição de candidato, o autor da violação da norma jurídica (art. 299 do Código Eleitoral e art. 41-A da Lei n. 9.504/1997) pudesse receber reprimenda de pena de reclusão na seara penal, e sequer fosse processado na seara extrapenal. No ensinamento de Émerson Garcia (2002, p. 341), aliás, o exercício do poder sancionador do Estado deflui de uma origem comum, sendo utilizados, subsidiariamente, na aplicação das sanções, os princípios básicos norteadores do Direito Penal. Assim, tal contradição ganha maiores contornos de absurdo na medida em que o bem jurídico tutelado por ambas as normas é o mesmo. Com efeito, o bem jurídico da corrupção eleitoral é a liberdade do voto; na captação de sufrágio, é a vontade do eleitor, consoante entendimento externalizado pelo Ministro Nélson Jobim (TSE. Recurso Especial Eleitoral n. 19.553, j. 21.3.2002, Rel. Min. Sepúlveda Pertence).

Nesse diapasão, a ausência de punição ao terceiro, não-candidato, mesmo na qualidade de autor da conduta principal, implica ofensa ao bem jurídico tutelado (vontade do eleitor), que, embora violado, não teve a proteção integral da norma sancionatária. De fato, admitindo-se (e punindo-se com privação de liberdade) terceiro não-candidato que pratica a corrupção eleitoral, forçoso entender a necessidade de aplicação das sanções extrapenais - até mesmo para manter a lógica do sistema, porquanto, se a conduta foi suficiente para merecer a reprimenda penal, que ostenta caráter sabidamente subsidiário, deverá receber, também, sanção extrapenal. Assevera Émerson Garcia (2002, p. 337/338):

A sanção será passível de aplicação sempre que for identificada a subsunção de determinada conduta ao preceito proibitivo previsto de forma explícita ou implícita na norma. A sanção, pena ou reprimenda apresenta-se como elo de uma grande cadeia, cujo desdobramento lógico possibilita a concreção do ideal de um bem-estar social; caracterizando-se, ainda, como instrumento garantidor da soberania do direito, concebido este não como mero ideal abstrato, mas como fator perpétuo e indissociável do bem-estar geral. Como se vê, sob o ponto de vista ôntico, não há distinção entre as sanções cominadas nos diferentes ramos do direito, quer tenham natureza penal, civil ou administrativa, pois, em essência, todos visam a recompor, coibir ou prevenir um padrão de conduta violado, cuja observância apresenta-se necessária à manutenção do elo de encadeamento das relações sociais [grifos nossos].

No ponto, não há como admitir o argumento de que, com a simples punição do candidato, resguarda-se o bem jurídico violado. A um, porque o sistema deve guardar coerência. A dois, porque a conduta que malfere a norma penal se reflete, necessariamente, em outras áreas do Direito. A três, porque não há como admitir a violação, por terceiro não-candidato, da norma proibitiva e não admitir a aplicação de sanção. Nesse sentido, não há como acolher o entendimento de que o terceiro não-candidato, mesmo praticando a conduta proscrita pelo art. 41-A da Lei n. 9.504/1997, deve responder por abuso do poder econômico, porquanto haveria nítida quebra do princípio constitucional da igualdade (já que duas pessoas - candidato e não-candidato -, embora incidindo na mesma norma proibitiva, violando o mesmo bem jurídico e, por vezes, praticando a mesma conduta vedada, receberiam tratamento desigual do legislador pátrio). De outro lado, inegavelmente, não haveria como alargar o conceito da captação ilícita de sufrágio de modo a comprovar a - necessária - potencialidade de influência no resultado ou lisura do pleito. A quatro, ainda, porque a sanção tem nítido caráter pedagógico e retributivo, e a ausência de punição - nos termos preconizados pela norma proibitiva - implica uma quebra na ordem jurídica sem a respectiva resposta do Estado.

Sequer o reconhecimento da existência de eventuais incoerências legislativas na tipificação de ilícitos que tutelam desigualmente bens jurídicos idênticos8 (notadamente pelo reconhecimento da independência de instâncias) impõe conclusão diversa, dada a evidente desproporcionalidade do sistema jurídico ao admitir uma conduta principal que viola o bem jurídico maior do Direito Eleitoral e, apegado a critérios meramente literais, aduzir a ausência de punição, em face da omissão legislativa, e, ao mesmo tempo, referendar punições graves (v. g., cassação do diploma) àqueles que, conquanto ostentem a condição de candidato, tenham conduta de mera anuência ou participação indireta.

Nesse ponto, também, imperioso estabelecer que, embora se reconheça a autonomia e independência do legislador (art. 2º, CF), o princípio da proporcionalidade ou da vedação do excesso importa em restabelecer as premissas básicas do direito de punir do Estado. Portanto, é desarrazoado reconhecer a conduta principal do terceiro não-candidato, violando diretamente a liberdade do voto, sem que o infrator possa sequer tomar parte no pólo passivo da demanda eleitoral e, concomitantemente, cassar o mandato ou registro daquele que anui à conduta principal. Do mesmo modo, desmedido reconhecer que, praticado o ilícito por terceiro, o qual nem sequer é legitimado passivo na seara extrapenal, na área penal essa mesma pessoa poderá ser responsabilizada e, até mesmo, privada de sua liberdade, pela mesma conduta.

Por fim, ainda, deve-se salientar que a previsão normativa agasalhada pelo art. 41-A da Lei n. 9.504/1997 não possui nenhum elemento que exija, para sua configuração, a caracterização de sujeito passivo qualificado. Assim, os verbos descritos na norma (doar, oferecer, prometer, entregar) podem ser praticados por qualquer pessoa, independentemente da condição de (pré-) candidato. Do mesmo modo, a vantagem de qualquer natureza pode ser oferecida, doada, prometida ou entregue por qualquer um, e o elemento subjetivo (com o fim de obter voto) também pode ser exigido por pessoa sem qualificação especial. Assim, não há como negar a terceiro não-candidato a capacidade infratora, a qual tem por consectário lógico a imposição da respectiva sanção.

4.5 Da necessidade de interpretação sistemática

O reconhecimento do conceito unitário da ilicitude e de que a separação da seara penal e extrapenal tem critérios dogmáticos não afasta a conclusão lógica de que o sistema jurídico é dialeticamente unitário, conforme assevera Juarez Freitas (2002, p. 32). Assim, consoante expõe, de modo brilhante, o consagrado doutrinador, a interpretação sistemática é necessária para a harmonização do sistema e a superação de antinomias jurídicas.

No ensinamento de Juarez Freitas:

[...] todo intérprete sistemático, na condição de positivador derradeiro, culmina o aperfeiçoamento do Direito Positivo e, em razão disso, não presta vassalagens a normas, nem aceita passivamente horrendas omissões que impedem a tutela inadiável do aludido núcleo essencial dos direitos em suas múltiplas faces. [...] O intérprete sistemático precisa, pois, ao concretizar o Direito, preservar a sua unidade substancial e formal, sobrepassando contradições nefastas [...] [grifos nossos] .

Em conclusão, leciona referido administrativista:

Ao intérprete incumbe - convém frisar - conferir sistematicidade às normas, vale dizer, harmonizá-las, formal e substancialmente, garantindo a salutar e democrática coexistência das liberdades e igualdades no presente em que ocorre a operação hermenêutica. [...] O intérprete sistematiza - embora não recrie o Direito (no sentido da produção legislativa) -, justamente ao não se render ao pretenso absolutismo das prescrições normativas. Ao fazê-lo, traça limites à própria missão do legislador, o qual não pode, em respeito ao poder constituinte, engendrar antinomias que imponham riscos à sobrevivência dos elementos fundantes do Direito Positivo.

Em síntese, a preservação da unidade do sistema jurídico, in casu, importa reconhecimento da possibilidade de punição do terceiro não-candidato, tanto na seara penal quanto na extrapenal, nesta necessitando apenas da participação (sentido amplo) da figura do candidato.

4.6 Da imprescindibilidade da conduta (em sentido amplo) do candidato para a incidência do art. 41-A da Lei n. 9.504/1997

Ao revés da corrupção eleitoral, prevista no art. 299 do Código Eleitoral, não há como caracterizar a captação ilícita de sufrágio sem a autoria, participação (direta ou indireta) ou anuência do candidato. Portanto, é a captação ilícita de sufrágio conduta - necessariamente - dependente da comprovação da conduta (em sentido amplo) do (pré-) candidato, conforme tem decidido reiteradamente a jurisprudência. Pode-se, no caso em tela, buscar analogia na Lei de Improbidade Administrativa (Lei n. 8.429/1992).

Assim, se terceiro - sem a co-autoria, participação ou anuência do candidato -, doar, prometer, oferecer ou entregar qualquer vantagem a eleitor determinado, com o fim de obter o voto, não há a incidência da norma proibitiva da Lei das Eleições. Não obstante tal conclusão, a conduta do terceiro encontra reprimenda no crime eleitoral previsto no art. 299 do Código Eleitoral. Inexiste, na hipótese, ofensa ao sistema, porquanto, em verdade, o legislador previu que as sanções eleitorais - do art. 41-A da Lei n. 9.504/1997 - apenas incidiriam se reconhecida a figura - imprescindível - do candidato. Nesse passo, portanto, deve-se reconhecer que, por se tratar de sanção tipicamente eleitoral, é indispensável à incidência da norma a qualidade de (pré-) candidato a um mandato eletivo. Assim, ausente a qualidade de candidato na violação da norma, resta ainda a reprimenda - subsidiária - do Direito Penal Eleitoral, o qual independe de a figura do candidato ter imediata aplicação.

4.7 Da sanção adequada

Reconhecida a participação do candidato e do terceiro no ato de captação ilícita de sufrágio, deve-se considerar, dentre as penas previstas, quais as passíveis de serem aplicadas aos ofensores da norma.

De pronto, em relação ao candidato, inequívoca a aplicação de todas as penas previstas (cassação do registro, cassação do diploma e multa). Em relação ao terceiro não-candidato, contudo, por evidente, não há como aplicar as sanções tipicamente eleitorais (cassação do registro, cassação do diploma), até mesmo porque não há como cassar aquilo que não se possui.

Da mesma forma que previsto na Lei de Improbidade Administrativa (Lei n. 8.429/1992), a sanção aplicável a terceiro não-candidato deverá ser a compatível com sua condição de extraneus. Portanto, a terceiro não-candidato que participar (sentido lato) da captação ilícita de sufrágio deverá ser aplicada a pena de multa, prevista na norma sancionatária. O valor da multa a ser aplicada, entre o mínimo (mil Ufirs) e o máximo legal (cinqüenta mil Ufirs), guardará proporcionalidade e adequação com o grau da conduta reprovável perpetrada pelo terceiro. Não há como sustentar, ainda, que, por já haver previsão na norma penal (art. 299, CE) de pena de multa, seria despicienda a punição de terceiro não-candidato na área extrapenal, porquanto são esferas independentes e autônomas e, portanto, a natureza das penas aplicadas é diversa.

5 Conclusão

Necessita-se, em síntese, preservar a coerência do sistema. Nesse passo, a admissão da punibilidade do terceiro não-candidato é medida necessária e indispensável para a harmonização (e proteção integral) do bem jurídico ofendido, que é a vontade do eleitor em expressar, de modo livre e espontâneo, o direito subjetivo público do voto. Djalma Pinto (2003, p. 39) assevera:

A interpretação das normas eleitorais deve convergir sempre para a busca da prevalência do interesse público. O bem protegido pelo Direito Eleitoral é, acima de tudo, a lisura do processo para a escolha dos representantes do povo.

Por conseqüência, além da necessidade de coerência valorativa do sistema punitivo - pelo qual a conduta do partícipe depende da conduta do autor principal -, pode-se elencar o objetivo teleológico da norma, a unitariedade do conceito de ilicitude material, a necessidade de observância da moralidade e da probidade em matéria eleitoral, e, ainda, a prevalência da preservação da lisura do processo eletivo, para fundamentar a punibilidade de terceiro não-candidato nas sanções do art. 41-A da Lei n. 9.504/1997.

Nesse ponto, ainda, deve-se mencionar que a possibilidade de sanção de terceiro não-candidato afasta a hipótese - sempre presente - de que este terceiro não-candidato assuma a conduta ilícita da captação de sufrágio, corrupção eleitoral praticada, em verdade, pelo candidato. Dessa forma, burla-se por completo a lei, dado que se impede a punição de caráter eleitoral prevista no art. 41-A, e o terceiro não-candidato - preenchidos os requisitos legais - poderá, inclusive, receber o benefício da suspensão condicional do processo em relação à corrupção eleitoral, por força do apenamento mínimo em abstrato (art. 284 do Código Eleitoral).

Sem dúvida alguma, a maior gravidade da captação ilícita de sufrágio é a mácula do processo eleitoral em sua origem. Com efeito, nada adianta a informatização total do sistema de votação, por meio das urnas eletrônicas, se a eleição já nasce viciada em seu embrião, sendo a lisura do sistema eletrônico de votação ineficaz.

Por vedado pelo ordenamento legal, todo aquele que pratica a captação ilícita de sufrágio deve, necessariamente, receber a respectiva punição, sob pena de frustrar qualquer medida de moralidade (art. 14, § 9º, CF) do sistema (eletrônico) de votação e, também, em respeito aos valores fundamentais salvaguardados pelo texto constitucional, até mesmo porque o verdadeiro anseio da vontade popular, em síntese, é o sustentáculo maior da democracia representativa (art. 1º, parágrafo único, da CF).

Em conclusão, não há como admitir que a omissão formal legislativa subverta a lógica do sistema da ciência jurídica. Assim, pois, a ausência de referência a terceiro não-candidato não impede o reconhecimento de sua conduta (em sentido amplo) violadora da norma jurídica tutelada, tendo por conseqüência lógica a imposição da respectiva sanção legal.

Não se trata de interpretação extensiva, como sugerido, e, sim, de uma interpretação sistemática do conceito unitário de ilicitude, com o fim de manter a harmonia formal e substancial do sistema, que, por coerência lógica, ao admitir a imposição de sanção penal ao terceiro não-candidato (art. 299, CE), alberga, também, a possibilidade de punição deste na seara extrapenal.

Não se pode esquecer, por fim, que o Estado, em sua função primordial de tutela e salvaguarda dos bens jurídicos, deve - a par de proteger o cidadão dos arbítrios e excessos - também, do mesmo modo e na mesma proporção, proteger o cidadão de condutas ilícitas, que afetam sua liberdade de escolha e, assim, por conseqüência, ofendem a própria democracia participativa.

Portanto, e do exposto, constata-se que mencionada omissão formal legislativa, conquanto reconhecida a autonomia do legislador, encontra óbice insustentável no próprio sistema jurídico, dado que a interpretação do Direito Eleitoral tem por premissa básica a lisura do processo eletivo e a prevalência do interesse público. Inequívoco que o interesse público aponta para o respeito à liberdade de escolha dos representantes aos mandatos eletivos. Assim, reconhecida a conduta ilícita que viole tal bem jurídico - independente da qualidade pessoal do ofensor (candidato ou não) - deve incidir sanção respectiva. Trata-se, em suma, de exigir a proteção do eleitor, ofendido em sua liberdade de escolha, pelo Estado, restabelecendo-se, assim, a harmonia substancial e formal do sistema jurídico.

Notas

1 Art. 41-A. Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou qualquer vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil a cinqüenta mil UFIR, e cassação do registro ou do diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar n. 64, de 18 de maio de 1990.

2 "[...] Para a caracterização da conduta descrita no art. 41-A, da Lei n. 9.504/1997, é imprescindível a demonstração de que ela foi praticada com o fim de obter o voto do eleitor." (TSE. Ac. n. 19.229, de 15.2.2001, Rel. Min. Fernando Neves). No mesmo sentido: TRE/ES. Ac. n. 74, de 6.6.2001, Rel. Juiz Maurílio Ferraz Moulin; TRE/PR. Ac. n. 24.271, de 16.10.2000, Rel. Juiz Nilson Mizuta.

3 Art. 299, CE. "Dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva ou qualquer outra vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção, ainda que a oferta não seja aceita: [...]"

4 TSE. Ac. n. 19.229, j. 15.2.2001, Rel. Min. Fernando Neves. TSE. EDclREsp n. 19.566, j. 6.6.2002, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo.

5 "Representação - Art. 41-A da Lei n. 9.504/1997 - Alegação de demissão de servidores que não apoiassem determinado candidato e nomeação de outros que fossem simpatizantes da candidatura. Falta de prova de que o candidato pessoalmente ou por terceiros, expressamente autorizados, tenha participado dos fatos e de ter sido diretamente pedido voto em troca da obtenção ou da manutenção do emprego. Fatos que podem, em tese, configurar abuso do poder político, mas não a hipótese do art. 41-A da Lei n. 9.504, de 1997. Recurso a que se negou provimento." (TSE. RO - Ac. n. 704, de 23.5.2003, Rel. Min. FERNANDO NEVES DA SILVA; DJ, v. 1, p. 128) "RECURSO ESPECIAL. INELEGIBILIDADE. ARTS. 22 DA LC N. 64/1990 E 41-A DA LEI N. 9.504/1997. CARACTERIZAÇÃO. CASSAÇÃO DE DIPLOMAS. (...) DESPROVIMENTO. I. Resta caracterizada a captação de sufrágio prevista no art. 41-A da Lei n. 9.504/1997, quando o candidato praticar, participar ou mesmo anuir explicitamente às condutas abusivas e ilícitas capituladas naquele artigo. (...)" (TSE. REspe - Ac. n. 19.566, de 26.4.2002, Rel. Min. SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA; DJ v. 1, p. 185 - RJTSE v. 13, T. 2, p. 278)

6 Súmula n. 13 do TSE. Não é auto-aplicável o § 9º do art. 14 da Constituição, com a redação da Emenda Constitucional de Revisão n. 4/1994.

7 "A ilicitude é una: contraste com o juridicamente consentido. Apresenta, contudo, particularidades, conforme a área jurídica em que se manifesta a conduta ilícita. Além da sanção, conseqüência lógica (não material) do comportamento vedado pelo Direito. A esfera administrativa é distinta da jurisdição penal. A definição do ilícito tributário não é pressuposto, nem condição de procedibilidade para promover a ação penal. Poderá, dado o Direito ser unidade, a decisão em uma área dogmática refletir em outra" (STJ - 6ª Turma. RHC 7.036, j. 19.3.1998, Rel. Min. Luiz Vicente Cernichiaro - DJU de 22.6.1998, p. 176)

8 Para maior aprofundamento no tema: Osório, 2000. p.171/202

Referências

COSTA, Adriano Soares da. Instituições de Direito Eleitoral. 5. ed. Belo Horizonte. Del Rey, 2002.

CÂNDIDO, Joel José. Direito Eleitoral brasileiro. São Paulo. Edipro, 2002.

SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. 3. ed. São Paulo. Malheiros, 1998.

GARCIA, Émerson; ALVES, Rogério Pacheco. Improbidade administrativa. Rio de Janeiro. Lumen Juris, 2002.

OSÓRIO, Fábio Medina. Direito Administrativo sancionador. São Paulo. RT, 2000.

MELLO, Marcos Bernardes de. Teoria do fato jurídico. 5. ed. São Paulo. Saraiva, 1993.

FRANCO, Alberto Silva; STOCO, Rui (Coords.). Código Penal e sua interpretação jurisprudencial. 7. ed. São Paulo. RT, 2001. v. 1, Parte Geral.

TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios básicos do Direito Penal. 4. ed. São Paulo. Saraiva, 1991.

FREITAS, Juarez. A interpretação sistemática do Direito. 3. ed. São Paulo. Malheiros, 2002.

PINTO, Djalma. Direito Eleitoral, improbidade administrativa e responsabilidade fiscal - noções gerais. São Paulo. Jurídico Atlas, 2003.

Promotor de Justiça.

Publicado na RESENHA ELEITORAL - Nova Série, v. 11, n. 1 (jan./jun. 2004).

 

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