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Íntegra

Direitos fundamentais e sua proteção em âmbito internacional

Por: Paulo Márcio Cruz / Pedro Roberto Decomain

1 Declarações de direitos: os primeiros passos

Sem prejuízo da existência de documentos mais antigos – como a Magna Carta,1 datada de 1215, por força dos quais soberanos reconheceram, com maior ou menor eficácia, direitos de seus súditos –, foi a partir da Declaração de Direitos do Bom Povo da Virgínia, de 12 de junho de 1776, e da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão,proclamada pela Assembléia Nacional Francesa em 26 de agosto de 1789, que mais se aproximou de sua forma atual o pensamento de que, em atos solenes, haveriam que ser proclamados direitos dos cidadãos em face dos governantes e, de modo geral, direitos dos cidadãos em face do poder estatal.

Na Declaração do Bom Povo da Virgínia, foram proclamados, por exemplo, direitos de liberdade e também direitos de participação política, afirmando-se a necessidade de que a todos fosse resguardada oportunidade para participarem das decisões de interesse comunitário, ainda quando devessem ser tomadas por delegados. Nessa perspectiva restou afirmado, por exemplo, já no item I daquela declaração, que

[...] todos os homens são, por natureza, igualmente livres e independentes e têm certos direitos inatos, dos quais, quando entram em estado de sociedade, não podem por qualquer acordo privar ou despojar seus pósteros e que são: o gozo da vida e da liberdade com os meios de adquirir e de possuir a propriedade e de buscar e obter felicidade e segurança.

Situação nítida de reconhecimento do direito de liberdade, afirmado inato a cada indivíduo.

Além disso, pela intromissão severa na liberdade de ir e vir, representada pela condenação criminal com imposição de pena privativa de liberdade, ou pela intromissão até mesmo no direito à própria vida, quando se admitisse a pena capital, direitos que deveriam ser resguardados eram objeto de solene declaração também no terreno da persecução penal.

Assim, por exemplo, no item VIII da Declaração, proclamaram seus redatores que todo acusado do cometimento de um crime tinha os seguintes direitos:

– conhecimento da causa e da natureza da acusação;

– acareação com seus acusadores e testemunhas;

– indicação de provas que pretendia produzir em seu favor;

– julgamento rápido;

– julgamento por um júri imparcial composto por doze homens de sua comunidade;

– condenação unicamente se ela fosse proclamada pela unanimidade dos doze jurados;

– direito de não se auto-acusar, ou direito de não testemunhar contra si próprio;

– direito de não ser privado de sua liberdade, salvo por mandado legal do país ou por julgamento de seus pares.

Na Declaração se afirmava também que “todo poder é inerente ao povo e, conseqüentemente, dele procede” (artigo II), em nítido reconhecimento de que se deveria assegurar a cada qual o direito de participar da condução dos assuntos comunitários, ainda quando tal devesse ocorrer por meio da eleição de representantes, devendo as eleições ser livres, como proclamado já agora no artigo VI da Declaração.2

O quadro não era diferente, em essência, na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, aprovada pela Assembléia Nacional de França em 26 de agosto de 1789. Releva registrar, para logo, que seu título já afirma que se cuida de direitos do homem, é dizer, direitos do indivíduo, e direitos do cidadão, ou seja, daquele que era admitido a participar de modo ativo da condução dos negócios comunitários, quando menos pela eleição de representantes.3

No terreno da liberdade e da igualdade, proclamava-se já no art. 1º da mencionada declaração que “os homens nascem e são livres e iguais em direitos”.

No art. 4º, procurava-se conceituar a liberdade, afirmando que esla consistia em poder fazer tudo que não prejudicasse o próximo. No âmbito criminal, afirmava o art. 7º da Declaração que ninguém poderia ser acusado, preso ou detido “senão nos casos determinados pela lei e de acordo com as formas prescritas”, acrescentando o art. 8º que ninguém poderia ser punido “senão por força de uma lei estabelecida e promulgada antes do delito e legalmente aplicada”.

Detalhando alguns âmbitos da liberdade, proclamava ainda a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, da França de 1789, em seu art. 10, que ninguém poderia ser molestado por suas opiniões, incluindo as religiosas, desde que a respectiva manifestação não perturbasse a ordem pública estabelecida pela lei, acrescentando o art. 11 ser livre a comunicação das idéias e das opiniões, liberdade essa havida como um dos “mais preciosos direitos do homem”, assegurando-se, por isso mesmo, que cada cidadão poderia “falar, escrever, imprimir livremente”, respondendo, todavia, por abusos que cometesse.

Para proteção dos direitos cuja garantia se proclamava, inseriu-se na Declaração a afirmativa de que, justamente para garantia dos direitos do homem, havia a necessidade de uma força pública, instituída para a fruição de todos, e não para utilidade particular daqueles a quem fosse confiada.

No âmbito da participação política, afirmava para logo o art. 3º da Declaração que o princípio de toda soberania residia essencialmente na nação, afirmando-se em seguida, no art. 6º, não só que a lei seria expressão da vontade geral, como também que todos os cidadãos teriam direito a concorrer, pessoalmente ou por intermédio de mandatários, para a respectiva formação.

2 Sucessivos incrementos das declarações originais dos direitos do homem havidos por fundamentais

Todos esses direitos seguiram sendo sucessivamente reconhecidos ao longo do tempo, em muitas das diferentes Constituições adotadas por diversos países desde então.

O Brasil não forma exceção.

É interessante registrar, inclusive, que já a Constituição Imperial, de 1824, continha, em seu art. 179, uma extensa proclamação de direitos que posteriormente passaram a ser designados como fundamentais, principiando pela afirmativa do princípio da legalidade (“nenhum Cidadão pode ser obrigado a fazer, ou deixar de fazer alguma coisa, senão em virtude da Lei” – inciso I), seguindo pela liberdade da comunicação do pensamento, por palavras ou escritos (inciso IV), pela liberdade religiosa (inciso V), inviolabilidade do domicílio (inciso VII), igualdade perante a lei (inciso XIII), personalidade da pena, que não passaria, pois, da pessoa do próprio delinqüente (inciso XX), devido processo legal (inciso XI), liberdade de trabalho (inciso XXIV), sigilo da correspondência (inciso XXVII) e, num avanço interessante, pela própria gratuidade da instrução primária (inciso XXXII), além dos então denominados “socorros públicos” (inciso XXXI).4

A participação popular no Governo (devendo-se lembrar, todavia, da existência, na época, do voto censitário, assegurado o direito de sufrágio apenas a quantos tivessem rendimento superior a um determinado patamar, sendo excluídas do direito de votar também diversas outras categorias de pessoas – art. 91) era assegurada pela eleição dos componentes da Câmara dos Deputados, um dos ramos da Assembléia Geral (o outro era o Senado, não eletivo), incumbida do exercício do Poder Legislativo (art. 35), sendo o voto, porém, indireto, já que em eleições paroquiais eram escolhidos os eleitores da Província, que depois elegiam os representantes da Nação e da Província (art. 90).5

Praticamente todos os direitos proclamados na Declaração francesa de 1789 se acham atualmente encartados na Constituição Federal brasileira de 1988. Assim, por exemplo, a afirmativa de que toda soberania reside essencialmente na nação, constante do art. 3º da Declaração, associada à outra afirmativa, segundo a qual cada cidadão haveria que ter direito de participar da formação da lei, quando menos pela designação de mandatários, figuram no art. 14 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, no qual se afirma que “a soberania popular é exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto”, admitindo-se, todavia, também a existência de plebiscito, referendo e iniciativa legislativa popular, figuras inerentes à democracia direta.

Já a afirmativa, constante no art. 5º da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, segundo a qual nada podia ser obstado, a menos que fosse vedado em lei, nem ninguém poderia ser compelido a realizar senão o que por ela fosse ordenado, consta hoje, entre nós, do art. 5o, inciso II, da Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988, dispositivo que proclama que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. A terminologia alterou-se, embora não muito. O espírito é essencialmente o mesmo.

Assim também no terreno das garantias em face da acusação do cometimento de um crime. O art. 8º da Declaração afirmava que ninguém poderia ser punido senão por força de uma lei estabelecida e promulgada antes do delito e legalmente aplicada. A primeira parte do artigo acha-se hoje reafirmada, no Brasil, no inciso XXXIX do art. 5º da Constituição Federal de 1988, segundo o qual “não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”. Já a parte final do art. 8º da Declaração francesa de 1789, na qual se afirmava que ninguém poderia ser punido senão por força de lei “legalmente aplicada” (a despeito da redundância), corresponde ao atual princípio do devido processo legal, encartado no inciso LIV do art. 5º da Constituição Federal brasileira de 1988. A proclamação, constante no art. 9º da Declaração, de que todo acusado seria considerado inocente até que fosse declarado culpado, correspondente ao atual princípio da presunção de inocência, cuja observância é assegurada, entre nós, por meio do inciso LVII do art. 5º da Constituição Federal de 1988, de acordo com o qual “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.

Do mesmo modo, para finalizar o elenco de exemplos, a liberdade de opinião e a liberdade de expressão, às quais aludiam os arts. 10 e 11 da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, constam hoje, a um só tempo, no Brasil, do inciso IV, ainda uma vez do art. 5º da Constituição Federal de 1988, ao passo que a liberdade de crença e de manifestação de opinião religiosa, assegurada pelo art. 10 da Declaração Francesa de 1789, figura hoje do inciso VI do art. 5º da vigente Constituição Federal brasileira.

Sem embargo da persistência, nas sociedades modernas, da consciência (mais ou menos ampla) da necessidade de que tais direitos sejam assegurados, e do respeito a eles (também mais ou menos amplo), outros direitos foram a eles sendo acrescidos ao longo dos tempos, de sorte a haver-se tornado usual falar-se em “gerações” de direitos.

Aqueles aos quais se aludiu antes – direitos inerentes à liberdade individual, inclusive na perspectiva criminal, e direito de participação política, quando menos pela eleição de representantes – podem ser designados como direitos fundamentais da primeira geração.

Ao longo do tempo, outros lhes foram sendo agregados.

Num primeiro momento, como reação a fenômenos havidos no âmbito do relacionamento entre patrões e empregados, que de início se entendia deverem remanescer ao largo de qualquer disciplinamento por parte do Estado, foram sendo concedidos, a partir da segunda metade do século XIX, diferentes direitos aos trabalhadores, em face de seus patrões.

Muito embora se pudesse afirmar, como o fez Mozart Victor Russomano,6 que a Revolução Francesa trouxe consigo a liberdade de trabalho, o que também permitiu, ainda segundo o pensamento do mesmo autor, a possibilidade de admitir-se a prestação do trabalho em proveito de terceiro, mediante contrato, sem subordinação do trabalhador a outrem, exceto aquela que resultasse do dever de cumprir o que foi avençado no contrato.

Muito embora a liberdade de trabalho em si mesma fosse um bem, as condições que passaram a ser ofertadas pelos contratantes, para a admissão de trabalhadores assalariados, passaram a ser humilhantes, nada existindo que assegurasse ao empregado limites quanto ao tempo de trabalho a ser desenvolvido, períodos de descanso, remuneração mínima, proteção contra riscos inerentes às condições de trabalho, sem falar em normas protetivas dirigidas a categorias particulares de trabalhadores, como aquelas ligadas à proteção do trabalho das mulheres, da maternidade e relativas ao trabalho infantil e juvenil.

O liberalismo econômico afirmava que, sendo o trabalho livre, livre deveria ser também a estipulação das condições (cláusulas contratuais) em que se desenvolveria. O salário seria livremente aceito, por menor que fosse, e o trabalho desenvolvido nas condições assumidas quando do contrato.

Essa exacerbada liberdade contratual, todavia, fechava os olhos para uma circunstância evidente: pela abundância de mão de obra, a liberdade contratual absoluta conduzia a uma distorção severa: as condições em que o trabalho seria desenvolvido e o montante com o qual seria remunerado eram ditados na verdade unilateralmente pelos empregadores, em situação que, de modo coloquial, não passava de um “pegar ou largar” para o trabalhador.

Nas palavras de Amauri Mascaro Nascimento,

A imposição de condições de trabalho pelo empregador, a exigência de excessivas jornadas de trabalho, a exploração das mulheres e menores, que constituíam mão de obra mais barata, os acidentes ocorridos com os trabalhadores, no desempenho das suas atividades, e a insegurança quanto ao futuro e aos momentos nos quais fisicamente não tivessem condições de trabalhar, foram as constantes da nova era no meio proletário, às quais pode-se acrescentar também os baixos salários.7

Daí o gradativo surgimento de garantias ofertadas aos trabalhadores, com o estabelecimento de mínimos e também de máximos ligados ao trabalho. Limitações ao tempo durante o qual o trabalho poderia ser exercido de modo contínuo, períodos de descanso entre diferentes jornadas de trabalho, períodos de férias e normas protetivas do trabalho dirigidas particularmente às mulheres e crianças, passaram a formar todo um conjunto de regras inerentes aos contratos de trabalho, integrantes hoje do ramo do Direito Positivo ao qual se denomina de Direito do Trabalho.

Muitas de suas regras, ou pelo menos os princípios gerais que deveriam nortear as condições em que o trabalho haveria de desenvolver-se, passaram inclusive a ser inseridas em textos constitucionais. Assim, por exemplo, na Constituição Alemã de 1919, conhecida historicamente como Constituição de Weimar, afirmava-se que “a mão-de-obra gozará de proteção do Reich”, garantindo-se ainda, no art. 159, a livre formação de associações profissionais, para defesa e melhoria das condições de trabalho e econômicas. O art. 162 da Constituição era ainda mais ambicioso, na medida em que afirmava que o Reich propiciaria “uma regulamentação internacional das relações jurídicas, referentes aos trabalhadores, a fim de proporcionar a toda a classe operária da humanidade um mínimo geral de direitos sociais”.8

Também a Constituição brasileira em vigor, promulgada a 5 de outubro de 1989, consagrou tais direitos, aos quais dedicou todo o seu art. 7º, incluindo entre eles, para exemplificar, salário mínimo, irredutibilidade de salário, décimo terceiro salário, duração da jornada normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, repouso semanal remunerado, férias anuais e vários outros, inclusive proteção à maternidade, com a concessão de salário-maternidade, e proteção à infância e à juventude, com a proibição, por exemplo, do trabalho antes de determinada idade (hoje fixada em 16, antes em 14 e, antes da Constituição Federal de 1988, em 12 anos).

A diferença entre tais direitos e os proclamados de início, como aqueles indicados na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, da França de 1789, aos quais já se aludiu, está em que, enquanto os direitos iniciais, como os que se procurou garantir por meio de proclamações solenes, como a constante daquela Declaração, diziam respeito a salvaguardas da liberdade individual em face da intromissão de agentes do poder público ou do Estado, estes outros direitos, que passaram a ser assegurados aos empregados, já não se impunha fossem observados diretamente pelo Estado, mas, sim, por outros particulares, no caso, os patrões. Impunha-se ao Estado, todavia, a criação de mecanismos que tornassem efetivos esses direitos conferidos aos empregados, partindo-se da premissa de que somente o Estado seria suficientemente forte para contrapor-se a patrão eventualmente renitente e que fosse também economicamente poderoso.

Noutra vertente, outros direitos foram sendo proclamados, desta feita envolvendo até mesmo uma tentativa de resposta à indagação acerca da finalidade do Estado.

A este respeito se afirmava, no item II da Declaração de Direitos do Bom Povo da Virgínia, de 1776, já referida anteriormente, que o governo era, ou pelo menos deveria ser, instituído para proveito comum, “proteção e segurança do povo, nação ou comunidade”, enquanto que, no art. 2º da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, proclamada pela Assembléia Nacional Francesa, em 1789, restara afirmado que a finalidade de toda associação política era a conservação dos direitos naturais e imprescritíveis do homem, consistentes na liberdade, propriedade, segurança e resistência à opressão.

Impossível não reconhecer nisso um nítido sabor contratualista, ao gosto de Hobbes9 (mas sem a crença nas excelências da monarquia absoluta), Locke10 (já agora fazendo prevalecer o parlamento sobre o rei), Rousseau11 (vontade geral, obediente, na prática, ao princípio assemblear majoritário), e até mesmo do Marquês de Beccaria12. Mesmo assim, convém não se perca de vista outro muito provável fundamento para que ao menos os integrantes da Assembléia Nacional Francesa, em 1789, houvessem afirmado que toda associação política tinha por finalidade, noutras palavras, o bem-estar de todos. Com tal assertiva, punha-se como princípio da associação política justamente que esta deve servir ao interesse de toda a comunidade, e nunca exclusivamente ao interesse dos próprios detentores do poder.13

Em tempos mais recentes, todavia, passou a reconhecer-se ao Estado uma função de promover o bem-estar geral, tornando para tanto acessíveis a toda a população (e sem custos diretos, além dos encargos tributários gerais) determinados serviços, como saúde, educação e previdência social. Serve mais uma vez de exemplo a Constituição Alemã de 1919 – Constituição de Weimar –, na medida em que, em seu art. 161, afirmava que o Reich criaria “um amplo sistema de seguros para poder, com o concurso dos interessados, atender à conservação da saúde e da capacidade para o trabalho, à proteção da maternidade e à previsão das conseqüências econômicas da velhice, da enfermidade e das vicissitudes da vida”.14

Também sob esta luz situa-se a Constituição Federal brasileira de 1988. Assegura, às expressas, o direito de todos à Seguridade Social, distribuída entre Previdência Social, Saúde e Assistência Social (art. 194). Além disso, afirma existir, da parte de todos, direito à educação, especialmente da parte de crianças e adolescentes (art. 205). De modo geral, a idéia de que o Estado deve atuar no sentido de promover o bem-estar de todos, resulta nítida inclusive do art. 3º, particularmente dos incisos II, III e IV, de acordo com os quais constituem objetivos fundamentais da República Federativa o garantir o desenvolvimento nacional, a erradicação da pobreza e da marginalização, a redução das desigualdades sociais e regionais, e a promoção do bem de todos, sem qualquer preconceito ou discriminação.

A diferença entre esses direitos que, muitas vezes, são chamados de direitos sociais e aqueles da primeira geração, relacionados a diferentes formas de liberdade individual e também à participação, quando menos pela eleição de representantes, na condução dos assuntos comunitários, está em que, em face destes direitos designados como sociais, se exige do Estado um facere, ao passo que, no tocante aos primeiros, se exige dele primordialmente que se abstenha de contra eles enveredar.

Os direitos de primeira geração exigem do Estado que se mantenha fora do âmbito de determinados assuntos privados ou que, quando necessite acusar alguém do cometimento de um crime e posteriormente puni-lo, se convicto de o haver cometido, observe determinados parâmetros.

Já estes direitos mais novos – como o direito à saúde, à educação, à previdência social e à assistência social, aos quais, com maior ou menor amplitude, podem ser acrescidos outros, como o direito à habitação, por exemplo –, exigem mais do Estado que manter-se fora da vida das pessoas, por assim dizer. Exigem dele que atue positivamente, criando as condições e prestando os serviços sem os quais tais direitos não vão além de promessas retóricas em um belo documento.

Em face dos direitos envolvendo patrões e empregados, deles se distinguem os direitos sociais justamente porque os primeiros são assegurados aos trabalhadores e sua observância é exigível da parte dos empregadores, colocando-se a tutela do Estado ao dispor dos primeiros, se necessário, ao passo que os direitos sociais são exigíveis da parte de cada pessoa em face do Estado. Noutros termos, os direitos dos empregados possuem como devedores os patrões, ao passo que os direitos designados como sociais possuem como devedor o próprio Estado.

Por fim (ao menos por enquanto, já que a sociedade humana está em constante evolver), direitos ainda mais recentes que aqueles relativos à educação e à saúde, ou à própria previdência social, passaram a ser acrescidos às declarações constitucionais de direitos.

Resultante – como, aliás, todos os demais – de fatos ocorridos no seio da coletividade, cabe referir especialmente o “direito ao meio ambiente”. Afirma, nesse aspecto, a Constituição Federal brasileira de 1988, por exemplo, que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.

Aqui, inversamente ao que se passa com os direitos sociais (educação e saúde, para mencionar somente dois exemplos), o dever de conduta, no sentido da preservação do ambiente, já não é mais unicamente do Estado, mas, na dicção da norma constitucional, de toda a coletividade. A coletividade é, aqui, a um tempo detentora do direito a um “meio ambiente ecologicamente equilibrado” e do dever de atuar para que tal meio ambiente seja preservado, para a geração presente e para as gerações futuras. Sem embargo de que referida atuação incumbe também ao Estado, em âmbito legislativo e também no exercício do poder de polícia em face de atividades de particulares.

3 O reconhecimento dos direitos fundamentais em âmbito internacional

Em tempos recentes, a afirmativa da existência de direitos fundamentais, inerentes à pessoa humana, passou do âmbito interno dos Estados, para o âmbito internacional. No ponto, é de referir-se particularmente à Declaração Universal dos Direitos do Homem, aprovada pela Assembléia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948, por meio da Resolução n. 217 A III.

Naquela Declaração,15 afirmaram-se, entre outros, na linha dos direitos de liberdade da primeira geração, incluídos os direitos relacionados a acusações relativas ao cometimento de crimes, os seguintes:

– o direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal (art. III);

– o direito de não ser escravizado (art. IV);

– o direito de ser reconhecido, em todos os lugares, como pessoa perante a lei (art. VI);

– a igualdade de todos perante a lei, sem qualquer distinção, e o direito a igual proteção legal (art. VII);

– o direito de todo homem acusado de um ato delituoso de “ser presumido inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público, no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa” (art. XI, n. 1);

– o direito à vida privada, no âmbito familiar e doméstico, o direito ao sigilo da correspondência e à integridade da honra e reputação (art. XII);

– o direito à propriedade (art. XVII);

– o direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião (art. XVIII);

– o direito à liberdade de opinião e expressão (art. XIX);

– o direito à liberdade de reunião e de associação pacíficas (art. XX);

– o direito a tomar parte no governo do seu país, diretamente ou por intermédio de representantes livremente escolhidos (art. XXI).

No terreno dos direitos relacionados ao trabalho, a Declaração Universal dos Direitos Humanos proclamou, entre outros:

– o direito a ter um trabalho de livre escolha de cada qual (art. XXIII, n. 1);

– o direito à igualdade de remuneração por igual trabalho (art. XXIII, n. 2);

– o direito a uma remuneração justa e satisfatória, que assegure ao trabalhador e a sua família uma existência compatível com a dignidade humana (art. XXIII, n. 3);

– o direito a repouso e lazer (art. XXIV).

Também no tocante a direitos sociais, ou de segunda geração, encontra-se na Declaração a afirmativa de que a todo ser humano deve ser assegurado:

– direito a um padrão de vida capaz de “assegurar a si e sua família saúde e bem estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e serviços sociais indispensáveis e direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência em circunstâncias fora de seu controle” (art. XXV);

– direito à instrução, que deve ser gratuita, pelo menos nos graus elementares e fundamentais, devendo a instrução elementar ser obrigatória, além de ser toda a instrução orientada no sentido do pleno desenvolvimento da personalidade humana e do “fortalecimento do respeito pelos direitos do homem e pelas liberdades fundamentais”, promovendo também “a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações raciais ou religiosas” (art. XXVI, n. 1, 2 e 3);

– direito à livre participação na vida cultural da comunidade, podendo fruir das artes e participar do progresso científico e de seus benefícios (art. XXVII);

– proteção da maternidade e da infância e igualdade, na proteção social, entre todas as crianças, nascidas dentro ou fora do matrimônio (art. XXV, n. 2).

De acordo com José Damião de Lima Trindade,

por um lado, a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 inaugurou o direito internacional dos direitos humanos (até então não havia nenhum documento internacional que se dedicasse ao assunto com tanta abrangência e importância) e, por outro, fundou a concepção contemporânea de direitos humanos que, ambiciosamente, visa integrar os direitos civis e políticos, que vinham se desenvolvendo desde o século XVIII (especialmente após a Declaração francesa de 1789), aos chamados direitos econômicos, sociais e culturais, demandados nos séculos XIX e XX pelo movimento operário (e que se instalaram definitivamente na cena mundial após a Declaração russa de 1918).16

Mesmo não revestindo a Declaração a condição de tratado internacional, o que poderia fazer, e efetivamente fez, surgir alguma controvérsia acerca do seu caráter de instrumento veiculador de normas jurídicas em âmbito internacional, Guido Fernando Silva Soares noticia que

a Corte Internacional de Justiça, no Caso do Pessoal Diplomático e Consular dos EUA em Teerã, na decisão definitiva, em 24-5-1980, deixou claro que considera a Declaração Universal como costume internacional, no mesmo pé de normatividade que os dispositivos da Carta da ONU.17

À Declaração Universal dos Direitos do Homem seguiram-se dois Pactos Internacionais, celebrados ambos no âmbito da ONU, reafirmando os mesmos direitos insculpidos na Declaração, a partir do que, no dizer de Guido Fernando Silva Soares, a discussão acerca da imperatividade da aludida Declaração perdeu sua atualidade.18

Trata-se do Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais e do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos.

O primeiro foi adotado pela Assembléia Geral da ONU em 16 de dezembro de 1996, iniciando sua vigência internacional a partir de 3 de janeiro de 1976, após haver sido depositado o correspondente 35º instrumento de ratificação. Mencionado Pacto foi aprovado no Brasil por meio do Decreto Legislativo n. 226, de 12 de dezembro de 1991, e promulgado por meio do Decreto n. 591, de 6 de julho de 1992.19

Já o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos também foi adotado pela Assembléia Geral das Nações Unidas, em 16 de dezembro de 1996, tendo sua vigência internacional iniciada em 23 de março de 1976, após haver sido depositado o respectivo 35o instrumento de ratificação. Tal Pacto foi aprovado no Brasil pelo Congresso Nacional também por meio do Decreto Legislativo n. 226, de 12 de dezembro de 1991, tendo sido promulgado pelo Decreto n. 592, de 6 de dezembro de 1992.20.

4 As diferentes categorias de atividades implementadas pelos organismos internacionais na tutela dos direitos do homem

Nas palavras de Norberto Bobbio, no momento presente já não se trata tanto de justificar esses direitos todos, é dizer, já não é de ocupar-se com a tarefa de encontrar-lhe os fundamentos, mas se trata, no momento contemporâneo, de buscar mecanismos que possam proteger os direitos reconhecidos, o que significa, noutros termos, mecanismos para que, além de “direitos” reconhecidos unicamente em solenes declarações, mas não observados no dia-a-dia de muitos, efetivamente se tenha mecanismos para tornar, para cada qual, uma realidade aquilo que nas solenes declarações se consigna.

No seu dizer, “o problema fundamental em relação aos direitos do homem, hoje, não é tanto o de justificá-los, mas o de protegê-los”, tratando-se, ainda no seu dizer, “de um problema não filosófico, mas político”.21

Não se cuida, pois, de explicar o porquê dos direitos, ou seja, de justificá-los ou de indicar-lhes o fundamento, para explicar por quais motivos são e devem continuar sendo preservados. Trata-se, muito mais, de encontrar mecanismos pelos quais seja assegurada a observância de tais direitos, mesmo aqueles da assim designada primeira geração, ou seja, os direitos de liberdade individual, acrescidos daqueles de participação política.

Enfim, cuida-se de desenvolver mecanismos que permitam evitar que tais direitos sejam violados e, quando não se lograr, nalgum caso, o sucesso almejado em evitar a violação, ao menos mecanismos que permitam o restabelecimento do direito violado.

Trata-se, portanto, de descobrir como evitar que o Estado, a despeito de solenes proclamações, enverede contra o direito do cidadão ou, quando já o tenha feito, de descobrir mecanismos para fazê-lo voltar ao terreno da adequada observância dos direitos proclamados.

Em suma, mostra-se necessário descobrir como fazer com que o direito, proclamado no papel, se torne uma realidade no relacionamento do indivíduo com o Estado (ou, eventualmente, também no relacionamento, por exemplo, entre patrões e empregados). Como fazer para que o Estado efetivamente respeite as diferentes liberdades, abstendo-se, exempli gratia, de enveredar contra alguém em virtude da opinião política ou religiosa que haja manifestado, ou em razão da etnia da qual faça parte.

Ainda nas palavras de Bobbio, diferentes organismos internacionais têm desenvolvido variadas atividades ditadas pelo propósito de assegurar a observância aos direitos fundamentais da pessoa humana. Registre-se, aqui, que tais atividades são voltadas primordialmente para a observância daqueles direitos designados como de primeira geração, os quais, embora dos mais antigos, vez por outra, em maior ou menor grau, com maior ou menor intensidade, também são alvo de afronta par parte deste ou daquele Estado.

Estas atividades dos organismos internacionais, no sentido da observância efetiva dos direitos do homem são, segundo Bobbio, de três ordens: atividades de promoção, de controle e de garantia.22

Por atividades de promoção, Bobbio entendia o conjunto de ações orientadas para dois objetivos:

a) induzir os Estados que não têm uma disciplina específica para a tutela dos direitos do homem a introduzi-la;

b) induzir os que já a têm a aperfeiçoá-la, seja com relação ao direito substancial (número e qualidade dos direitos a tutelar), seja com relação aos procedimentos (número e qualidade dos controles jurisdicionais)”.23

Por atividades de controle Bobbio entendia “o conjunto de medidas que os vários organismos internacionais põem em movimento para verificar se e em que grau as recomendações foram acolhidas, se e em que grau as convenções foram respeitadas”.24

Finalmente, por atividades de garantia, ou de garantia em sentido estrito, Bobbio entendia “a organização de uma autêntica tutela jurisdicional de nível internacional, que substitua a nacional”.25

Este terceiro grupo de atividades, diversamente dos dois primeiros, não teria, segundo Bobbio, o objetivo de criar ou reforçar as garantias dos direitos do homem existentes no âmbito interno dos Estados, mas, sim, o de instituir um sistema de jurisdição mais elevado, substituindo a garantia nacional pela internacional, quando a primeira for insuficiente ou mesmo inexistente.26

O sucesso de semelhantes mecanismos de garantia em âmbito supranacional, supra-estatal ou internacional, como se prefira, somente estará assegurado, como observava Bobbio, “quando uma jurisdição internacional conseguir impor-se e superpor-se às jurisdições nacionais, e quando se realizar a passagem da garantia dentro do Estado – que é ainda a característica predominante da atual fase – para a garantia contra o Estado”.27

A premissa para que se possa cogitar de mecanismos internacionais de garantia dos direitos do homem contra o Estado que os viole, reside no reconhecimento da existência de direitos fundamentais da pessoa humana, realizada em âmbito internacional ou supranacional. Tal reconhecimento é representado, antes de tudo, segundo Bobbio, justamente pela Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovada pela Assembléia Geral da Organização das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948.28

5 Possíveis mecanismos internacionais de garantia (no sentido estrito) dos direitos do homem, contra Estados que os violem

Na abordagem do tema, a ser feita deste ponto em diante, não se haverá de perder de vista a observação feita por Bobbio, segundo a qual a garantia internacional é tão menos possível onde mais é necessária, e tão menos necessária, onde a sua implementação é mais viável. Os Estados que mais relutam na observância dos direitos do homem são também aqueles que se mostram mais refratários a qualquer intervenção da comunidade internacional em seus âmbitos internos, para os fazer valer. Já os Estados que mais respeitam os direitos do homem, são aqueles onde, por evidente, a intervenção de uma jurisdição internacional em defesa de tais direitos, é menos necessária. No dizer de Bobbio: “dito de modo drástico: encontramo-nos hoje numa fase em que, com relação à tutela internacional dos direitos do homem, onde essa é possível talvez não seja necessária, e onde é necessária é bem menos possível”.29

Mesmo à vista de semelhantes dificuldades, organismos internacionais existem ou, pelos menos, estão sendo atualmente constituídos, que, quando não tenham por função justamente servir como mecanismos de garantia da observância dos direitos fundamentais do homem inclusive em face de Estados que os violem, ao menos adotam dispo sições a serem aplicadas em face do Estado violador, com caráter sancionador da violação de tais direitos, mesmo que sem intervenção direta em seu âmbito interno. Ademais, existe também no âmbito de tais organismos a afirmação expressa do reconhecimento de certos direitos da pessoa humana, e também a afirmação de certos princípios básicos a serem observados pelos Estados que integram tais organismos, princípios esses que, a rigor, estão na raiz dos próprios direitos fundamentais da pessoa humana.

No ponto, vale a pena apreciar inicialmente certas disposições da recente Constituição da União Européia, constante de Convenção aprovada pelos Estados-Membros em 29 de outubro de 2004. Em seguida, será feita uma referência, mesmo breve, à Corte Internacional de Justiça e ao Tribunal Penal Internacional, na perspectiva de suas potencialidades para a preservação de direitos fundamentais da pessoa humana, ainda quando não sejam destinados precipuamente a tal tarefa.

Haverão que ser incluídos, portanto, diretamente entre os mecanismos de garantia da observância de tais direitos, imposta por organismo internacional, mesmo em face de Estados que os violem.

Deve restar feita, porém, desde logo, a observação de que a União Européia, muito embora em sua Constituição haja afirmado a existência e exigido a observância (quando menos no âmbito do funcionamento da própria União, mas na realidade de modo também mais abrangente) de direitos fundamentais da pessoa humana, não foi criada com o objetivo exclusivo de empreender a respectiva proteção, quando violados pelos Estados-Membros. Sem embargo, tais violações também podem resultar na imposição de sanções ao Estado-Membro violador, no âmbito da própria União.

6 O reconhecimento de direitos fundamentais da pessoa humana, na constituição da União Européia

A Parte II da Constituição da União Européia30 consiste na Carta dos Direitos Fundamentais da União. Não se trata, como o nome poderia sugerir, de direitos da própria União, como organismo supranacional, mas verdadeiramente de uma declaração dos direitos que a União reconhece fundamentais a toda pessoa humana.

Já no preâmbulo da Parte II da Constituição, observa-se o seguinte:

Consciente do seu patrimônio espiritual e moral, a União baseia-se nos valores indivisíveis e universais da dignidade do ser humano, da liberdade, da igualdade e da solidariedade; assenta nos princípios da democracia e do Estado de Direito.

A tudo se acrescenta que, “ao instituir a cidadania da União e ao criar um espaço de liberdade, segurança e justiça”, a União coloca o ser humano no cerne de sua ação. Ademais disso, para o efeito de assegurar a preservação desses valores comuns, antes enunciados, entenderam os países signatários da Convenção que aprovou a Constituição da União Européia, ser necessário conferir maior visibilidade a tais valores por meio de uma Carta, assim como era necessário reforçar a proteção dos direitos fundamentais, à luz da evolução da sociedade, do progresso social e da evolução científica e tecnológica.

Os direitos fundamentais do ser humano, enunciados na Constituição da União Européia, dividem-se em quatro grandes grupos: dignidade da pessoa humana, liberdades da pessoa humana, igualdade dos seres humanos e solidariedade entre os seres humanos (arts. II-61o a II-98o). A Parte II da Constituição da União Européia, todavia, enuncia também direitos relacionados à cidadania e à justiça. Nestes últimos, inclui fundamentalmente as garantias em face de acusações penais, como a garantia à ampla defesa, a presunção de inocência e os princípios da legalidade e da proporcionalidade das penas (arts. II-108º a II-110º). No âmbito dos direitos do ser humano relacionados à Justiça, a Constituição inclui também o direito à ação (judicial) e o direito de acesso a um tribunal imparcial (art. II-107o).

Muito embora a União Européia seja dotada de Tribunais, cujas competências se acham disciplinadas, bem como diversos outros temas, na Parte III da Constituição (arts. III-353º a III-381º), da análise dessas competências se verifica, todavia, que nelas não se compreende a tarefa de assegurar a observância dos direitos da pessoa humana, proclamados na própria Constituição, em face de violações a eles, empreendidas por ou no âmbito de algum Estado-Membro.

Para que se compreenda melhor o mecanismo existente no interior da Constituição da União Européia, que de algum modo pode servir como garantia da observância dos direitos fundamentais da pessoa humana no âmbito dos Estados-Membros da União, há necessidade de que se relembre quais os valores fundamentais da União.

Acham-se enunciados na Parte I da Constituição, que trata da definição e objetivos da União, mais especificamente no art. I-2º, que tem o seguinte conteúdo:

A União funda-se nos valores do respeito pela dignidade humana, da liberdade, da democracia, da igualdade, do Estado de Direito e do respeito dos direitos, incluindo dos direitos das pessoas pertencentes a minorias. Estes valores são comuns aos Estados-Membros, numa sociedade caracterizada pelo pluralismo, a não discriminação, a tolerância, a justiça, a solidariedade e a igualdade entre mulheres e homens.

Como anotado anteriormente, os direitos e asgarantias da pessoa humana, explicitados na Parte II da Constituição da União Européia, dividem-se em direitos relacionados à dignidade, à liberdade das pessoas, à igualdade e solidariedade entre elas, havendo também direitos relacionados à cidadania e à Justiça.

Não seria incorreto, pois, afirmar que os diversos direitos consagrados na Parte II da Constituição configuram desmembramentos e abordagens particulares dos próprios valores sobre os quais se funda a União.

A defesa da observância de tais valores, portanto, quando violados, significará a defesa também dos respectivos desdobramentos, consagrados na Parte II do texto da Constituição.

Em seu art. I-59º, inserido na Parte I do texto da Constituição, justamente aquela que disciplina a definição e os objetivos da União, trata-se da “suspensão de certos direitos resultantes da qualidade de membro da União”.

A suspensão do exercício de direitos inerentes ao Estado-Membro perante a União Européia, resultantes justamente da circunstância de ser esse Estado-Membro um dos partícipes da União, poderá ser proclamada quando houver a constatação, por parte do Conselho Europeu, por iniciativa de um terço dos Estados-membros ou por proposição da Comissão Européia, da violação grave e persistente, por parte do Estado-membro considerado, dos valores enunciados no art. I-2º, da Constituição, isto é, justamente dos valores sobre os quais se funda a União.

Como os direitos da pessoa humana, enunciados na Parte II da Constituição, representam desdobramentos dos aludidos valores, tem-se que a violação a tais direitos por parte de um Estado-Membro, desde que reconhecida pelo Conselho Europeu como “grave e persistente”, poderá redundar na suspensão, por decisão do mesmo Conselho, do exercício de certos direitos resultantes da condição de partícipe da União Européia.

Todavia, o mecanismo para que se chegue a essa suspensão do exercício de direitos inerentes à qualidade de membro da União Européia é complexo, exigindo, em certo ponto, até mesmo decisão unânime do Conselho da Europa, após aprovação pelo Parlamento Europeu.

O mecanismo se desenvolve em duas etapas: na primeira, para a qual se exige unanimidade do Conselho Europeu e aprovação do Parlamento Europeu, se produz a declaração, de autoria do Conselho, de que está ocorrendo, por parte de um dos Estados-Membros, violação grave e persistente dos valores sobre os quais a União se funda. Na segunda etapa, o Conselho Europeu, deliberando agora por maioria qualificada, decide pela suspensão de algum ou alguns dos direitos inerentes à qualidade de membro da União, por parte daquele Estado em que a grave e persistente violação dos valores sobre os quais se funda a União esteja acontecendo.

As alíneas 2 e 3, do art. I-59º, da Constituição da União, disciplinam este tema:

2. O Conselho Europeu, por iniciativa de um terço dos Estados-Membros ou sob proposta da Comissão, pode adotar uma decisão européia em que constate a existência de uma violação grave e persistente, por parte de um Estado-Membro, dos valores enunciados no artigo I-2o, após ter convidado esse Estado a apresentar as suas observações sobre a questão. O Conselho Europeu delibera por unanimidade, após aprovação do Parlamento Europeu.

3. Feita a constatação a que se refere o n. 2, o Conselho, deliberando por maioria qualificada, pode adotar uma decisão européia que suspenda alguns dos direitos decorrentes da aplicação da Constituição ao Estado-Membro em causa, incluindo o direito de voto do membro do Conselho que represente esse Estado. O Conselho tem em conta as eventuais conseqüências dessa suspensão sobre os direitos e obrigações das pessoas singulares e coletivas.

De qualquer modo, esse Estado continua vinculado às obrigações que lhe incumbem por força da Constituição.

Como se vê, não se trata ainda de mecanismo de direta intervenção da União no âmbito do Estado-Membro, para fazer com que observe determinado direito fundamental do ser humano, consagrado na Constituição da União. O sancionamento da violação a direito fundamental que a Constituição consagre ocorre de modo indireto, pela suspensão do exercício de um ou mais direitos de que o Estado-Membro é titular, como integrante da própria União.

De todo modo, tem-se uma possibilidade, ainda que sem a presença da intervenção direta, de preservação de direito fundamental, emanada de organismo internacional.

7 A Corte Internacional de Justiça

A Corte Internacional de Justiça, instituída pela Organização das Nações Unidas, não é mecanismo destinado precipuamente à intervenção da comunidade internacional sobre um Estado-Membro, para garantia da preservação, por parte desse Estado, dos direitos fundamentais da pessoa humana, reconhecidos na Declaração de 1948.

O Direito Internacional caminha no sentido de que dele sejam sujeitos não mais apenas os Estados, mas também as pessoas humanas consideradas individualmente, inclusive na perspectiva de litígios entre elas e o próprio Estado do qual sejam nacionais ou em cujo território se encontrem, ou mesmo entre pessoas humanas e Estados estrangeiros, ainda que não se encontrem no respectivo território. Também as pessoas humanas, e não mais apenas os Estados (e os organismos internacionais formados pelas reuniões de Estados) passariam a ser sujeitos de direitos na ordem internacional.

Não é nessa perspectiva, porém, que a Corte Internacional de Justiça exerce a sua tarefa.

Em primeiro lugar, de acordo com o art. 34 do seu Estatuto, somente Estados podem perante ela litigar. Tal circunstância, portanto, já exclui a possibilidade de que pessoas naturais, individualmente consideradas, busquem o socorro da Corte Internacional de Justiça. A função dela ainda consiste primordialmente na solução de litígios entre Estados – membros tradicionais da comunidade internacional e sujeitos tradicionais do Direito Internacional.

As situações específicas em que surge a competência da Corte Internacional de Justiça, elencadas no art. 36 do respectivo Estatuto, deixam ainda mais nítida essa observação:

Art. 36.

1. A competência da Corte abrange todas as questões que as partes lhe submetam, bem como todos os assuntos especialmente previstos na Carta das Nações Unidas ou em tratados e convenções em vigor.

2. Os Estados que tomam parte no presente Estatuto poderão, em qualquer momento, declarar que reconhecem como obrigatória, ipso facto e sem acordo especial, em relação a qualquer outro Estado que aceite a mesma obrigação, a jurisdição da Corte em todas as controvérsias de ordem jurídica que tenham por objeto:

a) a interpretação de um tratado;

b) qualquer ponto de direito internacional;<

c) a existência de qualquer fato que, se verificado, constituiria a violação de um compromisso internacional;

d) a natureza ou a extensão da reparação devida pela ruptura de um compromisso internacional.31

Tocante diretamente a violações de direitos humanos em qualquer país, a Corte Internacional de Justiça pode emitir uma opinião, desde que seja consultada acerca do assunto por qualquer organismo que, segundo norma da Organização das Nações Unidas, disponha de legitimidade para provocar a manifestação da Corte.

Tal resulta do art. 65 do Estatuto da Corte:

Art. 65.

1. A Corte poderá dar parecer consultivo sobre qualquer questão jurídica, a pedido do órgão que, de acordo com a Carta das Nações Unidas ou por ela autorizado, estiver em condições de fazer tal pedido.32

A Corte poderá até mesmo reconhecer, em resposta a semelhante consulta, que ocorre violação a direito fundamental da pessoa humana em algum Estado. Dito reconhecimento, todavia, ainda não a autorizará a interferir diretamente em tal Estado. Outros mecanismos serão aí necessários, para que a intervenção da Organização das Nações Unidas possa acontecer.

Na observação de Hildebrando Accioly, ratione materiae “a competência da Corte estende-se a todas as questões que as partes lhe submetam, bem como a todos os assuntos especialmente previstos na Carta das Nações Unidas ou em tratados e convenções internacionais em vigor”. Sem embargo, ainda na observação do mesmo autor, ratione personae a competência da corte “abrange apenas os Estados, sejam ou não Membros das Nações Unidas”, de tal sorte que, se “simples particulares pretendem fazer valer direitos perante a Corte, é necessário que o seu governo espose as respectivas pretensões ou reclamações”33. Essa última observação evidencia bem as limitações a que a Corte Internacional de Justiça pode ficar sujeita, como mecanismo de defesa de direitos fundamentais, quando violados no âmbito de algum Estado, particularmente quando a violação provenha justamente de agentes do Estado.

8 O Tribunal Penal Internacional

O Tribunal Penal Internacional, cujo Estatuto foi aprovado em Roma e cujo texto, depois de aprovado pelo Congresso Nacional do Brasil por meio do Decreto Legislativo n. 112, de 6 de junho de 200234, foi promulgado pela Presidência da República por meio do Decreto n. 4.388, de 25 de setembro de 2002, tem um perfil diferente daquele da Corte Internacional de Justiça.

Nele, ao menos uma das partes pode ser pessoa natural, na medida em que venha a incidir sob a competência da Corte, como autora de crime “de maior gravidade com alcance internacional”, de acordo com o previsto no próprio Estatuto (art. 1º).

A tendência – deve-se reconhecer – é a de que tais crimes “de maior gravidade com alcance internacional” acabem por importar em violações amplas de direitos fundamentais das pessoas humanas, no território de determinado Estado.

Tal conclusão tende a ser confirmada pelo rol dos crimes que incidem sob a competência do Tribunal Penal Internacional, constante da alínea 1 de seu art. 5º. Tais crimes são os seguintes:

a) crime de genocídio;

b) crimes contra a humanidade;

c) crimes de guerra;

d) crimes de agressão.

A definição, para os fins de disciplinamento da competência do Tribunal, do que se deva considerar por crimes de genocídio, crimes contra a humanidade ou crimes de guerra, consta dos arts. 6º a 8º do Estatuto, o qual, todavia, não contém delimitação do que se deva entender por crimes de agressão.

Quando se analisa, mesmo que de forma superficial, o elenco das condutas consideradas como crimes contra a humanidade, conclui-se, sem maiores dificuldades, que todos eles podem representar violação a direito fundamental da pessoa humana, nas suas mais diferentes perspectivas, ou seja, desde o próprio direito à vida e a tratamento digno, até o direito à liberdade e à segurança física pessoal, inclusive na perspectiva sexual e da reprodução.

Se a autoria de algum crime, dentre aqueles sujeitos à competência do Tribunal, for atribuída a integrante de algum governo, ou a qualquer pessoa que de algum modo desenvolva atividade diretiva de qualquer natureza no âmbito de algum Estado, nem por isso deixará de existir a competência da Corte para impor a tal dirigente estatal, autor de tais crimes, as sanções que possam ser aplicadas pelo Tribunal.

Mesmo assim, ainda aqui o que se tem é o exercício de jurisdição punitiva, que não importa, em princípio, na possibilidade de intervenção de organismo da comunidade internacional em Estado soberano, como resultado de decisão jurisdicional tomada em face do próprio Estado, reconhecendo que viola direito consagrado pela Declaração Universal dos Direitos do Homem, aprovada pela Assembléia Geral da ONU em 1948.

A possibilidade da condenação criminal do violador de direito fundamental da pessoa humana é um passo adiante no exercício da jurisdição internacional nesta matéria, mas ainda não permite, como resultado desse exercício, a intervenção no território do Estado, para fazer cessar as violações de direitos humanos ali ocorridas.

9 Considerações finais

Ao menos desde o final do século XVIII, acentuaram-se as preocupações com a defesa de certas liberdades do ser humano, e também com a possibilidade de assegurar-se a participação do maior número possível de pessoas na formação da vontade estatal, ainda que mediante eleição de representantes para integrarem assembléias populares destinadas a discutir os temas de relevância para a coletividade inteira e deliberar a respeito deles. A inclusão de tais liberdades em textos, designados desde então como Constituições, tornou-se fato que hoje se pode observar em praticamente todo o mundo, o que não significa, contudo, que a inclusão de tais liberdades – e também de outras, acrescidas às primevas com o passar dos anos –, seja seguida do seu efetivo respeito, em sua plenitude e em toda parte, inclusive em Estados que formalmente afirmam assegurá-las.

Tais liberdades, tradicionalmente designadas como direitos fundamentais de primeira geração, foram seguidas, ao longo do tempo, principalmente diante da severa investida do capital sobre a mão de obra, cuja abundância (e desorganização) a tornava produto de baixo preço, da inclusão, nos textos constitucionais, de exigências dirigidas ao Estado, para que assegurasse também outros direitos a todos. Nesse ponto, passaram a ser incluídas nos termos das Constituições determinadas exigências de tratamento mínimo dos empregados pelos patrões, assim como exigências de que o Estado providenciasse para que todos tivessem assegurados determinados serviços públicos – como saúde, educação e previdência social – que vão sendo ainda designados tradicionalmente de direitos fundamentais de segunda geração.

Como dito, todavia, a previsão de que tais direitos devem ser assegurados a todos, não significa que efetivamente o sejam em toda parte. Ao longo do tempo, tal constatação fez surgir preocupação com a garantia desses direitos também em âmbito internacional.

Na segunda metade do século XX, encerrada a Segunda Guerra Mundial, constituída a Organização das Nações Unidas, foi inicialmente proclamada pela sua Assembléia Geral, em 1948, a Declaração Universal dos Direitos do Homem.

À declaração seguiram-se pactos internacionais, com a configuração de tratados, dando definitiva forma jurídica à garantia internacional dos direitos fundamentais.

Sem embargo, os mecanismos de âmbito internacional, existentes para tornarem efetivos tais direitos, ainda não alcançaram o ponto em que um poder supranacional, superposto a todos os Estados, pudesse interferir, quando violações a tais direitos ocorressem, no âmbito interno de um determinado Estado.

Porém, mesmo inexistindo a aludida possibilidade, alguns mecanismos se vão desenhando com o propósito de tornar mais eficaz a proteção internacional dos direitos fundamentais.

Assim, dessa perspectiva, abordou-se, no presente texto, o mecanismo – inserido na Constituição da União Européia – que permite seja algum dos países-membros da União afastado do exercício de determinados direitos que a sua condição de partícipe da União lhe assegura, em caso de inobservância grave e reiterada de garantias conferidas aos seres humanos no âmbito da Constituição da própria União.

Além disso, restou feita referência também a um possível papel da Corte Internacional de Justiça, vinculada à Organização das Nações Unidas, para defesa da observância de direitos fundamentais em âmbito internacional, fazendo-se, finalmente, uma referência breve à possibilidade de que também o recém-criado Tribunal Penal Internacional, sediado em Roma, possa cumprir um papel nessa tarefa.

É seguro que o caminho todo, no rumo da preservação efetiva dos direitos fundamentais em âmbito internacional, ainda não foi trilhado. Seguro é também, contudo, que já se iniciou o percurso para que tal objetivo seja atingido.

Referências bibligráficas

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Notas

1 Disponível em FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves; GRINOVER, Ada Pellegrini; CUNHA FERRAZ, Anna Candida da. Liberdades públicas (Parte Geral). São Paulo: Saraiva, 1978. p. 45-54.

2 O texto da Declaração de Direitos do Bom Povo da Virgínia pode ser lido em FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves; GRINOVER, Ada Pellegrini; CUNHA FERRAZ, Anna Candida da. Liberdades públicas (Parte Geral). São Paulo: Saraiva, 1978. p. 54-57.

3 O texto da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, do qual extraídas as referências que serão feitas em seguida, consta em FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves; GRINOVER, Ada Pellegrini; CUNHA FERRAZ, Anna Candida da. Liberdades públicas (Parte Geral). São Paulo: Saraiva, 1978. p. 57-59.

4 CAMPANHOLE, Adriano; CAMPANHOLE, Hilton Lobo. Todas as Constituições do Brasil. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1976. p. 542-544.

5 Ibidem, p. 526 e 532.

6 RUSSOMANO, Mozart Victor. Curso de Direito do Trabalho. Rio de Janeiro: José Konfino, 1974. p. 15-16.

7 NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Fundamentos do Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 1970. p. 20.

8 O texto parcial da Constituição de Weimar, da qual extraídas as referências feitas, consta de FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves; GRINOVER, Ada Pellegrini; CUNHA FERRAZ, Anna Candida da. Liberdades públicas (Parte Geral). São Paulo: Saraiva, 1978. p. 83-93.

9 “O fim último, causa final e desígnio dos homens (que amam naturalmente a liberdade e o domínio sobre os outros), ao introduzir aquela restrição sobre si mesmos sob a qual os vemos viver nos Estados, é o cuidado com sua própria conservação e com uma vida mais satisfeita. Quer dizer, o desejo de sair daquela mísera condição de guerra que é a conseqüência necessária (conforme se mostrou) das paixões naturais dos homens, quando hão há um poder visível capaz de os manter em respeito, forçando-os, por medo do castigo, ao cumprimento de seus pactos e ao respeito àquelas leis de natureza que foram expostas nos capítulos décimo quarto e décimo quinto” (HOBBES, Thomas. Leviatã ou matéria, forma e poder de um Estado eclesiástico e civil. Trad. de João Paulo Monteiro e Maria Beatriz Nizza da Silva.. 2. ed. São Paulo: Abril S/A Cultural e Industrial, 1979, p. 103 Série “Os Pensadores”).

10 “Se o homem no estado de natureza é tão livre, conforme dissemos, se é senhor absoluto da sua própria pessoa e posses, igual ao maior e a ninguém sujeito, por que abrirá ele mão dessa liberdade, por que abandonará o seu império e sujeitar-se-á ao domínio e controle de qualquer outro poder? Ao que é óbvio responder que, embora no estado de natureza tenha tal direito, a fruição do mesmo é muito incerta e está constantemente exposta à invasão de terceiros porque, sendo todos reis tanto quanto ele, todo homem igual a ele, e na maior parte pouco observadores da eqüidade e da justiça, a fruição da propriedade que possui nesse estado é muito insegura, muito arriscada. Estas circunstâncias obrigam-no a abandonar uma condição que, embora livre, está cheia de temores e perigos constantes; e não é sem razão que procura de boa vontade juntar-se em sociedade com outros que estão já unidos, ou pretendem unir-se, para a mútua conservação da vida, da liberdade e dos bens a que chamo de ‘propriedade’” (LOCKE, John. Segundo tratado sobre o Governo. Trad. de E. Jacy Monteiro. 2. ed. São Paulo: Abril S/A Cultural e Industrial, 1978. p. 82 Série “Os Pensadores”).

11 “Encontrar uma forma de associação que defenda e proteja a pessoa e os bens de cada associado com toda a força comum, e pela qual cada um, unindo-se a todos, só obedece contudo a si mesmo, permanecendo assim tão livre quanto antes. Esse o problema fundamental cuja solução o contrato social oferece” (ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do contrato social. Trad. de Lourdes Santos Machado. São Paulo: Abril S/A Cultural e Industrial, 1973. p. 38 Série “Os Pensadores”).

12 “Fatigados de viver apenas em meio a temores e de encontrar inimigos em toda parte, cansados de uma liberdade cuja incerteza de a manter tornava inútil, sacrificaram [os homens] uma parte dela para usufruir do restante com mais segurança. A soma dessas partes de liberdade, assim sacrificadas ao bem geral, constitui a soberania na nação; e o encarregado pelas leis como depositário dessas liberdades e dos trabalhos da administração foi proclamado o soberano do povo” (BONESANA, Cesare. Marquês de Beccaria. Dos delitos e das penas. Trad. de Torrieri Guimarães. São Paulo: Rideel, 2003. p. 18).

13 Era justamente a diferença entre os propósitos que tinha em mira o governante, ao exercer a sua autoridade, que Aristóteles utilizava para distinguir as formas puras das formas impuras de constituição. Quando o ou os governantes – fosse ele um só, fossem alguns, fossem muitos – exercia o poder na verdade apenas em seu próprio benefício, surgia forma impura de constituição. Assim, distinguiu o filósofo a forma pura de constituição com governo de um só – monarquia, da sua forma impura, a tirania. Da mesma forma, distinguiu a forma pura do governo dos mais capazes – aristocracia, do governo de poucos, exercido para benefício próprio, a que denominou oligarquia. Por fim, a par da “politeia” ou “república” governo de muitos ou da multidão, forma pura de gestão da coisa pública, porque realizada essa gestão em benefício de todos, contrapunha-se a “democracia”, em que o exercício do poder, embora em mãos de muitos, também não se dava em benefício coletivo. “O governo é o exercício do poder supremo do Estado. Este poder só poderia estar ou nas mãos de um só, ou da minoria, ou da maioria das pessoas. Quando o monarca, a minoria ou a maioria não buscam, uns ou outros, senão a felicidade geral, o governo é necessariamente justo. Mas, se ele visa ao interesse particular do príncipe ou dos outros chefes, há um desvio. O interesse deve ser comum a todos ou, se não o for, não são mais cidadãos” (ARISTÓTELES. A política. Trad. de Roberto Leal Ferreira. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998. p. 105-106). A palavra grega “politéia” foi empregada para designar o governo de muitos em sua forma pura em outra edição da Política (ARISTÓTELES. Política. Trad. de Therezinha Monteiro Deutsch e Baby Abrão. São Paulo: Nova Cultural, 1999. p. 224 Série “Os Pensadores”).

14 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves; GRINOVER, Ada Pellegrini; CUNHA FERRAZ, Anna Candida da. Liberdades públicas (Parte Geral). São Paulo: Saraiva, 1978. p. 92.

15 Disponível em RANGEL, Vicente Marotta. Direito e relações internacionais. 7. ed. São Paulo: RT, 2002. p. 656-663.

16 TRINDADE, José Damião de Lima. História social dos direitos humanos. São Paulo: Editora Fundação Petrópolis, 2002. p. 191.

17 SOARES, Guido Fernando Silva. Curso de Direito Internacional Público. Volume 1. São Paulo: Atlas, 2002. p. 345.

18 Idem.

19 Texto disponível em RANGEL, Vicente Marotta. Direito e relações internacionais. 7. ed. São Paulo: RT, 2002. p. 679-692.

20 Ibid., p. 693-716.

21 BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Trad. de Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Campus, 1992. p. 24. [Os itálicos constam do original.]

22 BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Trad. de Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Campus, 1992. p. 39.

23 Idem.

24 Ibidem, p. 40.

25 Idem.

26 BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Trad. de Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Campus, 1992. p. 40.

27 Ibidem, p. 41-42.

28 Ibidem, p. 27.

29 Ibidem, p. 41.

30 Disponível em <europa.eu.int/eur-lex/JOHtml.do?uri=OJ:C:2004: 310:SOM:PT:HTML>. Acesso em 25 fev. 2005.

31 ACCIOLY, Hildebrando. Manual de Direito Internacional Público. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 1976. p. 358.

32 Ibidem, p. 367.

33 Ibidem, p. 151.

34 Disponível em Código Penal. Obra coletiva de autoria da Editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz dos Santos Windt e Livia Céspedes. 41. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 784-849.

Paulo Márcio Cruz. Doutor e Mestre em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina. Professor de Teoria Política e Teoria Constitucional nos cursos de Graduação, Mestrado e Doutorado da Univali.

Pedro Roberto Decomain. Mestrando em Ciência Jurídica pela Univali. Professor na Universidade de Contestado (UnC), Campus Mafra/Rio Negrinho. Professor na Escola de Preparação e Aperfeiçoamento do Ministério Público de Santa Catarina. Promotor de Justiça em Santa Catarina.

Publicado na RESENHA ELEITORAL - Nova Série, v. 12, n. 1 (jan./jun. 2005).

 

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