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Íntegra

As principais questões julgadas em 1996

Por: João José Ramos Schaefer

As eleições municipais de 1996, ao lado dos temas tradicionais relacionados com o registro de candidatos, consultas sobre inelegibilidade, propaganda eleitoral, etc., suscitaram novas e importantes questões vinculadas à suspensão condicional de processos-crimes eleitorais, em decorrência do art. 89 da Lei n. 9.099/95, ou decorrentes da nova Lei Orgânica dos Partidos (Lei n. 9.096/95) ou, ainda, da votação informatizada nas Capitais e nos Municípios de população superior a 200.000 eleitores, determinada na forma da Lei n. 9.100/95.

Pertinente, pois, que se examinem os principais temas versados pelo Tribunal no curso do aludido pleito.

1 A supensão condicional dos processos

Essa matéria foi alvo de um primeiro julgamento em maio.

Entendimento (por maioria) no sentido da inaplicabilidade dessa lei aos crimes eleitorais evoluiu e, pelo Acórdão n. 14.010, assentou-se que o instituto em causa não era incompatível com os crimes eleitorais.

Permaneceu uma controvérsia, que ainda perdura: saber-se se, omitindo-se o Ministério Público em propor a aplicação do instituto, mesmo reunindo o réu os requisitos necessários, pode o Juiz fazê-lo. Há doutrina e jurisprudência em prol das duas posições, e o Tribunal Superior Eleitoral, junto ao qual pende decisão de recurso sobre a questão, dirá a palavra definitiva a respeito.

Outro ponto controvertido, mas com posição reiterada do Tribunal, embora não unânime, é se em relação aos recursos ao TRE a proposta de suspensão é feita pela Procuradoria Regional Eleitoral ou pelo Promotor Eleitoral. A maioria vem decidindo pela baixa dos processos ao Promotor Eleitoral, mais próximo do réu e, assim, melhor habilitado a com ele discutir as condições da respectiva suspensão condicional do processo (Acórdão n. 14.485), competindo-lhe, pois, apresentar a proposta de suspensão.

2 Os registros de diretórios e impugnações a pedidos de anotação

Em função das disposições da nova Lei dos Partidos Políticos, o Tribunal foi chamado a definir se a Justiça Eleitoral tem competência para promover o registro de Diretórios Municipais de Partidos, bem como sobre impugnação a pedido de anotação de comissão provisória ou nulidade de convenção regional ou municipal, questões todas que definiu como interna corporis dos partidos políticos e, assim, alheias à competência do Tribunal Regional Eleitoral.

Este se limita a anotar a composição dos diretórios estaduais dos partidos políticos, sem, entretanto, decidir eventuais controvérsias sobre a regularidade ou não de sua eleição.

3 Consultas sobre inelegibilidades

As consultas sobre inelegibilidades se intensificaram a partir de abril de 1996.

Versaram sobre a elegibilidade do Vice-Prefeito para o mesmo cargo, ou seja, sobre sua reelegibilidade, respondida negativamente, dizendo-se não vedada sua elegibilidade para outros cargos, desde que não assuma o Governo Municipal nos 6 meses anteriores ao pleito (Resoluções ns. 6.920 e 6.923); sobre a desincompatibilização de detentores de cargos comissionados (Resolução n. 6.923); em torno da necessidade de afastamento de diretores de Cooperativas (Resolução n. 6.933); sobre o necessário afastamento dos locutores de rádio a partir da escolha em convenção, mas não do diretor da emissora, porque sem contato direto com o público (Resolução n. 6.929), etc.

Em maio, foram feitas indagações à Corte sobre a necessidade, respondida afirmativamente, de afastamento do empregado de sociedade de economia mista (Resolução n. 6.938); sobre a situação do militar que se candidata, o qual, tendo menos de 10 anos, passa à inatividade logo após o registro de sua candidatura, sem necessidade de desincompatibilização prévia ou afastamento (Resolução n. 6.942); sobre a desnecessidade do afastamento do servidor público de um município, candidato a cargo eletivo noutro município, situação peculiar a algumas comunas na divisa com outros Estados (Resolução n. 6.947); sobre a não-coincidência necessária entre o domicílio eleitoral e o domicílio civil, matéria que despertou acesos debates (Resolução n. 6.939), entendendo-se inalterável o domicílio eleitoral até sua transferência voluntária ou cancelamento por ação judicial ou processo de revisão (esta questão voltaria a ser suscitada concretamente em agosto - Acórdão n. 14.165); sobre movimentação de pessoal nos períodos pré e pós-eleitorais, aplicável a Lei n. 6.901/74 (Resolução n. 6.956); sobre a desnecessidade de desincompatibilização ou afastamento dos membros do Conselho Estadual de Assistência Social, salvo se representantes paritários de entidades governamentais, porque, então, devem se afastar, uma vez que funcionários públicos (Resolução n. 6.960); necessidade de afastamento de professores temporários (Resolução n. 6.965), etc.

4 Outros temas objeto de consultas

Na Resolução n. 6.963, de junho, dirimiu o Tribunal dúvidas então correntes sobre a competência dos Juízes Eleitorais de duas ou mais zonas situadas num mesmo Município com jurisdição sobre outros Municípios, não mais sendo questionada a matéria desde então.

Entendeu o Tribunal, na Resolução n. 6.955, de junho, sobre a auto-aplicabilidade da suspensão dos direitos políticos em virtude de condenação criminal decorrente do art. 15, III, da Constituição Federal.

Esse dispositivo, aliás, encerra situações injustas.

Tanto tem suspensos os seus direitos políticos o condenado por crimes de concussão, estelionato, falsidade ideológica, o que é extremamente justo, como o condenado por crime culposo, por exemplo, por um atropelamento, não sendo hábil a concessão do sursis para evitar a suspensão, só a extinção da pena alcançando o efeito de restituir os direitos políticos.

5 Consultas não conhecidas

Inúmeras consultas não foram conhecidas, seja porque formuladas por pessoas sem legitimidade ativa ad causam para tal (são legitimados, entre outros, os partidos políticos, por seus Presidentes e Delegados, os Juízes Eleitorais, parlamentares estaduais e federais, etc., tudo nos termos da Resolução TRESC n. 6.227/72) ou por versarem casos concretos com identificação de pessoas interessadas.

As consultas em tese não vinculam o Tribunal em relação a um futuro caso concreto. Mas se o Tribunal responde a consulta que trata de hipótese concreta, a resolução a respeito poderá ser interpretada como pré-julgamento quando a matéria contenciosa for submetida a decisão da Corte.

6 Recursos sobre filiação partidária

Alguns recursos em matéria de filiação partidária subiram ao Tribunal em maio e junho, crescendo o seu número em julho e agosto, por força especialmente do disposto no art. 22 da Lei n. 9.096, de cancelamento automático de ambas as filiações, da antiga e da nova, na hipótese de, por falta de comunicação tempestiva, nos exíguos prazos da lei, configurar-se dupla filiação partidária.

Chegou o Tribunal a admitir a inconstitucionalidade do preceito que ordena o cancelamento automático de ambas, mas entendeu, por maioria, não haver afronta à Constituição Federal, e sim contrariedade da Resolução à lei, pois esta, embora não o preveja expressamente, não dispensa o devido processo legal, com a audiência da parte interessada.

Em diversos casos, ausente má-fé e interpretada a prova, decidiu-se pela vigência da nova filiação, não punindo o filiado quando demonstrada inequívoca intenção de afastar-se de um partido e filiar-se a outro.

Enfrentou-se mesmo a hipótese de dupla filiação em que a filiação anterior era a um partido político em 1980, quando havia no País apenas dois partidos, e tendo a agremiação partidária posteriormente feito fusão com outros e mudado duas vezes de nome (Acórdão n. 14.190, de 14.08.96).

As questões relativas a filiações partidárias deram causa a um significativo número de impugnações e, não obstante seu meritório propósito de coibir a troca de siglas partidárias, especialmente às vésperas das eleições, as novas regras foram implantadas abruptamente, sem que preparados para elas muitos dirigentes municipais de partidos, situação que certamente ocorreu pelo País afora.

Mas o Tribunal as interpretou caso a caso, por forma a evitar injustiças que o extremado rigor da lei poderia ensejar, quando inequívoca a manifestação de vontade do filiado.

7 Capacidade postulatória como requisito do recurso

Em julho, adotou-se a orientação de condicionar o conhecimento dos recursos à capacidade postulatória de seus subscritores, em obediência ao preceito do art. 133 da Constituição Federal e aos arts. 10, II, e 3º, da Lei n. 8.906/94, Estatuto da OAB e da Advocacia (Acórdão n. 14.173, de 12.08.96).

A diretriz foi rapidamente assimilada, com pequenas exceções, vindo a ser admitido o suprimento da irregularidade quando requerido antes do julgamento do recurso.

8 Necessária presença do Ministério Público quando evidente o interesse público

Entendeu-se, igualmente, indispensável a audiência do MP em matéria eleitoral em que evidente o interesse público da quaestio (Acórdãos ns. 14.122, 14.132,14.133 e 14.149).

9 Aplicação subsidiária do CPC - Limites do HC e MS

Entendeu-se aplicáveis ao processo eleitoral, subsidiariamente, as normas do CPC (Acórdãos ns. 14.172 e 14.202, entre outros) e decidiu-se pelo descabimento do Habeas Corpus quando não esteja em causa o direito de locomoção (Acórdãos ns. 14.108, 14.109 e 14.183), e do Mandado de Segurança contra ato de execução de sentença transita em julgado (Acórdão n. 14.110).

10 Os registros de candidatos

Em agosto/setembro, as pautas do Tribunal estavam voltadas fundamentalmente para os registros de candidatos e impugnações decorrentes de falta ou dupla filiação partidária; por inelegibilidades ante a falta de desincompatibilização ou afastamento; por rejeição de contas - afastada a inelegibilidade quando ainda sub judice tais contas, tendo no Acórdão n. 14.283 sido reconhecida a inconstitucionalidade do dispositivo assecuratório de 20%, no mínimo, de candidaturas de mulheres.

Foi um mês em que os trabalhos se prolongavam, às vezes, até meia-noite, pela urgência da matéria em debate e pela necessidade de ser o acórdão assinado ainda na sessão ( entre outros, os Acórdãos ns. 14.179, 14.180, 14.187, etc.).

11 O requisito de alfabetização dos candidatos - CF, art. 14, § 4°

Os testes de alfabetização a candidatos foram objeto de alguns julgamentos, mantendo-se a inelegibilidade quando efetivamente analfabeto o candidato, sem condições de distinguir, por exemplo, o sim do não (Acórdão n. 14.185), mas não sufragando o Tribunal orientação tendente a submeter o candidato a conhecimentos excedentes da mera verificação de ser ou não analfabeto.

12 Propaganda eleitoral/Direito de resposta

A propaganda eleitoral foi objeto de inúmeras decisões e resoluções do Tribunal: na definição de que competente o TSE quanto aos programas político-partidários em cadeia nacional e estadual (Acórdãos ns. 14.022 e 14.025); na condenação da propaganda antes das convenções, inclusive por meio de TV a cabo (Acórdãos ns. 13.990, 14.120, 14.158 e 14.162); no uso da programação normal de emissora, em afronta ao art. 64 da Lei n. 9.100/95 (Acórdão n. 14.114); em deliberações sobre as chamadas inserções - pequenos espaços publicitários distribuídos ao longo da programação normal das emissoras (Acórdãos ns. 14.030, 14.076 e 14.078); em consultas ou decisões sobre os adesivos com os dígitos 96 em veículos particulares ("Fulano 96", antes e durante o período de propaganda - Resoluções ns. 6.952 e 6.954 e Acórdão n. 14.162) e versando outros aspectos da propaganda eleitoral em geral (Acórdãos ns. 14.342/7; 14355/7; 14361/3, entre outros).

As questões relacionadas com o direito de resposta começaram a aflorar em agosto e setembro e estenderam-se nos meses de outubro e novembro relativamente ao 2° turno na Capital e em Joinville.

Nesse período o total de julgamentos alcançou 420 processos. Pela urgência da matéria, houve sessões até mesmo em sábados e domingos, sendo todos os acórdãos, sem exceção, publicados no mesmo dia.

São exemplos de julgamentos sobre a matéria os Acórdãos ns. 14.334, 14.347, 14.355, 14.359, 14.535 e 14.545.

Reclamações sobre propaganda institucional (Acórdãos ns. 14.372 e 14.387), sobre uso de símbolos oficiais de governos (Acórdão n. 14.370) ou propaganda tida por abusiva (Acórdão n. 14.413) foram outros temas enfrentados pelo Tribunal.

Diversos, também, os recursos que chegaram à Corte sobre substituições de candidatos (Acórdãos ns. 14.349 e 14.389), sobre pesquisas eleitorais (Acórdãos ns. 14.452 e 14.585), em torno de investigações sobre abuso do poder político ou econômico (Acórdãos ns. 14.493 e 14.519), sobre impugnações de urnas (Acórdãos ns. 14.590 e 14.591), relativos ao sistema eletrônico de votação, certamente dos primeiros do País na matéria (Acórdãos ns. 14.473 e 14.487), sobre pedidos de recontagem de votos (Acórdãos ns. 14.498, 14.499, 14.510, 14.521, etc.). Esses temas ocuparam as pautas dos dias próximos ou dos que se seguiram às eleições.

13 As multas por infrações eleitorais

A Lei n. 9.100/95 fixou multas por infrações às regras de propaganda eleitoral de um modo geral muito elevadas. O mínimo cominado a um grande número de infrações dessa natureza é elevado (10.000 UFIRs), e aplicável tanto às grandes organizações jornalísticas e de televisão como às emissoras de alcance apenas local ou aos semanários de reduzida circulação, quando o ideal é o estabelecimento de um mínimo razoável, de 1.000 até 20.000 UFIRs, por exemplo, de sorte que, em função da gravidade da infração e do potencial econômico do órgão de difusão e dos candidatos, o Juiz fixe a multa, penalizando adequadamente o infrator, mas sem levá-lo à insolvência ou à ruína.

Veja-se o exemplo do projeto da nova lei de imprensa que fixa as indenizações por crimes de imprensa entre R$ 2.000,00 e R$ 50.000,00, com grande margem ao Juiz para estabelecer o valor da condenação, levando em conta a gravidade da infração e a condição econômica do ofendido e do ofensor.

Esclareça-se, por fim, que todos os julgamentos do TRE em 1996, refletindo o intenso labor da Corte no período, constam do EMENTARIO DE JURISPRUDÊNCIA - Eleições Municipais 1996, que o Tribunal lançou por ocasião do 1° Seminário de Informática da Justiça Eleitoral, em maio de 1997, nesta Capital.

Ex-Presidente do TRESC.

Publicado na RESENHA ELEITORAL - Nova Série, v. 4, n. 1 (jan./jun. 1997).

 

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