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Íntegra

A decadência do direito à impugnação do mandato eletivo por omissão de litisconsorte passivo necessário na petição inicial

Por: Leandro Passig Mendes

1 Introdução

O presente artigo tem por objetivo provocar tão-somente o debate acerca do instituto da decadência, relativamente à ação constitucional de impugnação a mandato eletivo, prevista no art. 14, § 10, da Constituição Federal de 1988, especialmente na hipótese em que a petição inicial tenha omitido o chamamento de litisconsorte(s) passivo(s) necessário(s). As considerações feitas adiante abordarão a hipótese em que a ação tenha sido proposta dentro do prazo decadencial, mas sem a indicação correta de todos os legitimados passivos necessários e cuja emenda não tenha sido feita dentro do lapso de quinze dias contados da diplomação dos impugnados.

2 A ação de investigação judicial eleitoral

Antes de abordar a ação constitucional de impugnação de mandato eletivo, convém recordar que o art. 14, § 9º, da Constituição da República, com a redação dada pela Emenda Constitucional de Revisão n. 4, de 7 de junho de 1994, dispõe:

A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante:

[...]

§ 9º Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para o exercício do mandato, considerada a vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego público na administração direta ou indireta.

Dando eficácia concreta àquele dispositivo constitucional, especialmente no tocante ao procedimento para a investigação de abuso nas eleições, foi promulgada a Lei Complementar n. 64, de 18 de maio de 1990. Previu-se, então, o procedimento da ação para investigação judicial eleitoral. O objetivo seria apurar denúncias de abuso de poder e influência no processo eleitoral. A investigação judicial eleitoral tem inescondível conteúdo de processo (não mera investigação), com procedimento célere e carga sentencial específica, conforme o momento de seu julgamento. Uma das finalidades precípuas da investigação eleitoral seria dar suporte à ação constitucional de impugnação de mandato eletivo ou ao recurso contra a diplomação.

A objetividade jurídica, nesse passo, é a proteção da normalidade e da legitimidade das eleições contra a influência do abuso do poder econômico ou do abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta, indireta e fundacional da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

A Constituição Federal possibilitou a previsão de outras causas de inelegibilidade, determinadas por lei complementar - espécie legislativa essa que ostenta hierarquia superior à das leis ordinárias - bem como no tocante ao plano material de sua incidência e ao seu processo de elaboração e existência constitucionais. Essa breve consideração procura, para logo, afastar por completo a possibilidade de emprego do art. 41-A da Lei n. 9.504/1997 para sustentar a conclusão de que a procedência da investigação implicaria cassação do candidato impugnado, situação essa reservada somente para a sentença que apreciar - e acolher - a ação constitucional de impugnação de mandato eletivo.

A lei complementar editada para dar eficácia à disposição constitucional, dependente de ato legislativo, não previu cassação de diploma para os condenados em ação de investigação eleitoral. A lei ordinária mencionada, dessarte, não poderia validamente ter ampliado a sanção para prever a cassação do registro ou do diploma naquelas hipóteses que especificou, que podem ser resumidas na corrupção eleitoral, pois tal eficácia sentencial foi reservada para, repita-se, a ação constitucional de impugnação de mandato eletivo.

O egrégio Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina vem decidindo, reiteradamente, que:

RECURSO - REPRESENTAÇÃO - ART. 41-A DA LEI N. 9.504/1997 - EXEGESE - INCONSTITUCIONALIDADE PARCIAL.

Incide o art. 41-A da Lei n. 9.504/1997 em inconstitucionalidade formal, uma vez que é vedado ao legislador fazer inserir em plano jurídico eleitoral novas hipóteses de inelegibilidade mediante lei ordinária, em infração ao art. 14, § 9º, da Carta Constitucional, que exige sejam instituídas somente por lei complementar.1

Procedente a investigação eleitoral, há remessa de cópia de seu conteúdo ao Ministério Público Eleitoral ou terceiro legitimado ativamente, para a deflagração de recurso contra a diplomação (art. 262 do Código Eleitoral) ou ação de impugnação de mandato eletivo (art. 14, e seus parágrafos, da Constituição da República).

DECOMAIN averba:

Se a representação judicial para apuração de abuso do poder econômico ou político, ou também de uso indevido de veículos ou meios de comunicação, for julgada procedente, entendendo-se provado o abuso do poder econômico ou de autoridade, ou o uso indevido de veículo ou meio de comunicação em benefício de candidato, partido ou coligação, o registro do candidato beneficiado será cancelado. Se a representação for julgada procedente depois da eleição, será remetida cópia da decisão ao Ministério Público, para a interposição de recurso contra a diplomação, previsto pelo art. 262, inciso I do Código Eleitoral, ou para propositura da ação de impugnação de mandado eletivo, com sede nos §§ 10 e 11, do art. 14, da própria Constituição Federal. Essas as regras dos incisos XIV e XV, do art. 22, da LC 64/1990. Delas se conclui que apenas a decisão de procedência da representação por abuso do poder econômico ou de autoridade, ou por uso indevido de meio ou veículo de comunicação, não acarreta anulação da eleição do candidato beneficiado, quando esta já tenha ocorrido, nem permite cassação de seu mandato, se já tiver havido diplomação. Somente através de interposição do recurso contra diplomação, ou da propositura da ação de impugnação de mandado eletivo, é que poderão ser alcançados tais resultados.2

Por isso, percebe-se uma necessária correlação entre a ação de investigação judicial eleitoral, como procedimento prévio e tendente a reunir elementos materiais e testemunhais para fundamentar ou o recurso contra a diplomação ou a ação constitucional de impugnação de mandato eletivo. Esse o motivo da abordagem da investigação judicial eleitoral previamente à ação constitucional de impugnação ao mandato eletivo, bem como ao tema central da decadência.

3 A ação de impugnação de mandato eletivo

A ação de impugnação de mandato eletivo é a medida prevista no art. 14, § 10, da Constituição da República, destinada especificamente à obtenção de provimento jurisdicional com eficácias declaratória e condenatória. O pedido será destinado à cassação do mandato eletivo, com outras conseqüências secundárias relativas aos direitos políticos do candidato condenado, e aplicação de sanções correlatas.

Preceitua o art. 14, § 10, da Constituição Federal:

A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante:

[...]

§ 10. O mandato eletivo poderá ser impugnado ante a Justiça Eleitoral no prazo de quinze dias, contados da diplomação, instruída a ação com provas de abuso do poder econômico, corrupção ou fraude.

Mendes averba sobre a natureza e finalidade da ação constitucional de impugnação de mandato eletivo:

Essa ação foi constitucionalizada em face da previsão contida no art. 14, §§ 10 e 11, da Constituição Federal de 1988, conferindo-lhe, pois, força inerente aos princípios e preceitos constitucionais.

A construção pretoriana reconheceu, pois, a eficácia plena do art. 14, §§ 10 e 11, da Constituição Federal, elaborando por analogia legis o procedimento tendente a coibir o abuso do poder econômico, a corrupção e a fraude visando à garantia da lisura, normalidade e legitimidade das eleições.

Com efeito, a ação de impugnação de mandato eletivo tem a forma e o conteúdo que lhes emprestam princípios e preceitos constitucionais, desenhando os seus pressupostos e finalidade, inclusive os aspectos temporais indispensáveis à identificação do dies a quo da propositura e do dies ad quem, consubstanciado na decadência.

A finalidade dessa ação é a tutela de interesses egoísticos, mas a preservação da legitimidade, lisura e normalidade das eleições. Em suma, a ação de impugnação de mandato eletivo busca a tutela do interesse público ou, precisamente, garantir a moralidade na investidura de mandato, inclusive proteger a probidade administrativa e resguardar o direito público subjetivo ao governo honesto.

Origina-se, pois, na autêntica noção de status civitatis outorgando esse direito subjetivo público e facultando ao cidadão exigir da Justiça Eleitoral a prestação jurisdicional cuja finalidade é o controle da moralidade e legalidade na investidura em cargos eletivos. Trata-se, pois, de munus público decorrente do direito de participação política do cidadão.

Esses pressupostos indicam que se trata de ação civil eleitoral ou ação popular eleitoral. Com efeito, sua finalidade é a tutela do interesse público, garantindo, reafirma-se, a legitimidade, lisura das eleições, cujo escopo é assegurar a probidade e moralidade dos eleitos quando da investidura e exercício do mandato eletivo.

A rigor, o objeto da ação de impugnação de mandato eletivo é a anulação do diploma expedido pela Justiça Eleitoral outorgando ao candidato eleito o direito de tomar posse. Anula-se o diploma e, em conseqüência, perde-se o mandato eletivo. Nesse prisma, esse instituto poderia ser chamado: ação eleitoral de anulação de diploma, a exemplo da ação pública outorgada ao Ministério Público Eleitoral ex vi o art. 24, II, do Código Eleitoral. Porém, com fulcro na forma, conteúdo e finalidade fixados pelo art. 14, §§ 10 e 11, da Constituição Federal, o nome juris desse instituto pode coincidir, sem inconvenientes terminológicos ou metodológicos, com o enunciado dado pelo preceito constitucional: ação de impugnação de mandato eletivo, podendo, também, ser denominado, sem restrições, ação civil eleitoral de impugnação de mandato eletivo ou ação popular eleitoral de mandato eletivo.3

4 O prazo decadencial

A ação de impugnação de mandato eletivo somente pode ser proposta no prazo de quinze dias contados da data da diplomação dos eleitos, conforme expressamente prevê o art. 14, § 10 da Constituição Federal. O prazo, como se sabe, é decadencial e passa a fluir da data da diplomação dos candidatos eleitos, não se admitindo interrupção ou suspensão. Em se tratando de prazo decadencial, não há possibilidade de qualquer dilação, seja por convenção das partes ou mesmo por decisão judicial, porque a decadência atinge o próprio direito material. Apenas reflexamente o direito instrumental ou processual é obstado.

Garcia sustenta:

Nos quinze dias posteriores à diplomação poderá o mandato ser impugnado através da ação em tela (art. 14, § 10, da CR/1988), sendo certo que a fixação de um determinado lapso temporal dentro do qual poderá o legitimado infirmar a vontade popular é imperativo de ordem pública, imprescindível à paz social. O decurso do tempo é relevante na medida em que a manutenção de determinada situação fática implica na estabilidade das relações jurídicas.

Nesse passo, é relevante analisar a natureza jurídica de tal prazo, pois daí advirão efeitos distintos conforme seja considerado de natureza prescricional ou decadencial. A dificuldade na elaboração de critérios científicos para a identificação de tais institutos é notória, tendo sido Câmara Leal, em festejada monografia, o primeiro a apresentar uma linha de argumentação lógica apta a permitir tal distinção. Segundo ele, ambos os institutos têm pontos de contato que lhes emprestam uma certa analogia:

a) serem causas extintivas;

b) basearem-se na inércia do titular;

c) terem como fator operante o tempo.

Quanto às conseqüências, a distinção é marcante, pois contrariamente à prescrição, a decadência não admite interrupção ou suspensão, somente sendo obstada sua implementação com efetivo exercício do direito. Como características diferenciais, Câmara Leal apresenta as seguintes:

a) a prescrição tem por objeto a ação, enquanto a decadência o direito;

b) a prescrição supõe um direito já exercido pelo titular, mas cujo exercício sofreu obstáculo pela violação de um terceiro; a decadência pressupõe um direito ainda não exercido por seu titular, existente apenas em potência;

c) a prescrição supõe uma ação, cuja origem é distinta da natureza do direito, tendo nascimento posterior ao nascimento deste; na decadência, a origem da ação é idêntica ao nascimento do direito, sendo simultâneo o nascimento de ambos;

d) na prescrição, o exercício da ação não se confunde com o exercício do direito, sendo aquela o meio utilizado para remover-se o obstáculo existente, garantindo-se o exercício deste; na decadência, o exercício da ação e do direito identificam-se, sendo aquela o meio de que deve servir-se o titular para realizar o efetivo exercício de seu direito.

[...]

Qualquer que seja o critério utilizado para identificação do prazo ora em análise, a conclusão será a mesma. Trata-se de ação disponibilizada aos legitimados cuja origem é idêntica à origem do direito, sendo simultâneo o nascimento de ambos. Considerando que o exercício da ação e o exercício do direito se identificam, já que a ação representa o meio de que deve servir-se o titular para realizar o efetivo exercício de seu direito, inequívoca é a conclusão de que se trata de prazo decadencial, impassível de suspensão ou interrupção. Por outro lado, a ação de impugnação visa desconstituir uma situação jurídica preteritamente constituída com a diplomação. Assim, seu ajuizamento apresenta-se como direito potestativo dos legitimados, o qual deve ser impreterivelmente exercido no prazo de quinze dias. Ademais, o prazo é previsto no texto constitucional, o que retira qualquer dúvida a respeito de sua natureza.4

Cândido complementa na mesma linha de entendimento sobre o tema em debate:

A diplomação do eleito completa o suporte fático para a propositura da ação, juntamente com os fatos que o autor souber e que pretende atribuir ao candidato ou a sua responsabilidade. Por isso, é impossível, sob pena de carência, se ajuizar a ação antes da diplomação. Sem diplomação, obrigatória no processo eleitoral, não há mandato: há, apenas, um direito expectivo gerador a um mandato, para o eleito. Logo, não há o que atacar, inexistindo objeto para a ação.

A contar da diplomação (CE, art. 215) tem o autor 15 dias para o ajuizamento da ação, improrrogáveis, pois se trata de prazo constitucional.5

Não há dúvida, portanto, quanto ao prazo fixado para o exercício do direito à impugnação do mandato eletivo. A conclusão é reforçada porque a dilação temporal é relativa ao próprio direito, ostenta a natureza decadencial. Além disso, cuida-se de prazo fixado pela própria Constituição Federal, de modo que a interpretação mais consentânea com o espírito do legislador constituinte aponta no sentido de que o prazo é fatal e improrrogável. O dispositivo constitucional não previu hipóteses de suspensão ou interrupção, não cabendo à lei ordinária dispor em sentido diverso.

5 Litisconsórcio passivo necessário entre os candidatos eleitos e o partido político ou coligação

A ação de impugnação de mandato eletivo visa à cassação do mandato e, em se tratando de eleição majoritária, há evidente litisconsórcio passivo necessário (art. 47, parágrafo único, do CPC). A ação constitucional, pois, deverá, obrigatoriamente, ser dirigida em face dos candidatos diplomados e dos partidos políticos integrantes da coligação.

Com efeito, sabe-se que o partido político, no sistema eleitoral brasileiro, é quem detém a titularidade sobre o cargo eletivo, e não propriamente o candidato eleito, de modo que a sentença que apreciar a ação constitucional de mandato poderá implicar repercussão direta na esfera jurídica de terceiro. Logo, o partido político e a coligação, conforme o caso concreto, devem ser necessariamente chamados a integrar a relação processual, a fim de que a sentença possa produzir efeitos válidos em relação à sua esfera de direitos.

Bispo preleciona:

Reza o art. 47 do CPC que "há litisconsórcio necessário quando, por disposição de lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as partes; caso em que a eficácia da sentença dependerá da citação de todos os litisconsortes no processo". Ora, o partido político a que pertença o réu é diretamente interessado na demanda, pois que, através de sua legenda, da pregação de seu ideário e do próprio objeto de sua existência, que é a conquista do poder para execução de seu programa, é que o candidato veio a se eleger. Nesse sentido, embora a ação vise o mandato eletivo do candidato eleito é fundamental e necessária a citação do partido que requereu o registro de sua candidatura. O Supremo Tribunal Federal (2ª Turma, Ag. 107.489-2AgRg - SP, Rel. Min. Carlos Medeiros, j. 28.2.1986), já decidiu que "há litisconsórcio passivo necessário quando existe comunhão de interesse do réu e do terceiro chamado à lide".6

Mendes assevera no mesmo sentido:

Todavia, a relação de direito material-eleitoral dará os critérios indispensáveis à identificação do pólo passivo da relação processual. No direito brasileiro, não há candidaturas isoladas. Pode-se dizer que as candidaturas são partidárias porque os partidos políticos têm o monopólio da apresentação das chapas à Justiça Eleitoral visando ao registro dos candidatos.

Assim, tanto nas eleições majoritárias quanto nas eleições proporcionais é fundamental que o candidato, o partido ou a coligação sejam colocados como réus na ação de impugnação de mandato eletivo, sob pena de nulidade da relação processual em face da relação de direito material que une, monoliticamente, os partidos e candidatos.7

6 Conseqüências da omissão de litisconsorte passivo e possibilidade de emenda

A petição inicial fixa os limites para a cognição judicial, de modo que compete ao magistrado exercer efetiva correção de seus vícios desde sua propositura (art. 262 do CPC). A partir da propositura da ação, o Juiz deve exercer efetiva fiscalização quanto aos pressupostos processuais e às condições da ação, almejando que a ação caminhe para a obtenção de uma sentença de mérito que componha efetivamente o litígio instalado. A sentença que extingue o processo por falta de pressuposto processual ou condição da ação não examina propriamente a lide, remanescendo o conflito de interesses. Por isso, desde o exame da petição, o Juiz deve determinar a emenda ou sanação de irregularidades, a fim de que a atividade jurisdicional não seja praticada em vão, com prejuízo aos operadores jurídicos e todos os demais intervenientes.

A falta de individualização dos réus ou litisconsortes passivos necessários insere-se naquela situação de carência de correção por parte do Juiz, uma vez que a ação não poderá se desenvolver validamente sem a participação de todos aqueles legitimados passivos. A irregularidade implicará, se não reconhecida oportunamente, extinção do processo, porque a sentença proferida ou que venha a produzir efeitos em relação ao litigante que não foi chamado - pela citação - para compor a relação processual, é absolutamente nula.

Como a ação constitucional de impugnação de mandato deve ser proposta no prazo de quinze dias, a distribuição da petição inicial e o despacho judicial determinando a citação devem ocorrer dentro do prazo aludido anteriormente. Compete ao autor diligenciar para que o prazo decadencial não se esgote sem a providência contida no art. 219 do CPC, para que a propositura da ação gere todas as conseqüências possíveis, mormente obstando a consumação do prazo decadencial. Verificada a falta de indicação de todos os litisconsortes, o Juiz deve assinar prazo para a complementação da petição inicial, que, por disposição do art. 284 do CPC, deve ser de 10 dias.

Evidentemente, deve-se ponderar que ao autor da ação compete inteirar-se de eventual despacho determinando a complementação da petição inicial, porque a incorreta propositura da ação, com a omissão de litisconsortes passivos necessários, não tem o condão de produzir efeitos válidos para a instauração da relação processual. A complementação da petição inicial, quando o vício ou irregularidade possa comprometer o desenvolvimento do processo, não implica obstáculo à fluência do prazo decadencial, pois a ação não foi correta e validamente proposta. Por isso, a emenda deve ser admitida desde que o prazo decadencial ainda não tenha fluído inteiramente.

Decorrido o prazo decadencial sem a complementação, a ação estará fatalmente fadada à extinção, por falta de pressuposto processual para seu desenvolvimento válido e regular, e mesmo do necessário reconhecimento da decadência, que repercute no mérito da pretensão (art. 269 do CPC).

Tratando desse tema, Garcia aduz:

A incompleta individualização do pólo passivo, ante a omissão de algum dos litisconsortes necessários, importará na aplicação do disposto no art. 47, parágrafo único, do Código de Processo Civil, devendo o órgão jurisdicional determinar a emenda da inicial para individualização do mesmo. Esta providência, no entanto, somente será passível de implementação antes do decurso do prazo decadencial de quinze dias após a diplomação, pois até então a demanda não estava regularmente posta, sendo inapta a receber um provimento de mérito ou a impedir o aperfeiçoamento do lapso decadencial. Omitido um dos litisconsortes e decorridos mais de quinze dias desde a diplomação por ocasião da identificação da omissão, deverá o processo ser extinto sem julgamento do mérito ante a ilegitimidade passiva ad causam e a decadência do direito de manejar a ação de impugnação de mandato. Identificada a omissão antes do decurso de quinze dias, mas permanecendo o autor inerte, somente promovendo a emenda da inicial após o referido prazo, deverá o processo ser igualmente extinto. Neste sentido decidiu o Tribunal Superior Eleitoral:

"Nas eleições em geral, o voto atribuído ao candidato beneficia, automaticamente, o Vice que com ele compõe a chapa. Evocado na ação de impugnação de mandato - § 10 do art. 14 da Constituição Federal - vício capaz de contaminar os votos atribuídos à chapa, impõe-se a observância do litisconsórcio necessário unitário, devendo a ação, dirigida contra ambos os mandatos, estar ajuizada no prazo decadencial de quinze dias. Litisconsórcio necessário unitário. Citação dos litisconsortes. Atuação de órgão investido do ofício judicante. Decadência. O que previsto no parágrafo único do art. 47 do Código de Processo Civil - determinação no sentido de o autor promover a citação de todos os litisconsortes necessários - pressupõe não esteja consumada a decadência. Deixando o autor para ajuizar a ação no último dia do prazo fixado, o fazendo de modo incompleto, descabe a providência, no que jungida à utilidade. O preceito não tem o condão de ressuscitar prazo decadencial já consumado (AGREG n. 14.979; j. 2.5.1995, Rel. Min. Marco Aurélio, DJU, 26.5.1995)."8

E, em situação assemelhada, o Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais decidiu, valendo transcrever do voto condutor:

[...]

Neste caso, a ação foi proposta em dois momentos: primeiro, tempestivamente, mas de forma ineficaz, pois proposta apenas contra o Prefeito, Pedro José Machado, em desatendimento ao litisconsórcio necessário unitário; e, posteriormente, de forma eficaz, com o pedido de citação do Vice-Prefeito, Flávio Lúcio Rigueira, porém quando já consumado o prazo decadencial de quinze dias.

Assim, quando se conferiu eficácia à ação mediante a citação do litisconsorte necessário unitário, o prazo decadencial para o seu ajuizamento já se escoara.

A observância do litisconsórcio passivo necessário na propositura da ação constitucional está sujeita ao prazo decadencial, sendo descabida a providência judicial prevista no parágrafo único do art. 47 do Código de Processo Civil quando posterior aos quinze dias contados da diplomação do impugnado.

Assim, em face da existência de litisconsórcio passivo unitário, esta ação, que reclama sentença única de desconstituição dos mandatos do Prefeito e Vice-Prefeito, teve seu ajuizamento concluído após o prazo decadencial de quinze dias, razão pela qual, em reexame necessário, com fundamento no art. 269, inciso IV do Código de Processo Civil, pronuncio a decadência e declaro extinto o processo, prejudicado o recurso voluntário.9

7 Conclusão

Dessarte, em sendo omissa a petição inicial no tocante à titularidade passiva na impugnação de mandato eletivo, que deve ser dirigida em face de todos os legitimados passivos - candidatos e partidos políticos ou coligação -, cumpre ao Juiz determinar a emenda da petição inicial, fazendo uso do art. 284 do CPC, ordenando que o autor promova a citação (rectius: requeira a citação) de todos aqueles que devam figurar no pólo passivo da ação, sob pena de extinção do processo. A lei processual civil assina o prazo de dez dias para o cumprimento da providência ordenada pelo Juiz. Claro, todavia, que o prazo de dez dias somente poderá ser observado se efetivamente não se apresenta prazo mais exíguo. Assim, se, no momento em que o despacho judicial for proferido, existir prazo menor para a consumação da decadência, cumpre à parte autora promover a emenda nesse lapso temporal, porque implementada a extinção do direito, inarredável será a sentença definitiva (art. 269, IV, do CPC).

Notas

1 Acórdão n. 16.968, 25.4.2001, Rel. Juiz Oswaldo Pedreira Horn.

2 DECOMAIN, Pedro. Elegibilidade e inelegibilidades. Florianópolis: Letras Contemporâneas, 2000. p. 71.

3 MENDES, Antônio Carlos. Constituição Federal de 1988: dez anos. São Paulo: J. de Oliveira, 1999. p. 42.

4 GARCIA, Emerson. Ação de impugnação de mandato eletivo. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2000. p. 188-191.

5 CÂNDIDO, Joel J. Direito Eleitoral brasileiro. 8. ed. São Paulo: Edipro, 2000. p. 263.

6 BISPO, Charles Edson. Ação de impugnação de mandato eletivo. São Paulo: Ed. de Direito, 1998. p. 45.

7 MENDES, op. cit., p. 42.

8 GARCIA, , op. cit., p. 203-204.

9 Acórdão TRE/MG n. 551/1999, Rel. Juiz Rogério Tolentino.

Juiz de Direito da 2ª Vara da Comarca de Xanxerê, Juiz Eleitoral da 43ª Zona Eleitoral e mestrando em Ciência Jurídica pela Universidade do Vale do Itajaí (Univali).

Publicado na RESENHA ELEITORAL - Nova Série, v. 9, n. 2 (jul./dez. 2002).

 

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